“Nunca tivemos uma política pública voltada para a segurança”
A criminalidade aumentou 33 por cento (%) em Cabo Verde, comparativamente ao ano de 2020, e a ilha de Santiago registou um aumento de ocorrências na ordem de 54,7%, segundo os dados da Polícia Nacional (PN) apresentados em Março deste ano.
Face a esse cenário, em que Praia responde pelo maior número de ocorrências, o sociólogo Redy Wilson Lima explica que a percentagem apresentada referente a criminalidade é apenas um indicador e que por isso a realidade poderá ser bem mais amarga e dolorosa para as vítimas e seus familiares.
“A situação actual vem de um ciclo que começou em 2020. Estamos a falar de criminalidade não deste ano de 2022 mas sim de uma tendência que iniciou em 2020”, entende este especialista, doutorado em Estudos Urbanos, com pesquisas etnográficas nos campos da sociologia urbana, sociologia da violência e do crime, sociologia da juventude e movimentos sociais.
Conforme explicou com base nos resultados apresentados pela PN em Março, “há uma dinâmica interessante que mudou, nomeadamente, a partir de 2020, onde voltamos a ter tiroteios nas ruas, uma situação sem muito conhecimento desde 2012. Não é que não ocorreu, pois temos bairros que nunca pararam. Mas a maior parte dos bairros da cidade da Praia têm outros tipos de criminalidade”.
Tendência para aumentar ou diminuir?
No entender deste sociólogo, a criminalidade aumentou em 2020 (resultados apresentados só agora em 2022) e provavelmente voltará a diminuir neste ano, para aumentar no próximo.
“De repente, com estas operações especiais, com policiais na rua para cercar os bairros, deter os indivíduos, claramente que as ocorrências vão diminuir consideravelmente. No entanto, o trabalho de base fica a faltar como sempre porque aqui, nunca tivemos uma política pública voltada para a segurança”, entende.
“Temos em Cabo Verde uma política desagregada que não trabalha a generalidade. Precisamos de políticas mais assertivas com base nos diagnósticos, para ser trabalhado de forma integrado”, defende.
Redy Wilson Lima diz que o país precisa ver a criminalidade na sua forma mais abrangente, tendo em conta as várias causas. “Precisamos entender que a criminalidade não é uma questão policial apenas. Ela é também uma questão social que precisa ser compreendida para medidas mais acertadas”.
Pobreza deixou de ser um factor de criminalidade
Como refere também, “a criminalidade tem a ver com vários factores e a pobreza não é uma delas. Por exemplo, a desigualdade e o empobrecimento são um dos factores mas não é um factor em si, sendo que aqui não temos factores principais ou específicos”.
E continua: “A pobreza como factor de criminalidade foi descartada desde a década de 1950. Esta questão está mais interligada com a inflação de expectativas, onde existe uma sociedade desigual em que os meios para atingir os fins não são iguais. Quando temos uma inflação de expectativas, isto pode vir a ter a criminalidade como resultado. Existem outras coisas”.
“Cada pessoa vai de acordo com a sua personalidade, o seu contexto. Por exemplo, uma pessoa pode ter um rendimento menor do que os seus gastos e isso junto com outros factores complementares, pode levar a este fim”, explica o sociólogo, para quem políticas públicas, “sem ser planos de acção”, podem ajudar a resolver a criminalidade não só na cidade capital, como no país, em si.