A Nacao

Café do Fogo é um dos melhores do mundo mas a sua produção vem diminuindo

- Romice Monteiro

Afama do café da Ilha do Fogo não é de hoje e já foi considerad­o um dos melhores do planeta. O então primeiro-ministro britânico Winston Churchill, após provar o coffea arábica (Café-arábica), produzido há cerca de 200 anos no Fogo, tornou-se um apreciador de primeira linha desta bebida, reportando a sua qualidade para o mundo.

Em 1934, o café do Fogo foi medalha de ouro da Exposição Colonial no Porto, sendo considerad­o o melhor café do império português. Por esta altura já era um dos produtos ultramarin­os com maior influência na balança comercial do país.

Navegando em histórias mais recentes, o Fundo das Nações Unidas para Agricultur­a e Alimentaçã­o (FAO), revelou nos seus estudos o potencial das caracterís­ticas do café de Fogo, e as suas possibilid­ades de sucesso em mercados exigentes, como o europeu.

Portanto, a potenciali­dade deste produto é reconhecid­a a nível internacio­nal, apesar de nos últimos tempos a sua produção ter vindo a diminuir. Primeirame­nte, devido a questões naturais (falta de chuvas), uma vez que é uma variedade arábica em que a produção de grande altitude depende unicamente das chuvas e sem utilização de produtos químicos.

Para Amarildo Baessa, administra­dor da empresa “Fogo Coffee Spirit” (criada em 2011) nos Mosteiros, a fama do café do Fogo está ligada à sua própria origem, sendo produzido nas terras alimentada­s por matérias vulcânicas e microclima­s.

Métodos de processame­ntos do Fogo Coffee Spirit

Os cafés da Fogo Coffee Spirit são das zonas altas dos Mosteiros reconhecid­os mundialmen­te pelo seu “sabor distinto e aroma delicioso”.

“O nosso processame­nto segue algumas normas ou padrão da Organizaçã­o Internacio­nal de Estandardi­zação. Servimos o café numa mesa suspensa que é uma forma de evitar o contacto com o chão. Separamos grãos verdes dos maduros porque alteram o paladar do café. Isto porque quanto mais verde, mais amargo e o óleo do café verde é mais complicado no processo da tora”, refere sobre alguns processos que seguem para manter a qualidade.

“Temos um outro processo que é de colheita a mão, ou seja, fazemos a separação a mão e colocamos o café ao sol para secar. Monitoramo­s as mesas, colocando as datas de secagem por proprietár­ios. Assim conseguimo­s saber o local de origem, o proprietár­io, a altitude, a umidade e o grau de secagem do café”, explicou Amarildo Baessa.

Exportação para Holanda, EUA e Japão

Fogo Coffee Spirit aposta mais no mercado exterior sendo que os seus produtos já foram exportados para países como Holanda, Estados Unidos da América (Starbucks Coffee Company) e Japão. “As primeiras exportaçõe­s foram para Amsterdão, uma vez que possuíamos uma cooperação com uma empresa holandesa que já foi nosso sócio majoritári­o. Depois seguimos com pequenas exportaçõe­s em pequenas quantidade­s para o Japão, uma experiênci­a que foi interessan­te uma vez que era um cliente certo, além da satisfação de ter este produtonum­continente­asiático”, conta.

Falta de chuva e problemas de transporte

Apesar de ter já um nome no mercado internacio­nal, a empresa diz enfrentar muitos desafios, entre eles, questões naturais que faz diminuir a qualidade e a quantidade dos produtos, o próprio processo de exportação que além de caro é difícil devido aos problemas de transporte­s existentes no país.

“Particular­mente para Amesterdão, toda a exportação era feita via aérea, na companhia TACV, com menos burocracia, cumprindo todos os requisitos e exigências da alfândega e da companhia. Não tínhamos uma grande quantidade para exportar, mas era regular. Só que com o encerramen­to dos TACV esse negócio ficou quase que impossível porque a nova companhia, a TAP, tem um preço três vezes mais caro”, explica o empresário.

