Tigana prepara-se para deixar o futebol
Tigana, apelido inspirado no célebre jogador francês nascido no Mali, estreou-se cedo no mundo da bola. Em 1999, aos 16 anos, recebeu a confiança do treinador Tó Lobo para representar o Boavista Clube da Praia. E não mais parou. Ora, em Cabo Verde, ora no estrangeiro, neste caso, quase sempre como Tubarão Azul.
Hoje, ao fim de vinte anos de carreira, que acumula com a profissão de professor de educação física, o corpo deste veterano ressente-se. Residente na Achada Santo António, Praia, todos os dias, levanta-se às seis horas para dar aulas na Assomada.
A seu favor tem um vasto currículo, a maior parte do tempo como “capitão” do Sporting da Praia, time pelo qual foi quatro vezes campeão nacional, oito vezes campeão de Santiago Sul (1 pelo Travadores, 6 pelo Sporting, 1 pelo Boavista), além das 10 internacionalizações A pleas selecções de Cabo Verde e de Santiago.
“Comecei a jogar futebol com 9 anos, na EPIF (Escola de Preparação Integral de Futebol), incentivado pelo meu pai. E logo despertei a atenção das equipas da primeira divisão; com 16 anos fiz a minha estreia no campeonato, pelo Boavista”, conta ao A NAÇÃO.
Como médio-ofensivo, aos poucos, foi ganhando maturidade, mostrando possuir boa capacidade de visão do jogo, no passe, na técnica e na sua execução, qualidades essas que despertaram o interesse dos Travadores, que o mobilizou na temporada 2003/2004, sangrando-se campeão de Santiago.
O talento acabou por levá-lo ao Sporting Clube da Praia, sua actual equipa, onde foi um dos pilares de uma época vitoriosa, especialmente pela sua importância táctica, o que lhe valeu a distinção de melhor jogador de Santiago Sul e de Cabo Verde na temporada 2004/2005 e medalha de mérito desportivo do governo.
Além das três épocas seguidas
passadas no Sporting, Tigana teve também uma rápida passagem pelo 1º de Maio de Angola. No regresso à sua terra-natal tinha o Sporting a esperá-lo, conquistando quatro vezes o campeonato nacional (2006, 2008, 2012, 2017), cinco vezes campeão de Santiago Sul (2006, 2007, 2008, 2012, 2018) e cinco taças de Santiago Sul (2004, 2006, 2008, 2012, 2018).
O ponto alto do seu trajecto futebolístico coincide com a sua passagem pela Seleção de Santiago e também pelos Tubarões Azuis, onde se estreou no amistoso entre Cabo Verde – Angola, que aconteceu em Portugal.
Desporto x profissão
Ao fim de todos estes anos, assoberbado por afazeres profissionais, Tigana começa ver a aproximar-se a hora de, no mínimo, preparar a retirada. Ter que levantar todos os dias, às seis horas, para ir dar aulas na Assomada, além dos treinos e jogos, é algo que vai pesando.
“Para ser sincero”, confessa, “eu sou muito disciplinado no que diz respeito aos treinos, mas este ano está a ser muito difícil para mim, porque não tenho tempo para treinar com a minha equipa, por questões profissionais”.
Ou seja, ultimamente, não tem sido fácil aliar a profissão e a rotina de treinos, considerando a responsabilidade de um professor de Educação Física, ainda mais, num município diferente e distante do seu local de residência.
“Todos os dias, levanto-me às seis da manhã, para conseguir apanhar o transporte e assim chegar pontualmente às aulas na Assomada. Regresso à Praia por volta das 14 horas, faço a minha refeição de almoço para posteriormente, às 16:30, ir treinar sozinho ou com equipas que eu encontro por lá”, frisa.
Momentos inesquecíveis
De acordo com o jogador, que tem como ídolos Iniesta e Cristiano Ronaldo, de todos os golos marcados, o inesquecível foi em 2007 ao serviço dos Tubarões Azuis contra a selecção do Mali, na final da Taça Amílcar Cabral, em Bissau. Já na época 2009/2010, voltou a vestir a camisola dos axadrezados e ajudou o Boavista a ganhar a taça e o campeonato de Santiago.
Depois regressou ao Sporting, ganhando tudo a nível nacional com as cores verde e branca. Desde 2015 que Tigana é dono da braçadeira de capitão pelos leões, e confessa: “Mais do que um agrado, a braçadeira foi sempre uma responsabilidade que cumpri com rigor”.
Por isso é com emoção que confessa também: “O Sporting sempre está no meu coração, então, não digo que vou deixar tudo, mas sim dedicar o meu empenho no desporto em outras paragens, considerando que sou licenciado em Ciências do Desporto”.
Ao todo foram 15 anos de leão ao peito, onde viveu os melhores momentos da sua vida profissional, e é um dos jogadores que mais troféus ganhou.
Exemplo aos jovens
João “Tigana” Robalo é também um exemplo a seguir pelos mais jovens, isto é, no seu caso, o amor pelo futebol não o impediu de continuar a estudar e formar-se, prova de que, com ambição e a força de vontade, tudo se consegue.
“Sim, é verdade, andei saturado alguma parte do tempo, tanto nos treinos como na universidade. Mas a sensação é de dever cumprido e de realização, isso supera todo o cansaço. Por isso, o conselho que tento transmitir aos mais novos é que se apliquem nos estudos e que nunca desistam da escola pelo sonho de ser jogador de futebol, porque dá para conciliar ambas as coisas”, conclui.
João “Tigana” Robalo, 38 anos, pensa em pendurar as botas e ceder a braçadeira de capitão do Sporting Clube da Praia a um outro continuador. Residente na Achada Santo António, diariamente, desloca-se a Assomada, para trabalhar como professor de Educação Física. Ao todo, são já vinte anos a correr atrás da bola e da vida.