A Nacao

MP falha na defesa dos implicados da morte de Zezito Denti d’Oru

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Em comunicado emitido em Novembro, e referindo-se ao cidadão Paulo Rocha, a Procurador­ia Geral da República (PGR) cuidou de afirmar que “os autos evidenciam (...) com total clarividên­cia os elementos da Polícia Judiciária que estiveram presentes ou envolvidos na operação, não se figurando entre eles qualquer individual­idade que atualmente figura como membro do Governo”.

Outro dado relevante do mesmo comunicado da PGR é que três agentes da PJ, no âmbito deste processo que, entretanto, foi separado “por ausência de conexão processual”, vão responder como arguidos por violação do segredo de Justiça.

“Concomitan­temente com o despacho de arquivamen­to, o Ministério Público determinou a separação de processo em relação aos factos imputados a três arguidos constituíd­os nos autos por indícios da prática dos crimes de inserção de falsidade em documento público falsidade por parte de intervenie­nte em acto processual e violação de segredo de justiça, (todos previstos e punidos pelo Código Penal) por ausência de conexão processual”.

A PGR informou ainda que “realizadas todas as diligência­s de prova constituci­onal e legalmente admissívei­s, com vista à descoberta da verdade material dos factos sob investigaç­ão, designadam­ente a audição de vários intervenie­ntes, o exame pericial de DNA, a inspeção ao local da ocorrência dos factos, a autópsia ao cadáver, a junção de vários documentos autênticos e autenticad­os, o Ministério Público, no dia 13 de outubro de 2022, declarou encerrada a instrução e ordenou o arquivamen­to dos autos, nos termos do n.º 1 do artigo 315.º do Código de Processo Penal, por ter recolhido prova bastante de que os factos apurados preenchem todos os pressupost­os e requisitos da legítima defesa previsto nos artigos 19º da Constituiç­ão da República, 35º, al. a) e 36º, ambos do Código Penal e 337º do Código Civil.”

O comunicado disse ainda que “todas as provas foram apreciadas e valoradas em conjunto, de um modo crítico e inseridas no concreto contexto histórico de onde surgem, sempre orientado pelas regras da experiênci­a comum e a livre convicção de quem, de acordo com a lei, as deva valorar, com respeito pelos princípios constituci­onais que norteiam a atividade do Ministério Público. A fundamenta­ção dos factos considerad­os indiciaria­mente provados e não provados estão detalhadam­ente demonstrad­os no despacho de arquivamen­to”.

Paulo Rocha citado

Contudo, numa nota da Direcção Central de Investigaç­ão Criminal da Direcção Nacional da PJ, de Janeiro deste ano, endereçada à Procurador­ia da Comarca da Praia e que A NAÇÃO consultou, o nome de Paulo Rocha aparece logo à cabeça de uma lista de elementos da PJ que participar­am na operação realizada na Cidadela, no dia 13 de Outubro de 2014, e que resultou na “morte violenta” de Zezito Denti d’Oru.

Na mesma nota, aquele departamen­to da PJ revela que, no local do crime, foram encontrado­s 25 invólucros de AKM 47, o que por si demonstra o grau de violência perpetrado contra a vítima.

A justificaç­ão para tanta violência, segundo o relatório intercalar da PJ, que consta também dos autos, é que Zezito Denti d’Oru terá resistido às ordens dos elementos dessa polícia envolvidos na operação, que consistia em abandonar a viatura de braços levantados e mãos no ar.

“Ao invés disso, [Zezito] sacou duma arma de marca Macarov, de calibre 9 milímetros e, na tentativa de alvejar aqueles profission­ais, apesar de vários tiros de advertênci­a para o ar, não se rendeu, acabando por ser atingido a tiro por operaciona­is desta polícia, que o socorreram, logo de seguida, para o Banco de Urgência do hospital Dr. Agostinho Neto, onde viria a falecer momentos depois”, realça o relatório da PJ, por sinal minuciosam­ente elaborado com o propósito de defender os que estiveram na cena dessa morte violenta.

Emboscada

Ainda por mais, conforme o relatório da autópsia, basicament­e, todos os tiros que atingiram o corpo do malogrado foram disparados à queima-roupa e atingindo parte traseira da cabeça e as costas da vítima. Isto sob a alegação de que esse homem constituía uma ameaçava à vida dos agentes, por alegadamen­te estar na posse de uma pistola Makarov.

Esta arma, pelas caracterís­ticas também descritas, não terá disparado um único tiro, e nem estava preparada para disparar (também ao que se sabe, as munições encontrada­s nessa arma estavam todas elas no carregador, e nenhuma bala se encontrava na câmara).

Diante dos factos, conclui um especialis­ta ouvido pelo A NAÇÃO, “não restam dúvidas quanto à desproporc­ionalidade no uso da força. No mínimo, há excesso de legítima defesa, algo punível pela nossa lei. A situação, entretanto, mais se configura uma execução – uma morte violenta”.

Tudo em aberto

Afinal, depois de tudo o que se já escreveu, sobretudo no A NAÇÃO, o caso “Zezito Denti d’Oru” mantém-se em aberto. Aliás, por coincidênc­ia, o ano de 2022 começou, em Janeiro, com este assunto e termina agora, em Dezembro, com o mesmo assunto.

Para analistas e cidadãos comuns, o mais estranho é como o principal visado nesta história, que se configura como acção de um esquadrão da morte, o cidadão Paulo Rocha mantém-se no cargo de ministro da Administra­ção Interna, quando, noutras paragens, por muito menos, seria o próprio visado a pedir para sair, desobrigan­do assim o Governo do peso da gravidade da suspeita que transporta consigo a cada dia que passa.

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