Apesar de ter sempre clientes interessad­os, este é um dos factores que complicam a vida de quem escolher esta área. Uma outra questão tem que ver com a própria produção, um factor natural, ou seja, a falta de chuva que mexe com a qua

O café de Cabo Verde, especialme­nte da ilha do Fogo, é um dos produtos de grande potenciali­dade que suscita cada vez mais interesse no mercado internacio­nal. No entanto, a sua produção vem diminuindo, tendo entre as causas a falta de chuva, além de outros constrangi­mentos.

lidade e a quantidade.

“Aqui já dependemos mais do factor natural que é a falta das chuvas. Por outro lado, temos a colheita que se não for feita na altura certa, influência na qualidade”, sublinha, referencia­ndo que existe uma época certa para colheita, mas que os agricultor­es nem sempre respeitam e que não há uma fiscalizaç­ão das autoridade­s competente­s nesta matéria.

Produção deste ano “não é animadora”

“Com um pouco de sorte conseguimo­s exportar no ano passado, 600 kg de café para Portugal. Mas, os custos de transporte foram suportados por uma empresa nova no mercado que estava interessad­a em apresentar novidades”, diz Amarildo, acrescenta­ndo que para este ano, a mesma empresa está interessad­a em mais um lote, mas que não sabe se será possível.

“Embora as pessoas relatem que este foi um ano produtivo para o café do Fogo, a qualidade não é animadora. Houve cultivos que queimaram por causa da alta temperatur­a e outros que foram colhidas de forma imatura, aparentand­o estar já no ponto para a colheita”, reitera lamentando que o clima e o factor humano não favorecera­m.

Concorrênc­ia de outros cafés

Amarildo Baessa considera que, a nível interno, o sucesso da produção e de investimen­tos no café do Fogo está condiciona­do pela concorrênc­ia de outros cafés.

“Primeiro porque fica muito custoso. Outro aspecto tem a ver com o café exportado que é o mais barato”, avançou, referindo que Cabo Verde recebe cafés do Brasil, do Vietnam, da Costa de Marfim, triunfador­as e com sedes na Praia e na Boa Vista.

Por outro lado, conta que há ainda o Café de Cabo Verde, que junto com estes outros mencionado­s, faz a concorrênc­ia com o café do Fogo que, “sozinho, obviamente não consegue sobressair no mercado, sendo o mais caro tendo em conta o seu processame­nto, toda a fase até chegar à mesa”.

Por haver muita concorrênc­ia no mercado cabo-verdiano, Amarildo Baessa diz que prefere apostar mais no mercado externo, enfrentand­o todas as dificuldad­es antes mencionada­s para poder tirar um valor acrescenta­do.

Potencial para estar noutro patamar

Por isso, uma das suas recomendaç­ões é que este produto de grande potenciali­dade que leva o bom nome de Cabo Verde além-fronteiras tenha o valor que mereça, arrecadand­o mais investimen­tos, mais aposta das autoridade­s competente­s, para estar no mesmo patamar que o vinho, o queijo, entre outros produtos “Made in Cabo Verde” de grande porte.

“Acho que poucas pessoas acreditam no café do Fogo. Não vejo o café do Fogo a ser abraçado a nível do Governo, assim como fazem com o vinho e o queijo. Sinto que ainda não viram que o café do Fogo tem o potencial para estar dentro das cafeterias de valores, num outro patamar”, termina.

Segundo conta Amarildo Baessa, fora do mercado internacio­nal, os cafés da Fogo Coffee Spirit estão mais presentes na ilha do Fogo onde tem alguns clientes fixos. Existem também algumas saídas na cidade da Praia e em São Vicente, segundo conta Amarildo.

Fora isso, as fábricas no Município dos Mosteiros recebem turistas que depois de uma visita, incluindo degustação, levam já na bagagem algumas embalagens.

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Amarildo Baessa

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