“O problema é político e problemas políticos não se resolvem com inspecções administrativas”
A crise instalada na Câmara Municipal de São Vicente, para o economista e consultor Avelino Bonifácio Lopes, é resultado da falta de preparo político dos sujeitos que fazem parte da câmara e assembleia municipais daquela ilha. A resolução do problema, defende, passa pela intervenção política do Governo, que deve mediar o diálogo e a negociação, ou, em última instância, por eleições antecipadas.
Após se anunciar a ida, a São Vicente, de uma equipa que, a princípio, pareceu ser uma intervenção do Governo para mediar os problemas entre o edil Augusto Neves e os vereadores da oposição (UCID e PAICV), os serviços de Inspecção e Auditoria Autárquica, do Ministério da Coesão Territorial e da Inspeção Geral das Finanças esclareceram, na sexta-feira, que se tratou de uma acção de averiguação “puramente administrativa”, tendo como foco uma reunião e deliberações de Janeiro do corrente ano, e não de uma mediação política.
A acção, segundo a mesma fonte, foi determinada com base nas solicitações dos vereadores do PAICV, da UCID e da Assembleia Municipal.
Ora, essa intervenção administrativa, no entender do analista Avelino Bonifácio Lopes, em entrevista ao A NAÇÃO, só teria efeito se fossem
identificados incumprimentos legais graves, susceptíveis de causar a perda de mandato.
“A ausência de resultados não me surpreende. Creio que o problema é muito mais político e um problema político não se resolve através de inspecções mandadas fazer por agentes administrativos”, considera.
Segundo frisou, inicialmente tinha-se a percepção de que iria a São Vicente uma delegação governamental, investida de poderes políticos, eventualmente para intermediar as partes. Entretanto, o que aconteceu foi uma missão técnica e dela “só resultaria alguma coisa se de facto pudessem encontrar incumprimentos legais graves que pudessem suscitar a perda de mandato”.
Governo precisa intervir politicamente
Avelino Bonifácio espera e acredita que o impasse seja resolvido por via da negociação e do entendimento, a bem dos interesses de São Vicente e da sua população.
“Os sujeitos autárquicos de São Vicente devem compreender que estão investidos dos votos dos sanvicentinos para elevados cargos. Foram eleitos de acordo com a vontade popular para coabitarem. E a coabitação exige abertura e disponibilidade de espírito para negociar”. Numa coabitação, adverte, não podem reinar “intransigências”.
Portanto, prossegue, “o Governo deve procurar intermediar as partes e fazê-las entender que têm responsabilidades, para evitar, primeiro, que São Vicente continue a perder com este bloqueio, após se passar praticamente um ano e meio de mandato sem a câmara funcionar”.
Por outro lado, disse, as “difíceis situações económicas e financeiras que o país vive neste momento não recomendam a realização de eleições antecipadas”.
“Para que isso não venha a fazer escola, nem em São Vicente, nem em outras autarquias que também atravessam dificuldades de entendimento entre os sujeitos autárquicos”, sublinha, tendo presente certamente o caso da Praia como uma outra situação não menos complexa por resolver.
Eleições antecipadas
Para se chegar a um entendimento, considera Bonifácio Lopes, tem de haver abertura de espírito e disponibilidade para negociar e para ceder, em detrimento de egos pessoais e dos partidos e movimentos que suportaram as candidaturas.
Em última instância, far-se-á necessária uma “intervenção mais musculada” do Governo, no sentido de provocar as eleições antecipadas.
“Com os custos económicos e financeiros, sim, mas, pelo menos, mas com a possibilidade de São Vicente poder recuperar os pouco mais de dois anos que ainda faltam até as eleições”, defende.
Tendo em vista que a ilha sai prejudicada deste imbróglio, o consultor espera que os munícipes possam avaliar e tirar as devidas conclusões, no sentido de penalizar os responsáveis e dar um sinal claro de que a “intransigência, a irresponsabilidade e o erro exagerado” por parte de agentes políticos não devem fazer escola em Cabo Verde.