Arguidos podem beneficiar de alegado erro material
Prazos de prescrição dos crimes de corrupção
O Código do Penal continua envolto em polémica, tudo por causa dos prazos de prescrição dos crimes relacionados com a corrupção e outros. Como já não se pode fazer uma rectificação da Lei, por se ter esgotado os 90 dias para o efeito, o Governo decidiu fazer mais uma alteração legislativa desse diploma. Mas, com esta alternativa, os arguidos indiciados nesse tipo crimes poderão invocar o princípio da retroactividade da lei penal mais favorável e, com isso, não serão julgados.
Detectado o chamado lapso ou o alegado erro material na quarta revisão do Código Penal, e perante o facto de não se ter levantado essa questão dos prazos de prescrição 90 dias depois da publicação do diploma no Boletim Oficial (BO), e, tendo em conta que já não se poderia fazer a alteração por mera retificação, o Governo decidiu fazer uma alteração legislativa.
Ou seja, o Palácio da Várzea levou o Código Penal mais uma vez ao Parlamento para se fazer uma alteração no sentido de se aumentar os prazos prescrição dos crimes de corrupção passiva e ativa, assim como o tráfico de influências, para os limites máximos.
Mas o dilema reside no facto de que com a alteração dessa lei estar-se-ia a admitir que, no passado, se permitiu que os prazos prescricionais foram menos do que aquilo que se pretendia. Isso implicaria, entre outras consequências, que os arguidos indiciados nesses crimes puderam invocar o princípio da retroatividade da lei penal mais favorável.
Conforme um jurista consultado pelo A NAÇÃO, esta solução é “inaceitável”, porquanto houve uma publicação inexacta da última revisão do Código Penal, onde se registou uma diminuição dos prazos de prescrição para esses crimes, contrapondo com as recomendações internacionais sobre a matéria. Ou seja, “houve uma alteração daquilo que era vontade do legislador”.
No entendimento do nosso interlocutor, a solução passa por determinar que, desde a última alteração ao Código Penal, esses prazos prescricionais são os máximos. Porquanto a proposta que o Governo faz “só teria efeitos de agora em diante”, o que quer dizer que “todos quantos que cometeram crimes no passado beneficiariam disso”.
A nossa fonte considera ainda que se deveria adoptar medidas no sentido de se fazer com que os prazos de prescrição máximos entrassem em vigor desde da data de entrada em vigor da última revisão do Código Pena, porquanto “foi essa a vontade do legislador”.
Recurso ao Tribunal Constitucional
Se a questão é declarar a inexistência jurídica ou a inconstitucionalidade formal e orgânica dessa “pretensa” alteração ao Código Penal, só o Tribunal Constitucional pode fazer isso, dado que o Parlamento “não pode declarar a inconstitucionalidade de uma norma e sem inconstitucional não tem validade jurídica”.
“No fundo não é uma norma, porquanto não foi votada e nem promulgada pelo Presidente da República. Ou seja, é juridicamente inexistente e ninguém pode invocá-la para ganhar direitos” esclarece a nossa fonte que considera que, nesse caso, dever-se-ia fazer uma retificação legislativa e não uma retificação administrativa, porquanto a segunda opção teria que ser feita num prazo de 90 dias a contar da data da publicação do diploma.
Da sua parte, o Governo insiste na questão da alteração das normas relativas aos prazos de prescrição, o que “é admitir que já havia sido feita uma primeira alteração e isso daria direitos a pessoas indiciadas por terem cometido esses crimes”.
A NAÇÃO sabe, no entanto, que um grupo de deputados do Grupo Parlamentar do PAICV vai avançar “rapidamente” com um pedido de fiscalização sucessiva da constitucionalidade dessa norma, na perspetiva que o Tribunal Constitucional venha a declarar a sua inconstitucionalidade.