Proposta de remoção de monumentos e a controvérsia gerada dentro e fora de Cabo Verde
Em Junho de 2020, à semelhança do que vinha acontecendo em vários países, na Europa, nos EUA e no Brasil, Gilson Varela, um cabo-verdiano da diáspora, endereçou uma carta ao presidente da República, da Assembleia Nacional e ao Governo, a defender a remoção de monumentos considerados pró-esclavagistas e lançou, posteriormente, uma petição para o efeito.
Da proposta constava, igualmente, a retirada de nomes das ruas do mesmo período, no fundo, uma reedição do “saneamento” feito em 1975.
Com a polémica, o ministro da Cultura e das Indústrias Criativas, Abraão Vicente, garantiu que “não há estátuas a serem removidas em Cabo Verde” e defendeu que o país precisa conhecer a sua história de forma profunda.
No entanto, na percepção do promotor da petição “Remoção de monumentos pró-esclavagistas e coloniais em Cabo Verde”, a ideia não é apagar a história, mas sim ensinar e contar a história de Cabo Verde como aconteceu, sendo certo que parte dessa história será apagada tanto nos países colonizadores como os países que foram colonizados.
No caso da estátua do “descobridor” de Cabo Verde, diz aquele cidadão, “Diogo Gomes não foi só um descobridor, mas também um traficante de escravos, e nesse sentido é necessário possivelmente criar uma comissão de historiadores para investigar exactamente o que aconteceu”. Isto é, se faz sentido um país vítima da escravatura homenagear um “escravocrata”, como é o caso desse navegante.
Em Agosto de 2021, o promotor da referida petição voltou à carga, entregando desta feita ao presidente da Assembleia Nacional, Austelino Correia, o documento com mais de 1.800 subscrições, o que de novo gerou vários comentários sobre o assunto.
Carlos Morgado, director da revista Master Menu, comentou, ironizando, numa publicação no Facebook que, a ter que levar a sério Gilson Varela, não será só a estátua de Diogo Gomes a ser removida do local em que se encontra.
“Também tem que acabar com a cidade velha, com a língua que ele (Gilson Varela) fala, já não sei qual, a sua identidade com mistura dos povos africanos e outros povos. Tinha que acabar com muita coisa, a própria independência de Cabo Verde estaria em jogo”.
Por sua vez, Melissa Rodrigues, uma jovem cabo-verdiana da diáspora declarou “tantos comentários sem conhecimento histórico (...) são o reflexo da importância e urgência que Cabo-verde tem de pensar o seu passado colonial (ainda muito presente)...”
Francisco Lopes Moreira, guia turístico do Instituto do Património Cultural (IPC), afirma que respeita a opinião de outrem em relação a este assunto, sem dúvida apaixonante, mas entende que as estátuas não devem ser retiradas porque fazem parte da história “única” de Cabo Verde.
“São pessoas que marcaram uma época e a história de Cabo Verde e são referências fortes para a nossa história única de Cabo Verde e do mundo”, ressalta Moreira, afirmando ainda que é graças a toda essa história que emergiu a Nação cabo-verdiana.
Ao tomar parte desta controvérsia o historiador Daniel A. Pereira entende que “a História assume-se, não se contesta”. E explica: “Não fomos nós a escolher a nossa história. Houve escravatura em Cabo Verde durante quatro séculos e esse facto marcou-nos profundamente. Temos que saber gerir como é que isso nos marcou, que mal nos causou e como poderemos ultrapassar os nós que temos na cabeça”. TS