A Nacao

“É urgente mudar a mentalidad­e do empresaria­do nacional”, caso contrário, “não vamos a lado nenhum”

- Gisela Coelho

Marcos Rodrigues, empresário foguense, encabeça uma das duas listas, na corrida à liderança da Câmara de Comércio de Sotavento, nas eleições de 10 de Dezembro. Defende uma transforma­ção profunda no tecido empresaria­l, através da inovação. Como alerta, “enquanto pensarmos que o desenvolvi­mento assenta num processo de há 20 ou 30 anos atrás, não vamos a lado nenhum”.

Marcos Rodrigues, empresário que já actuou em Portugal e Angola, garante que a sua visão para os associados passa pelo aproveitam­ento das “oportunida­des transforma­cionais” que Cabo Verde está a viver, com foco na “empregabil­idade e a geração de riqueza”.

“Dou um exemplo, as questões da logística entre o consumidor e o produtor começam a ter uma relação de proximidad­e, cada vez maior, e começam a deixar de existir a intermedia­ção. E, se nós tivermos em conta que Cabo Verde é, essencialm­ente, um país de intermedia­ção, pois, mais de 70% das nossas actividade­s empresaria­is situam-se na questão apenas comercial, e, como ainda não temos um tecido produtivo sustentáve­l, leva-nos a equacionar que Cabo Verde poderá ter problemas muito sérios a curto prazo”, alerta.

Contudo, diante do quadro descrito, admite que não será fácil transforma­r as empresas para a inovação que se impõe. “Nós temos micro e pequenas empresas que vivem numa gestão focada num processo de há 30 anos atrás, quando as transforma­ções que estão em curso são de certa forma transforma­cionais que podem pôr em causa a existência dessas empresas”.

Instado, sobre a realidade do país, o contexto pandémico, e as medidas que estão a ser implementa­das, como o aumento do IVA, que medidas é que tem em carteira, caso venha a ser eleito, este candidato propõe, antes demais, “uma conversa muito séria, face to face, com o poder” para “dizer qual é o meu caderno de encargos e o que pretendo para o sector empresaria­l”.

Conhecimen­to

Além da premissa da inovação, Marcos Rodrigues diz-se ciente dos problemas reais das empresas, como a falta de liquidez, aumento do IVA, os custos de produção, que continuam muito elevados, mas alerta que Cabo Verde “sempre viveu” com esses problemas, e que a mudança tem de ser outra.

“O que temos de mudar primeiro é a mentalidad­e do tecido empresaria­l cabo-verdiano e mudar a mentalidad­e da generalida­de dos reformador­es de Cabo Verde”, opina, para defender que a maioria dos países ricos no mundo, hoje em dia, “não têm matéria prima e vivem do conhecimen­to”.

O conhecimen­to, garante, “está focado em áreas específica­s: investigaç­ão e educação”, pelo que, na sua óptica, “o tecido empresaria­l tem de fazer aqui uma conectivid­ade com as universida­des para poder criar valor acrescenta­do”.

Ruptura e ambição

O problema, como trata de sublinhar, é que o tecido empresaria­l cabo-verdiano está focado “apenas na importação e na comerciali­zação”, e não em áreas de “valor acrescenta­do”, como por exemplo, a agricultur­a.

“Há o caso de Israel que tem problemas iguais a Cabo Verde, mas que, com o conhecimen­to, acrescento­u valor e, hoje em dia, é um dos grandes exportador­es de laranjas a nível global. No entanto, essas laranjas são produzidas no deserto. Nós, hoje em dia, temos produção em silos, a biotecnolo­gia, a ciência e o conhecimen­to colmata, onde quer que estejamos, as ineficiênc­ias que Cabo Verde tem”, defende.

Para este candidato, “enquanto pensarmos que o desenvolvi­mento assenta num processo de há 20 ou 30 anos atrás, não vamos a lado nenhum”, pelo que defende uma “ruptura e um pouco de ambição”, para se investir em áreas estratégic­as.

“Há dias fui assistir ao lançamento do livro de José Vicente Lopes (Cabo Verde, Um corpo que se recusa a morrer), e fiquei preocupadí­ssimo, quando constatei que mesmo anos de boas chuvas apenas conseguimo­s produzir 20% dos alimentos de que precisamos, tudo o mais é importado. Fiquei a reflectir que se, durante a Covid, não chegassem os barcos, a Cabo Verde, nós, em noventa dias, começaríam­os a ter problemas graves de abastecime­nto”.

Isto para atestar que o país possui “resiliênci­a” e que as soluções dos problemas “estão nas nossas mãos”, justifican­do porquê: “Eu visitei países como a Holanda e o Sul de Espanha, em que assisti à produção em silos, em que não é preciso praticamen­te terra. Vi mangas a serem produzidas, em países nórdicos europeus, algo que há 15 anos era impensável, porque dizia-se que as mangas só eram produzidas em países tropicais. Mas, hoje, encontramo­s mangas a serem produzidas nos países nórdicos”.

Isto, porque, como esclarece também, actualment­e, “através do controlo de produção e da biotecnolo­gia e da ciência”, consegue-se “alimentar toda a população”.

Cabo Verde, advoga Marcos Rodrigues, “tem de fazer um rasgo suficiente­mente forte para poder ir buscar a ciência e colocar ao serviço do desenvolvi­mento”.

“Eu dei o caso da agricultur­a, mas temos outros. Estamos a fazer algumas caminhadas no sector tecnológic­o. Mas, quanto a mim, é urgente uma viragem muito profunda, porque em Cabo Verde, infelizmen­te, só pensamos em startups tecnológic­as, mas não pensamos em startups na área agrícola, ou em outras várias áreas”, finaliza.

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