“As pessoas estão a procurar mais os centros de saúde com queixas de saúde mental”
Os centros de saúde têm recebido, cada vez mais, pessoas com queixas de problemas de ansiedade, depressão, psicoses, entre outros. Uso excessivo de cannabis, cocaína e álcool estão entre as razões do mal-estar mental que parece estar a perseguir os cabo-verdianos. Aristides Luz, coordenador do Programa Nacional de Saúde Mental, alerta que os casos de demência estão a tornar-se corriqueiros.
São cada vez mais comuns, nos centros de saúde espalhados pelo país, s diagnósticos de ansiedade, depressão, transtornos derivados do estresse, psicoses, tentativas de suicídios e agudização de doenças mentais como a esquizofrenia e o transtorno de humor bipolar.
Aristides Luz, coordenador do Programa Nacional de Saúde Mental, avança que os casos de demências têm aumentado, assim como doenças mentais promo vocadas pelo consumo de substâncias psicoativas como cannabis, cocaína e álcool.
Além disso, factores de estresse, abandono, exclusão e desigualdades sociais e económicas, a violência e a pobreza e a emergência de saúde pública, guerra e crise climática e alimentar têm contribuído para o aumento de problemas de saúde mental, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) que aponta estas questões como ameaças estruturais à saúde psicológica (ver caixa).
Aumento de problemas de saúde mental
Se antes da pandemia os problemas de saúde mental mantinham uma tendência crescente, com a Covid-19 a depressão e a ansiedade aumentaram mais de 25% no mundo em 2020, segundo dados da OMS. A isso junta-se o problema da insuficiência alimentar, ou até mesde fome, que tem vindo a crescer aceleradamente com a guerra na Ucrânia.
Cabo Verde não foge à tendência. O país registou um aumento na prevalência de problemas de saúde mental em todas as faixas etárias, como informa Aristides Lima que revela, igualmente, que os centros de saúde do país têm recebido, cada vez mais, pessoas com queixas de problemas de saúde mental.
Apesar dos dados não estarem disponíveis publicamente e nem se saber ainda dos impactos da pandemia na saúde mental do cabo-verdiano, sabe-se, entretanto, como avança Aristides Luz, que em São Vicente, por exemplo, em 2020 cerca de 400 pessoas foram atendidas nos centros de saúde da ilha com queixas de saúde mental e em 2021 o número ultrapassou 600 utentes. Já no Hospital Baptista de Sousa, em São Vicente, 1200 pessoas foram atendidas no ambulatório
em 2021, além dos atendimentos nas clínicas privadas.
Número de psiquiatras insuficiente
Este aumento de problemas de saúde mental tem condicionado as respostas dos centros de saúde às questões mentais, que se encontram limitadas em termos de profissionais. A nível nacional há apenas dez psiquiatras, um número insuficiente para corresponder à demanda da população, demanda essa crescente.
Contudo, Aristides Luz, que é também psiquiatra, avança que os centros de saúde, mesmo com as limitações, têm feito o trabalho de promoção da saúde mental. Para este profissional, a limitação de especialistas nas delegacias de saúde “não se trata de um problema de números de profissionais de saúde mental” porque, como diz, caso contrário, “nunca se teria uma cobertura nacional de cuidados de saúde mental”.
“O que nós temos de exigir é que lá onde tem cuidados de saúde que os cuidados de saúde mental estejam incluídos. Todos os técnicos de saúde estão habilitados a oferecer esses cuidados. Podem sim necessitar de apoio especializado, mas não partir do pressuposto que são cuidados prestados estritamente por especialistas”, entende o nosso entrevistado.
Em Cabo Verde esses cuidados têm sido prestados por técnicos generalistas, seguindo orientação da OMS, com uma retaguarda de especialistas para ajudar em caso de dúvidas e capacitações, assegura.
Aristides Luz esclarece que para atenuar o número insuficiente de psiquiatras no país, tem-se recorrido à telemedicina e nas deslocações às estruturas onde não há psiquiatras, num trabalho em conjunto com os técnicos locais. Assegura que há psicólogos em todas as estruturas de saúde, apesar de “alguma carência” de terapeutas ocupacionais e enfermeiros especializados, mas reconhece que “não se pode ignorar os ganhos”.
Controlo das doenças mentais
Para o especialista deve-se actuar nos factores de risco para diminuir a prevalência das doenças mentais, a começar por uma sociedade mais justa com oportunidades para todos, ambiente saudável que ofereça aos jovens oportunidade de autorrealização, promoção de educação inclusiva e um ambiente saudável onde os jovens e as crianças possam desenvolver física e psicologicamente bem.
Para isso, a nossa fonte realça a importância de se investir em políticas públicas para proteger a saúde das pessoas, como a promoção da prática do desporto como forma de inclusão social, mas também de prevenir o desvio de jovens para comportamentos tóxicos, bem como promoção da saúde da terceira idade no sentido de evitar a exclusão e o isolamento e combater o tráfico de drogas. “Infelizmente em todas as esquinas das nossas cidades vendem-se estupefacientes”, diz Aristides Luz.
Cabo Verde possui um Plano Estratégico para a Saúde Mental 2021-2025 que traça as melhores políticas de resposta à doença mental e que pretende apoiar o desenvolvimento de um sistema que promova a recuperação, o bem-estar e a resiliência.
O país regista uma média de 50 casos de suicídios por ano, conforme dados da Direção Nacional da Saúde, com a pandemia a aumentar o comportamento suicida como uma emergência médica que necessita de uma abordagem adequada.
Além dos centros de saúde, Cabo Verde tem três centros de tratamento de doentes mentais, em Santo Antão, São Vicente e Santiago.