Colmeia, a associação que acolhe para transformar a dor em perseverança
ACOLMEIA, Associação de Pais e Amigos de Crianças e Jovens com Necessidades Especiais, nasceu em Abril de 2014, na Praia. Os seus membros, no geral, são familiares que, ao invés de lamentarem a dor de terem filhos com deficiência, escolheram lutar, dando uma vida o mais normal possível aos seus ente-queridos e, mais do que isso, acolher outros na mesma situação.
A presidente da Colmeia, Isabel Moniz, diz que actualmente apoia e acompanha, de diversas formas, cerca de 500 famílias/crianças e jovens com necessidades educativas especiais. Acreditando que a união faz força, a associação, que tem de entre os seus fundadores a ex-primeira-dama, Lígia Fonseca, lançou-se ao trabalho, alargando a sua esfera de acção.
“Queríamos respostas a nível de saúde, educação, proteção social e outros que os nossos filhos na altura não tinham, isto além falando de informações, que também não havia”, explica Isabel Moniz sobre a associação que acolhe neste momento cerca de 52 famílias/crianças e jovens autistas a nível nacional.
Um dos problemas era o estigma encontrado, muitas vezes, dentro das próprias famílias em relação ao seu elemento portador de necessidades especiais. “Existiam, e ainda existem, grandes problemas em relação a lugares para os pais deixarem os seus filhos; na altura, apesar de as escolas aceitarem estas crianças, muitos pais entendiam que se estas crianças fossem para a escola aceitar ou não cabia aos professores”.
A Colmeia teve por isso que trabalhar na sensibilização social, relembrado a nossa entrevistada o caso de uma criança da Ribeira da Barca, interior de Santa Catarina de Santiago. Numa das suas primeiras actividades descentralizadas conseguiram dar orientações à mãe e à toda comunidade na altura, com uma visão muito estereotipada da criança, a actuarem de outra forma.
“Sobre essa família, graças à Colmeia, a criança passou a fazer acompanhamento e a sua mãe passou a ser o ponto focal da associação em Santa Catarina.
Respostas a nível de políticas públicas
“Ultimamente”, diz a entrevistada do A NAÇÃO, “temos trabalhado na sensibilização dos poderes públicos para dar respostas precisas e diferenciadas para esta comunidade, uma vez que se a deficiência física é vista e compreendida mais facilmente, as deficiências intelectuais são diferentes e precisam de melhores respostas”.
Hoje, segundo Moniz, o Hospital Agostinho Neto reconhece que, com a Colmeia, a procura de atendimento para casos “necessidades especiais” aumentou.
Em reconhecimento do trabalho que vem desenvolvendo, a Colmeia conseguiu um espaço próprio, cedido pelo Governo, além de apoios de várias outras entidades, inclusive privadas.
A associação conta, igualmente, com sete especialistas (psicólogo, terapeuta, neuropsicólogos, fonoaudiólogos, assistente social, técnica de educação especial), formando, assim, uma equipa multidisciplinar para melhores respostas. Tem também parcerias com entidades estrangeiras, com resultados positivos, particularmente nos domínios da formação.
Desafios que persistem
No entanto, diz também, os desafios continuam a ser muitos, com a realce para o financeiro, uma vez que a associação sobrevive com um subsídio do Estado que não cobre todas despesas e não permite as respostas desejadas.
“Um dos nossos maiores problemas é manter os técnicos que trabalham connosco há muito tempo. Estamos sistematicamente a tentar, em contacto com o Governo, ver se conseguimos melhorar o valor do subsídio que nos é atribuído para com isso melhorar as condições de trabalho não só aqui no centro, mas também nas localidades onde actuamos. Mas não tem sido fácil”, desabafa Isabel Moniz sobre a associação que, apesar de estar sedeada na Praia (Cidadela) é de âmbito é nacional.
“Financeiramente as nossas condições não nos permitem estar nas restantes ilhas, além de Santiago. Articulamos com
o Hospital Central da Praia com quem temos uma boa relação, mas precisamos de mais intervenções para responder a todos que nos procuram. Os pedidos para nossa intervenção chegam-nos de todos os lados”, realçando que, em Santiago, mais concretamente no interior, conseguem estar mais presente com feiras especializadas, nas localidades, e intervenções a domicílio “sempre que possível”.
De entre outras inquietações, Isabel Moniz diz que neste momento a Colmeia tem montada uma formação de despiste vocacional para trabalhar com adolescentes, outros que nunca tiveram contacto com os primeiros serviços, sendo que as preocupações específicas são para que estas crianças estejam em salas de aulas.
Como salienta, as escolas também precisam preparar a fase de infância para que as crianças com necessidades especiais tenham serviços de intervenção precoce, professor de apoio, para com isso conseguir, de facto, avançarem na escola. Sem contar a necessidade de respostas a nível das famílias em condições de pobreza que precisam de proteção social.
“As famílias com menos condições devem estar incluídas no cadastro para terem rendimento social, aqueles que trabalham precisam estar no regime contributivo. Temos estado a articular com poderes públicos para fazer com que esta parte funcione da melhor forma possível. Isto porque se trabalharmos as famílias e instar-lhes a procurar ajudas e depois não encontrarem, isto pode fazer com que voltem a isolar-se”, explicou, realçando que isto poderá pôr em causa todo o trabalho da associação desde 2014.
Relativamente à questão da inclusão, Isabel Moniz diz que a Colmeia tem feito o que pode e que um dos trabalhos mais importantes é levar a sociedade a livrar-se dos preconceitos em relação ao portador de necessidade especial seja ela qual for. “Posso ter uma deficiência, mas sou um ser humano. Não me rotule” é o nome de uma campanha lançada pela associação.
Mas os problemas são mais complexos e, também, mais “terra a terra”.
“Infelizmente, ainda temos graves e preocupantes problemas a nível da proteção social, crianças sem subsídio de deficiência, entre outras respostas, que consideramos poucas ou insuficientes a nível do poder central ou local, nomeadamente respostas multidisciplinares e pluridisciplinares que não são apenas para crianças e jovens que nasceram na condição de deficiência mas também para outras pessoas em caso de acidente de trabalho para nos apoiarem a habilitar”.
A nossa entrevistada acredita que as soluções, a nível de inclusão, só serão possíveis depois de todo um trabalho a nível de infância, serviço de intervenção precoce, professor de apoio, proteção social, a nível de regime contributivo e não contributivo. E que estas respostas sejam dadas a nível do país, lembrando que as ONG’s são parceiras do Governo e que, nessa missão, precisam de meios e condições para, no caso particular da Colmeia, ter mais e melhores respostas.
Isabel Moniz diz que neste momento a Colmeia tem um grupo de trabalho para melhoria de condições das pessoas com deficiência que neste momento está a elaborar estratégias para ter mais respostas a nível de proteção social, por exemplo. “Estamos nisso permanentemente para os próximos segmentos, e qual estratégia de pressão vamos usar para atingirmos os nossos objectivos de colocar a temática da deficiência na agenda política e social do país. Isto tendo em conta que é uma resposta que todos os cidadãos precisam”.
RM