Tentativas de descredibilizar A NAÇÃO
Através de Ulisses Correia e Silva, o Governo manifestou na semana passada o seu desprezo pela inteligência dos cabo-verdianos quando, perante os factos descritos sobre a TACV, continuou a esconder a realidade.
O mesmo esforço é visível no comunicado da Direção de Turismo e Transportes, com os mesmos argumentos de 2016. Nomeadamente quando afirma:
Que encontrou uma empresa atolada em dívidas, sem aviões e sem ligações aéreas entre as ilhas e com o exterior (quando em 2016, apesar das inegáveis dificuldades porque passava a companhia, a TACV operava voos regulares para todas as ilhas de Cabo Verde com aeródromos operacionais, sendo as de São Nicolau e do Maio que mais reclamavam do número reduzido de voos semanais.
A TACV prestava o serviço de transporte de doentes, a preços comportáveis, tendo as operações inter-ilhas melhorado substancialmente quando a Binter que se encontrava em processo de certificação iniciou as operações introduzindo a concorrência e a redução dos preços; operava voos para vários destinos europeus e para o Senegal a partir dos quatro aeroportos internacionais: AIAC, AIAP, AICE, AINM com aviões em diferentes regimes de leasing;
Encontrou uma empresa em processo de reestruturação, tendo sido já feito o spinoff, dando lugar ao nascimento de uma nova empresa, a CV Handling, SA, como empresa autónoma. Os estudos visando a autonomização da TACV doméstico estavam em fase muito avançada e os que visavam a reestruturação da TACV Internacional e a sua preparação para abertura ao capital privado também em fase avançada com financiamentos do Banco Mundial e do BAD;
O que terá levado o Banco Mundial a pressionar o Governo e suspender a ajuda orçamental terá sido a suspensão do processo com a posse de um novo executivo de Ulisses Correia e Silva, que até meados de 2017, não dava sinais de retoma do processo de reestruturação enquanto a mudança do CA feita imediatamente à mudança do governo não dava sinais de melhoria e não causas atribuíveis ao Governo anterior que acordara com o BM o processo de reestruturação através do DECRP III, a Carta de Política de Transportes e do Plano Estratégico para o Cluster do Aeronegócios.
Ora, nada disso é novo. A novidade, se assim se preferir, é a sequência de más apostas para quem, desde que assumiu o Governo, em 2016, disse ter nas mãos a solução de todos os problemas da TACV.
Aliás, na linha de que tinha a solução, mal se instalou no Palácio da Várzea, Ulisses Correia e Silva tratou logo de nomear um novo conselho de administração da companhia aérea, por ele utilizada como arma eleitoral durante a campanha para as legislativas de 2016.
O que se verificou, entretanto, foi um claro agravamento da situação da TACV, com novos e pesados custos financeiros para o Estado de Cabo Verde.
Nisso tudo é bom que os cabo-verdianos se conscientizem, de uma vez por todas, que nada disto é de graça. Que são eles, enquanto contribuintes, hoje e amanhã, a ter que pagar um dia pelos maus resultados da TACV. Aliás, todo aquele que precisa viajar hoje para o exterior já paga pelo descalabro em curso desde 2016, para só nos situarmos no período da governação de UCS.
Em Julho de 2018, por razões nunca explicadas, a Icelandair retirou à socapa todos os seus aviões de Cabo Verde deixando a TACV sem operar durante dois meses, algo que nunca tinha acontecido com a companhia desde a sua criação em 1958.
Em Abril de 2020, voltou a fazer o mesmo, provocando mais um longo período de paralisação, sabe-se agora para chantagear e pressionar o Governo a injectar mais recursos na companhia e perdoar as dívidas cumuladas com empresas públicas, INPS e o Fisco.
No seu comunicado a DGTT acusa o A NAÇÃO de omitir que a parceira estratégica também reduziu o valor do contrato de leasing dos aviões e perdoou parte da dívida resultante desse contrato, além de outros aspectos.
Se a parceira estratégica decidiu retirar os seus aviões à CVA e colocá-los no exterior, por que motivo o Governo e os parceiros nacionais não exigiram no imediato a renegociação do contrato de leasing ou a sua rescisão, evitando que continuassem a faturar e a imputar dívidas à TACV/ CVA, impedida de operar por falta de frota? Só que as perguntas continuam.
Se o accionista Estado não tinha acesso a informações relevantes sobre a gestão da TACV/CVA e a utilização do dinheiro injectado pelo Estado na companhia através de avales do Tesouro, se não pagou o valor das acções adquiridas, não transferia os descontos de impostos dos trabalhadores retidos, das contribuições ao INPS, de impostos devidos ao Estado, por que permitiu o Governo que a situação se arrastasse até Junho de 2021 para vir assumir o que há muito já se sabia?
A única resposta possível é a pressão imposta pelo calendário eleitoral, de Abril, que viria a renovar o mandato de UCS. Ao Governo o importante era vencer as eleições, ainda que obrigado a satisfazer a voracidade dos islandeses. E nisso lá conseguiu que um dos aviões fosse trazido para Cabo Verde quase nas vésperas das eleições de modo a convencer os incautos de que tudo estava bem com a CVA e o parceiro islandês.
As informações agora disponíveis já permitem a qualquer cidadão minimamente informado, lendo os termos do Acordo de Março, ainda sem conhecer todas as informações que deve constar de algum Acordo Parassocial e dos Relatórios e contas da CVA e da NewCo, que estamos perante um negócio ruinoso, que o Governo foi incauto. Deixou-se ludibriar. E partindo do princípio que a história ainda não terminou, resta ainda saber se o processo de arresto do avião da Loftleidir Icelandic, a pedido do Governo, não resultará em mais custos e encargos para o Estado e para a CVA.
O Governo não dá sinais de aprender com os erros anteriores nem com os seus próprios erros. Continua a preferir navegar em águas turvas, negando o que já é evidente há muito. Mas o que já se sabe já é demasiado inquietante e o futuro não anuncia grandes mudanças em relação à TACV, agora sem a roupagem da “CVA”.
O volume das dívidas não é conhecido ainda na sua totalidade, mas sabe-se que é avultadíssimo. Os custos do relançamento da companhia também não são conhecidos. E há mais.
Não se conhece o plano de negócios, o “business model”, as opções quanto à geografia de operações, rotas, frota e outros custos associados, não se percebe como se pretende viabilizar a TACV e a operação em Hub, definir políticas públicas sustentáveis sem que o mercado interno e regional de transportes aéreos esteja organizado, seja previsível, eficiente e a preços comportáveis.
Em suma, como este jornal chegou a escrever no inicio de toda esta trapalhada com os islandeses, a história da TACV não termina aqui. Ainda haveremos muito de ouvir nesta calamidade que é a companhia nacional de bandeira, a TACV.