Muitos fogos por apagar
EASA fez alertas à TACV desde 3 de Setembro de 2021
A administração da TACV tem procurado escamotear o facto de a companhia ter sido obrigada a cancelar os voos de sábado e domingo, passados, com a desculpa de que tais cancelamentos se deveram a “questões” ou “motivos” operacionais.
A NAÇÃO está, no entanto, na posse de documentos que comprovam que a transportadora aérea cabo-verdiana está impedida de voar para Europa por causa da caducidade do TCO (Operador de Terceiro País) não europeu.
O alerta foi dado desde 3 de Setembro de 2021, num e-mail que a EASA (European Union Aviation Safety Agency) endereçou à administração da TACV, informando-a que o TCO da companhia tinha sido “invalidada”, na sequência da suspensão da AOC (Certificado de Operador Aéreo).
A imprensa nacional e internacional, assim como as redes sociais, também fizeram eco destes argumentos fazendo-se valer das mais diversas fontes com conhecimento do problema.
Américo Medina, especialista e conhecedor do sector, afirmou, numa publicação na rede social Facebook, que, desde 2021, a TACV vinha sendo alertada para a necessidade da mudança para a certificação TCO (Operador de Terceiro País, não europeu que realiza voos comerciais para a UE), exigida pela Agência Europeia para a Segurança da Aviação (EASA).
Esse antigo administrador da ASA afirma que a TACV não fez as démarches necessárias para obter esse certificado emitido pela EASA que é um pré-requisito obrigatório para a solicitação de direitos de tráfego comercial (autorizações de operação) junto a qualquer Estado-Membro da organização.
“Como a nossa amiga avestruz, enterrou a cabeça na areia, pois na equipa (Direção de Operações) dentro da companhia, não há viva alma que saiba montar/preparar um processo de Certificação TCO; por outro lado e, à boa maneira de uma subcultura emergente entre nós nos últimos anos, os gestores, em vez de agarrarem o boi pelos chifres, como já se fez no sector noutras ocasiões (Dossier CAT I) optaram por fazer fuga em frente e tentaram ludibriar as autoridades europeias. Pode até funcionar aqui, mas quem conhece esse ecossistema montado pelos europeus sabe que lá não funciona”, escreveu.
No entanto, a TACV e sectores próximos do Governo, nomeadamente o deputado Damião Medina, desmentiram essas informações, garantindo que os referidos voos foram cancelados “por motivos operacionais” sendo que, segundo a RCV, a presidente do CA da TACV, Sara Pires, escusou-se a comentar, alegando razões de saúde. E até a hora do fecho desta edição ninguém da administração da TACV tinha falado sobre o assunto, o que por si demonstra como a companhia é gerida, mesmo depois das diversas crises por que há muito vem passando.
TACV sem IOSA e fora da IATA
Na verdade, mesmo antes do episódio da semana passada, relacionado com o TCO, a TACV, administrada por Sara Pires, foi expulsa da IATA (International Air Transport Association), por ter perdido o certificado IOSA (Programa de Auditoria de Segurança), que é um dos certificados mais importantes da aviação civil.
A certificação IOSA (IATA Operational Safety Audit) comprova que as práticas operacionais e comercias são feitas de acordo com os padrões de qualidade estabelecidas por essa entidade. O programa tem no seu alicerce as normas da ICAO (Organização da Aviação Civil internacional) e as melhores práticas da indústria da aviação civil.
O seu objectivo principal é promover e melhorar a segurança operacional (safety) em todo o mundo, prevendo uma auditoria por companhia a cada dois anos, pós o qual se emite um relatório dos resultados e se renova ou não o certificado.
São auditados aspectos diversos da Organização e Gestão do Sistema de Segurança, Operações de Voo, Despacho de Voo, Operações da Cabine de voo, Ground Handling, Operações de carga e Segurança Operacional.
As auditorias são realizadas por empresas e/ou organizações creditadas pela IATA, decorrendo normalmente em sete dias, após o qual o operador auditado tem um prazo de um ano para corrigir as anomalias e insuficiências detectadas. Após a correcção de todas as anomalias a companhia aérea é incluída no registo IOSA.
Qualquer companhia aérea que queira fazer parte da IATA tem de cumprir, primeiro, com os requisitos e estar registada no IOSA. A TACV não consta neste momento no registo IOSA e, por isso, deixou de ser membro dessa organização.
A situação da TACV não lhe permite capacidade interna para organizar os processos de certificação, pelo que, seja para o TCO, seja para o IOSA, terá muito provavelmente que recorrer à contratação de empresas estrangeiras especializadas para a assessorar na organização e gestão desses dossiers técnicos. Com isso é bastante provável também que tão cedo a situação criada na semana passada não será resolvida, o que deve complicar ainda mais a recuperação da TACV. Como salta à vista, afinal não basta ter avião (no caso o boeing da TAAG) para se entrar na Europa.
Enfim, diante de tantos fogos por apagar, a que se juntam problemas salariais e outros, são sarilhos em demasia para a equipa convocada para gerir a TACV e que tem Sara Pires à cabeça...
O facto de ter desaparecido da cena, em plena crise da semana passada, levanta várias dúvidas quanto às reais capacidades de Sara Pires comandar a TACV no estado em que esta se encontra. Formada em Matemática, a sua única experiência como gestora foi presidir o Conselho da Administração da RTC, um órgão público financiado, quase na totalidade, com recursos do Estado.