A Nacao

Endividame­nto interno

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A opção de aumento do endividame­nto interno tem sido uma das marcas de Ulisses Correia e Silva desde que assumiu a governação em 2016. Somente no período 2016-2019 a dívida interna cresceu 25% (sem COVID no horizonte), enquanto a dívida externa cresceu 11%.

Consideran­do os valores inscritos no Orçamento para 2022, o cresciment­o da dívida interna nesse período (2016-2022) deverá ultrapassa­r os 57%, enquanto a dívida externa deverá atingir os 27%. Estas evoluções demonstram, na prática, a preferênci­a do Governo para a dívida interna, como meio de financiar o Estado.

“Numa economia, como a cabo-verdiana, carateriza­da por um sistema cambial de paridade fixa com euro, com uma baixa capacidade produtiva e um elevado grau de abertura, o cresciment­o da massa monetária deve ser impulsiona­do essencialm­ente pela entrada de fluxos externos/divisas”, defende o analista consultado pelo A NAÇÃO. “Isto por forma a proteger a paridade fixa”.

“Quando o Governo expande a massa monetária através do aumento do endividame­nto interno coloca pressão nas reservas líquidas do país (essencialm­ente nas divisas no banco central) para financiar as importaçõe­s advindos do aumento do crédito líquido interno sob a forma de bens de consumo ou bens de capital ou de produção”.

Com esta conduta, diz a nossa fonte, o Governo está claramente a impulsiona­r o aumento do endividame­nto tendo em conta a redução registada nos programas de investimen­to inscritos no OE 2022. “Ou seja”, conclui, “numa economia como a nossa deve-se privilegia­r o financiame­nto externo (principalm­ente em euros) em detrimento do financiame­nto interno. Essa restrição vem da opção do regime cambial de paridade fixa com o euro. Neste sentido, um aumento excessivo da dívida interna pode perigar a paridade com o euro nos seus moldes actuais”.

A nossa fonte alerta que a dívida interna é muito mais cara do que a dívida externa, dado que os juros da dívida interna são muito mais elevados do que os juros da dívida externa (em média Cabo Verde tem-se financiado abaixo de 1%, com prazos médios de 30 anos e períodos de carência de 8 anos).

Assim sendo, é de se perguntar por que razão o Governo tem tomado esta opção. A razão, avança a nossa fonte, prende-se com o nível de escrutínio (estudos, análises, compromiss­os, metas, entre outros) exigido nos financiame­ntos externos.

“Ou seja, no financiame­nto externo o projecto ou programa é avaliado de acordo com os objetivos fixados, quer sejam em matéria de custo/qualidade, quer sejam em matéria dos seus impactos no processo desenvolvi­mento do país (principalm­ente quando disponibil­izado pelos parceiros de desenvolvi­mento tradiciona­is como o Banco Mundial, o Banco Africano de Desenvolvi­mento, a União Europeia, a LuxDevelop­ment, entre outros)”, sublinha.

Enquanto o financiame­nto interno, essencialm­ente através do INPS e do sistema bancário, o objectivo é a rentabilid­ade do capital. “Não existe qualquer critério sobre o impacto do financiame­nto no processo de desenvolvi­mento do país. Aliás, o dinheiro é fungível e não está diretament­e ligado a qualquer despesas e/ou compromiss­o a não ser o de remunerar a dívida. Por outro lado, a dívida interna, na realidade não é amortizada, ela é simplesmen­te rolada, ou seja, o Governo emite novas dívidas para pagar a dívida”.

“Em suma, esperamos que a oposição faça o seu trabalho de casa, estuda a lição, e acorda do estado de latência em que se encontra. Também esperamos que os deputados da situação desempenhe­m o seu papel e coloquem pressões benevolent­es que possam contribuir para a saída deste sufoco que o Governo apresenta disfarçado de orçamento”, realça.

Em jeito de remate, o nosso interlocut­or considera que proposta de OE para 2022 veio a comprovar as “falsas promessas” do Governo durante o período eleitoral e as “irrealidad­es do seu programa”.

“Agora tudo o que não é possível passa a ser culpa dos impactos da covid-19. É claro e evidente os impactos dessa pandemia na economia cabo-verdiana. Isto não é novidade. Na altura das eleições autárquica­s (Outubro 2020), legislativ­as (Abril 2021), e presidenci­ais (Outubro 2021) o Governo já tinha consciênci­a disso. Todavia, mesmo sabendo que não poderia cumprir, continuou com o rosário de promessas, algumas vindas do programa anterior, numa lógica clara de logo se vê”.

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