Propostas para redução de 2 milhões de contos dos gastos públicos
Orlando Dias, deputado do MpD em rota de colisão com a actual liderança do partido, quer uma reforma do Estado, com vista a contenção de despesas. Nas suas contas é possível poupar até 2 milhões de contos por ano. Encurralado, Ulisses Correia e Silva defende a reforma do Estado, mas sem contenção de despesas. Na prática, duas perspectivas, no mesmo partido, para o mesmo Estado, Cabo Verde.
O debate do Orçamento do Estado para 2022 acabou por revelar-se uma oportunidade para Orlando Dias voltar a dar nas vistas, nalguns momentos, em clara oposição ao primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, presidente também do MpD. A questão da reforma do Estado e os gastos da máquina pública foram dois exemplos dessa diferença de perspectiva em construção no partido da maioria.
Ao contrário de UCS que parece resignado com os níveis de despesas do Estado, aquele parlamentar considera que é possível poupar cerca de dois milhões de contos com uma adequação da máquina do Estado aos novos tempos.
Partindo do pressuposto de que o Parlamento é o centro do poder, Dias defendeu, durante o debate do OE para 2022, na generalidade, que os parlamentares não devem ficar à espera do Governo para avançar com propostas para a reforma do Estado.
“O Parlamento pode, enquanto centro do poder cabo-verdiano, casa das leis, impor, democraticamente, o Governo a fazer a reforma do Estado, começando pela Constituição da República”, lembrou, a propósito.
“Com dois terços (dos votos) podemos colocar no Orçamento do Estado que qualquer Governo não pode nomear mais de 15 membros. Isso pode ficar plasmado na Constituição da República”, acrescentou.
Dias defende ainda a redução do número de deputados de 72 para 52, assim como a diminuição do número de vereadores e deputados municipais (9 para 7; 7 para 5; 5 para 3; 21 para 17; 17 para 13; 13 para 9).
E propõe, igualmente, a redução, para metade, dos institutos públicos e instituições equiparadas e, concomitantemente, a diminuição das viaturas do Estado.
O deputado ventoinha defende que, excepto o presidente da República, o presidente da Assembleia Nacional, o primeiro-ministro, o vice-primeiro-ministro e o ministro dos Negócios Estrangeiros, “todos os outros dirigentes do Estado e funcionários devem passar a viajar na classe económica”.
Salários no Estado
Orlando Dias propugna a proibição de salários no Estado, incluindo políticos, e defende que seja estipulado um teto salarial máximo de 200 mil escudos na administração do Estado e empresas públicas.
Este parlamentar quer também que seja aprovada uma legislação para punir, “severamente”, o nepotismo, clientelismo, amiguismo, e compadrio na função pública e nas empresas do Estado, “como uma das formas de reduzir a acentuada desigualdade social que ainda existe na sociedade cabo-verdiana”.
Com essas medidas, Orlando Dias considera que o Estado pouparia cerca de dois milhões de contos, anualmente, que poderiam ser aplicados na educação, na saúde, na luta contra a pobreza e emprego para jovens.
O mesmo deputado reconhece, no entanto, que, para que as referidas medidas sejam implementadas será necessário avançar com uma revisão constitucional, assim como a revisão dos Estatutos do Municípios e aprovar novas leis.
Ulisses na defensiva
Por seu turno, em relação à reforma do Estado, o primeiro-ministro fez saber que “há um processo avançado de definição, elaboração, discussão e debate da estratégia da coesão territorial e do desenvolvimento local e regional, que darão origem a processos legislativos, nomeadamente do reforço da descentralização, e queremos ver o PAICV disponível para debater essas questões”.
Ulisses Correia e Silva ressalvou, entretanto, que o objectivo não é fazer a contabilidade da despesa a nível da descentralização e da reforma do Estado. “O objectivo é o desenvolvimento local, regional e nacional”, sublinhou.
“É com esse entendimento é que devemos analisar a contribuição positiva, no sentido de criarmos reformas ‘reformistas’ para dotar a nossas ilhas com uma economia mais dinâmica, reduzir as assimetrias regionais em convergência com os objectivos de desenvolvimento sustentável, reduzir a pobreza, aumentar a coesão social, aumentar o crescimento económico a partir de uma boa gestão do território”.
Para UCS, a reforma do Estado deve ser encarada numa perspectiva de desenvolvimento e “não na perspectiva de que a decentralização seja um encargo e que o Estado é um encargo” e que, com isso, “agora vamos fazer a contabilidade. Precisamos fazer a contabilidade do desenvolvimento, do crescimento e da melhoria das condições de vida das populações”.