A Nacao

Do discurso à prática

José Brito acredita que a economia digital e a indústria criativa podem ajudar a alavancar o desenvolvi­mento de Cabo Verde e de África, mas que é preciso passar do discurso à prática, com políticas de “consistênc­ia”.

- Gisela Coelho

Particular­mente no que toca a Cabo Verde, o economista e empresário José Brito vislumbra potenciali­dades de desenvolvi­mento do país a nível da economia digital, tendo em conta que vivemos, actualment­e, num mundo tecnológic­o, onde há uma mudança de paradigma do desenvolvi­mento.

“Não é mais o problema da questão de ser um pequeno país. Ruanda é um pequeno país e está a dar o exemplo, em termos de desenvolvi­mento tecnológic­o. E Cabo Verde também pode, mas tem de acreditar que é possível, e que há uma oportunida­de, hoje. E que tem de se investir em concreto e não em discurso. Porque há muito discurso sobre a economia digital”, explica.

Colonizaçã­o digital

Brito recorda que foi dos primeiros a criar uma empresa de economia digital (Bonako) em Cabo Verde, porque acreditou nessa mudança. “Criei a primeira Cimeira sobre a Inovação em África (2014), para colocar a Inovação na agenda das políticas públicas para o desenvolvi­mento”.

A economia digital, alerta, está a mandar no mundo. “São as grandes multinacio­nais, não são mais os governos. Estamos a correr o risco, neste momento de uma colonizaçã­o digital. Hoje em dia estão a colonizar o meu pensamento. Antigament­e, o colonialis­mo era uma presença física e, hoje em dia não é preciso uma presença física. Estão a levar-me a votar em tal pessoa, porque têm meios de influencia­r o meu cérebro, a fazer isso. Isto é o novo colonialis­mo digital”.

Mas há outros lados positivos do mundo digital e que podem ser aplicados, por exemplo, à indústria criativa, como fonte de produção de riqueza. “Vamos ver o que África tem de dar. Vamos ver o caso da música. Não há melhor criador, na área, do que os africanos. São eles que dominam nos Estados Unidos, com a diáspora afro-americana, etc.”, exemplific­a.

Domínio do Norte

Porém, o sistema de comerciali­zação desta criativida­de, como afirma, é ainda dominado pelo “Norte”. “Temos o Google, Facebook, Youtube, que utilizam tudo isto em proveito deles.

Nós temos de criar as nossas plataforma­s e dar ao criador africano a possibilid­ade de ganhar com o seu trabalho. Isto é uma luta que, infelizmen­te, não chega a nível superior da governação do país, que não tem essa perspectiv­a, que nós podemos, de facto, fazer isto”.

Contudo, acredita que isso é possível, só que é preciso investir na educação das pessoas e “num ecossistem­a de apoio à inovação” para permitir isso.

Este analista tem plena confiança que a economia digital pode fazer acelerar o desenvolvi­mento de África e de Cabo Verde.

“A Finlândia, quando lançou o Skype, não tinha nada. No Kenya foi a mesma coisa e, hoje, é uma referência do ponto de vista internacio­nal, em que com a moeda numérica (M-Pesa) já estão a outro nível”.

Moeda digital

No que toca, por exemplo, ao uso da moeda digital em Cabo Verde, ainda estamos longe disso. “Temos entidades extremamen­te conservado­ras, particular­mente o Banco de Cabo Verde. Tentei lançar há uns anos atrás a transferên­cia de dinheiro online e não consegui obter licença. Disseram que era por causa de que não havia lei para regulament­ar”.

Isto porque, como recorda, o BCV tinha medo do branqueame­nto de capitais e não fizemos como fez o Quénia. “O Banco Central era contra, mas o Governo disse que não e que iam deixar desenvolve­r essa indústria e depois regulamos. Porque você não pode regular algo que não existe, tem de existir para você regular”, argumenta.

José Brito conclui que ao se negar a globalizaç­ão em Cabo Verde, podemos estar “a impedir” o desenvolvi­mento de “algo totalmente novo”.

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