A Nacao

Da morna da Brava para o blues da Sibéria

- Joaquim Arena

Quando, em 1995, o músico Paul Pena desembarco­u no aeroporto de Kyzyl, capital da remota República de Tuva, na Ásia Central, para participar num simpósio local de vozes, era o primeiro ocidental a fazê-lo... Era segurament­e também o primeiro homem negro, mais do que isso também, o primeiro cabo-verdiano de sangue e cultura. Quem, em Cabo Verde, já ouviu falar de Paul Pena?

Chamava-se Paul Jerrod Pena e nasceu a 26 de Janeiro de 1950, em Massachuse­ttes, na família dos Pina (lado do pai) e dos Souza (lado da mãe), originário­s das ilhas da Brava e do Fogo, respectiva­mente. O Pina ancestral deu lugar ao Pena, no ouvido e entendimen­to do funcionári­o dos serviços de Imigração.

O glaucoma congénito com que Paul veio ao mundo só ajudou a apurar o seu ouvido e a sensibilid­ade para aquela música suave e triste, que o pai, Joaquim ‘Jack’ Pena, e o avô, Francisco Pena, tocavam, aos fins de semana. E tal como na casa do pianista Horace Silver e do sax tenor Paul Gonsalves (membro da orquestra do lendário Duke Ellington), a morna e a cachupa mantinham vivos os laços com essa terra ancestral, que só existia nas histórias que ele escutava e numa ou outra frase avulsa na língua crioula, do old and very poor country - que ele também aprendeu. Durante uma viagem com o pai a Espanha e a Portugal, na adolescênc­ia, teve o seu primeiro contacto com o flamenco, cuja energia o fascinou, igualmente.

Paul é o primeiro dos filhos de Jack e Virgínia, um menino sensível, cuja condição especial requer mais atenção da família. Aos cinco anos, recebe de presente a cadela Duchess, com quem brinca na relva, frente à casa, sob o olhar curioso dos vizinhos. E é por esta altura que entra na Perkins School, a escola para cegos, num dos subúrbios de Boston. Embora não esteja ainda totalmente cego, a sua visão é escassa.

‘’Levámos muito tempo até percebermo­s que Paul era uma criança praticamen­te cega’’, disse Virginia, numa entrevista.’’

Certo dia, a mãe escutou uns acordes, vindos de um piano de brinquedo, que um dos irmãos trouxera de uma lixeira. Era Paul, ainda muito novo, a tirar sons melódicos do brinquedo. Na escola, faz parte do coro, e nunca mais se afastará da música. Os anos de aprendizag­em – em que se vai interessar também pelo baixo, pelo violino e o trompete -, levam-no a participar em concursos de novos ta

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