O mundo está mais autoritário
O relatório global do Instituto para a Democracia e Assistência Social, a International IDEA, publicado na segunda-feira, 22, aponta que as democracias estão a regredir e que o mundo está mais autoritário. Esta inflexão vem deitar por terra a ideia de um mundo de democracia liberal, na linha do defendido, na década de 1990, por autores como Samuel Huntington e Francis Fukuyama.
Mais de dois terços da população mundial, segundo o relatório do IDEA, vive, actualmente, em democracias em retrocesso ou em regimes autocráticos. Um retrocesso, na prática, sem precedentes na história recente das democracias e liberdades no mundo.
O documento “O Estado da Democracia no Mundo 2021: Construindo Resiliência numa Era Pandêmica” mostra que o mundo está a tornar-se mais autoritário e que regimes democráticos estão a retroceder, recorrendo a práticas repressivas e enfraquecendo o Estado de Direito.
O número de países em transição para o autoritarismo, segundo a mesma fonte, superou, em 2020, o número dos que estão a avançar em direcção a uma democracia, com o mundo a perder regimes democráticos, através de eleições viciadas ou golpes militares.
Covid-19 aprofunda crise
A pandemia da Covid-19, também, aprofundou a crise da democracia, abrindo caminho a soluções populistas e autoritárias. O relatório aponta que 64% dos países analisados tomaram, pelo menos, uma medida de contenção de propagação do novo vírus que pode ser considerada desproporcional, desnecessária ou ilegal.
“As imperfeições políticas e as linhas de fraturas sociais reveladas pela pandemia conduziram mais pessoas em direção a líderes populistas e autoritários que raramente aplicam soluções duráveis para a preocupação dos cidadãos”, explicou o secretário geral do IDEA, Kevin CasasZamora.
Mesmo assim, algumas democracias tiraram proveito da pandemia, introduzindo ou expandindo inovações democráticas nos seus sistemas e adotando práticas transparentes no combate à crise sanitária, na realização de eleições em condições difíceis e perante a ameaça da desinformação, refere o relatório.
Retomando aos retrocessos, entre os países de língua portuguesa o Brasil é o único citado no relatório como a “democracia que mais retrocedeu em 2020”, com a gestão da pandemia a ser “atormentada por escândalos de corrupção e protestos, enquanto o Presidente Jair Bolsonaro minimizou a pandemia e deu mensagens contraditórias”.
África e Médio Oriente
Na África e Oriente Médio o relatório fala de declínios recentes na democracia e destaca quatro golpes militares que tiveram sucesso no derrube de regimes onde se procuravam práticas democráticas, como no Chade, Guiné-Conacri, Mali e Sudão.
Nas regiões da Ásia e no Pacifico o relatório constatou uma onda crescente de autoritarismo com crises a afectar o Afeganistão, Hong Kong e Myanmar, bem como índia, Filipinas, Sri-Lanka, onde se verifica uma erosão democrática generalizada. Nas Américas, metade das democracias da região sofreu erosão democrática e destaca o Brasil, Bolívia, Colômbia, El Salvador e EUA.
Já na Europa, a covid-19 exerceu pressão sobre as democracias e em alguns países onde os princípios democráticos já estavam sob ameaça, proporcionou uma desculpa para os governos enfraqueceram, ainda mais, a democracia. Os governos não democráticos na Europa como Azerbaijão, Bielorrússia, Rússia e Turquia, intensificaram suas práticas já muito repressivas, segundo o relatório.
Como conclusão, o relatório recomenda um conjunto de medidas políticas para reforçar os regimes democráticos, através de contratos sociais mais equitativos e sustentáveis que podem ir desde a reforma de instituições políticas à criação de mecanismos de defesa contra ameaças autoritaristas.
O Instituto Internacional para a Democracia e Assistência Social, a Internacional IDEA, mede o desempenho democrático de 158 países desde 1975 e procura fornecer um diagnóstico sobre o estado das democracias em todo o mundo.