Quanto custa fazer um filme?
O dinheiro é o grande ‘papão’ do cinema. O factor que afasta muita gente e leva a considerar o cinema como um luxo. Sobretudo num país pobre, como é Cabo Verde. Se estivermos a falar de ficção, com o recurso a actores, o orçamento pode disparar, somando todos os elementos de uma equipa envolvidos. É preciso pagar a muita gente: actores, técnicos, maquilhagem, transportes, catering, seguros, contabilista, advogados para a assinatura de contratos, para não falar nos custos da pós-produção, que se iniciam logo após o fim das filmagens.
Sumara Maré, a mais recente curta-metragem de Samira Vera-Cruz, teve um fundo de 5 mil dólares, contou com o apoio da ONU, com fundos próprios da produtora de Samira, Parallax. Com a duração de apenas oito minutos, o custo total ficou nos 15 mil euros. «Mas sou eu a filmar e a editar tudo, faço tudo. Uma longa-metragem, sem grandes produções ou deslocações, pode ficar entre os 140 e os 180 mil euros. Mas também pode ir até aos 300 mil.»
Por uma economia de custos e a dificuldade de acesso aos fundos, a maioria dos filmes produzidos por cineastas cabo-verdianos, tem sido no género documentário. Não havendo actores, poupa-se muito dinheiro e restringe-se ao mínimo necessário. No entanto, grande parte dos realizadores opta por um género híbrido, entre o documentário e a ficção, com resultados muito interessantes. Mas todos concordam que Cabo Verde tem um potencial inesgotável, inclusive para a ficção científica.
Quem também corre atrás do dinheiro para pôr de pé um festival, sabe como o dinheiro nunca chega. «Em 16 anos de actividades só em 2022 o Festival Oiá teve o ministério da Cultura como parceiro», afirma Tambla Almeida. Com um orçamento que ronda os 20 mil contos, a organização não tem conseguido reunir nem um quarto dessa verba, como explica. «Fazemos o que podemos com aquilo que tempos, com os poucos recursos que conseguimos, e apostamos na nossa própria criatividade.»
Audiovisual, sector em crescimento
A produção de imagem, seja ela ao serviço de instituições públicas ou privadas, de câmaras municipais, organismos do Estado, transmissão de conferências e espectáculos, ou de vídeoclips musicais, publicidade, conheceu um crescimento exponencial, nos últimos anos.
Fazer cinema coloca sérios obstáculos financeiros. Por isso, a maioria dos técnicos ganha a vida naquilo que se chama de audiovisual, ou seja, tratamento de som e imagem. E aqui a história muda de figura. Produtoras como a Kriolscope, a de Saulo Montrond, a ACI, a Praia TV, entre outras de menor dimensão e mesmo individuais, dividem um bolo que não pára de crescer. Estamos a falar de uma verdadeira indústria, envolvendo técnicos de som, produtores, realizadores, prestando serviços de divulgação de produtos das empresas, sobretudo nas plataformas sociais e na televisão.
No entanto, como em qualquer sector de rápido crescimento, levantam-se algumas questões. Como explica Fernando Tavares, «o audiovisual abrange tudo o que mexe e faça barulho. Estamos a falar de conteúdos pensados para a televisão e a internet, feitos por profissionais e amadores. E a diferença está na qualidade.»
Aqui a oferta é variada e para todos os preços, desde a cobertura de conferências e congressos, aos videoclips musicais, onde, explica, na maior parte das vezes, a qualidade não é o critério mais importante. «Há um abismo entre o que é bom e bem feito e o que é mal feito.» Residente na Praia há 17 anos, Fernando Tavares é o responsável pelo primeiro live streaming no país, em 2010, com a transmissão do congresso do PAICV, desse ano.
Embora haja excelentes profissionais no país, o grau de exigência, diz, continua sendo muito baixo, sobretudo por parte dos compradores desse serviço, para quem, «basta que esteja lá o ‘boneco’ ou se veja a imagem do senhor director ou da pessoa que o encomenda, para se estar satisfeito.» A concorrência, essa, não para de crescer e de desvirtuar o mercado, na sua opinião.
«Há coisas muito bem feitas, mas a maior parte é ineficaz. Muitas vezes são feitas por algum curioso, que mora em casa dos pais, o tio mandou um computador ou câmara de filmar, software pirata, e faz o serviço por 30 mil escudos. Para quem, como nós, paga renda, luz, água, usa 3 câmaras, microfones, faz pós-produção, passa o dia todo a montar, e cobra 100, o cliente não quer saber e vai fazer por 30. Mesmo se a qualidade é baixíssima.»
A publicidade e o vídeo institucional são a fonte de rendimento mais importante para a maior parte destes profissionais. O sector emprega cada vez mais gente, há uma indústria, de facto, nas palavras de Pedro Soulé, cuja produtora emprega 12 pessoas a tempo inteiro. «Avançámos muito em termos de qualidade, mas precisamos de maior regulamentação, para garantir certos requisitos; o Estado deve criar um quadro mais justo para quem está no terreno há mais tempo, mas também para atrair novas empresas e profissionais. Até agora, cada um faz o que faz, e como quer. Há formas de regular o sector como se faz lá fora.»
Maurício Carvalho, da ACI (Agência Cabo-verdiana de Imagens), vai mais longe e diz que a grande lacuna do mercado audiovisual cabo-verdiano está na inexistência do broadcast. «Ou por falta de dinheiro, como a TVA, ou de vontade política e de estratégia política, no caso da TCV, estas não encomendam nada aos privados e com isso matam o mercado de broadcast no país. E esta última, a TCV, também não cumpriu a função que é formar quadros especializados. Tudo por razões estranhas, que escapam à minha compreensão.»
A ACI é responsável por programas como Nha Terra Nha Cretcheu, no ar há 17 anos, e por vários outros, incluindo transmissões de jogos de futebol e dos CVMA, e trabalha exclusivamente para a RTP. «Noutros países, são as produtoras independentes que fornecem as televisões e permitem maior diversidade de produção», afirma.