Abraão Vicente chama para o MCIC poderes do Parlamento
Lançada a controvérsia, se a língua portuguesa é ou não um património imaterial de Cabo Verde, o ministro Abraão Vicente alertou, na semana passada, que uma eventual classificação desse idioma a esse estatuto é da competência do Ministério da Cultura e Indústrias Criativas (MCIC), através do Instituto do Património Cultural (IPC).
E, sendo assim, “nem os deputados nacionais, nem uma outra instituição pode entrar na linha de acção do Ministério da Cultura e do IPC”.
Vicente precisou, depois, que se o Parlamento quiser agir em sentido contrário, “terá que mudar a Lei e avocar o poder que está, neste momento, no IPC de classificar, de inventariar e de criar todo um processo necessário para ter uma língua como património imaterial”.
O que diz a Constituição
À luz da Constituição da República, o Parlamento pode fazer leis sobre todas as matérias, excepto as da “competência exclusiva” do Governo, o que no caso da língua não se aplica.
Com efeito, os poderes do Parlamento decorrem ao abrigo do artigo 175º, al. b), da CR, através da chamada “competência legislativa genérica”: “Fazer leis sobre todas as matérias, excepto as da competência exclusiva do Governo”.
Ora, de acordo com um jurista consultado pelo A NAÇÃO, “declarar uma língua, como património nacional, não integra, nem de perto nem de longe, matéria reservada, pela Constituição, ao Governo”.
Na mesma linha, em resposta ao ministro da Cultura, a deputada Mircéa Delgado lembra também que a Assembleia Nacional não está impedida de legislar sobre a matéria da língua, porquanto a Constituição, no seu artigo 204, cuja a epigrafe é “competência legislativa”, “não há nada que diga que no exercício de funções legislativas o Governo tenha, no que diz respeito à Cultura, competência legislativa exclusiva” (ver texto xxxx).
Deputados ignoram poderes do Parlamento
Estranhamente, os próprios membros da Comissão Especializada de Educação, Cultura, Saúde, Juventude, Desporto e Questões Sociais, que apreciaram o projecto de lei de Mircéa Delgado, parecem ter ignorado os seus próprios poderes enquanto legisladores e representantes do povo.
É que, diante do parecer negativo do IPC à referida iniciativa legislativa de Mircéa Delgado, os deputados da 5ª Comissão se limitaram a absorver, na íntegra, as objecções desse instituto, como também fizeram depender a sua decisão ao parecer solicitado ao Instituto Camões, que nunca lhes chegou às mãos.
Lendo o “relatório/parecer” da 5ª Comissão, integrada por seis deputados, e presidida por José Eduardo Moreno (MpD), o seu único pensamento foi sugerir/recomendar àquela deputada – “caso queira e entenda pertinente” – , que reformule o seu projecto de lei no sentido de se instituir em Cabo Verde “o Dia Nacional da Língua portuguesa, como acontece noutros países lusófonos”.