Petição Pública pede sessão extraordinária da Assembleia Nacional
Um grupo de cidadãos quer ver discutida, na Assembleia Nacional, a legitimidade do Tribunal Constitucional em fazer sobrepor um costume à própria Constituição da República. Rescaldo ainda da Acórdão nº 17/23, do Tribunal Constitucional, que valida a detenção de Amadeu Oliveira.
Oabaixo-assinado, que tem como signatários Germano Almeida, Filomena Martins, José António dos Reis, Helena Leite e Daniel Ferrer Lopes, é dirigido ao Presidente da República e solicita a sua intervenção junto ao Presidente da Assembleia Nacional.
Isto para se discutir, em Sessão Extraordinária, se os membros do Tribunal Constitucional têm poderes para decretar que um costume se sobreponha à Constituição da República.
A petição, que conta com o apoio e reforço do jurista Wladimir Brito, diz respeito ao Acórdão nº 17/23, do Tribunal Constitucional, que dá resposta ao requerimento dos deputados (Acórdão N.º 17/2023), sobre a legalidade do levantamento de imunidade parlamentar e detenção do deputado Amadeu Oliveira, após resolução da Comissão Permanente da Assembleia Nacional.
“Entendendo que a recente decisão do Tribunal Constitucional, proferido no acórdão nº 17/2023, que introduziu costumes constitucionais
Natalina Andrade
contra a constituição, alterou o consenso político-social de décadas (...) e face às dúvidas e inquietações suscitadas por essa decisão do Tribunal Constitucional (...)”, os subscritores pedem a intervenção de José Maria Neves.
“Sérias dúvidas”
O posicionamento do TC, segundo defendem, suscita “sérias dúvidas” uma vez que até agora existia a convicção generalizada de que a Constituição da República se encontrava no topo da hierarquia do ordenamento jurídico cabo-verdiano.
“A incredulidade dos subscritores aumenta quando a norma costumeira, que viabiliza a aprovação da citada resolução, atinge matérias do âmbito dos direitos, liberdades e garantias, contrariando o próprio entendimento do Tribunal Constitucional, segundo a qual, esta entidade jurisdicional, num acórdão anterior, teria explicitado que procurou “afirmar uma dogmática quanto aos limites da aceitação de costumes contra a Constituição a partir da interpretação valorativa da cláusula consagradora de limites materiais de revisão da Constituição”, sublinham, conforme se pode ler na fundamentação da iniciativa.
As dúvidas, acrescenta a mesma fonte, adensam-se ainda mais quando o TC admite a existência de normas costumeiras supra-constitucionais, com poder derrogatório das normas constitucionais escritas.
“Todos nós estávamos convencidos que Cabo Verde, sendo um Estado Constitucional e regido pelo princípio da constitucionalidade, tal como definido nos nºs 2 e 3 do artigo 3º da Constituição da República, tal decisão não teria amparo no nosso ordenamento jurídico”, defendem.
No entendimento dos subscritores, a aceitação de normas costumeiras com efeito derrogatório, não só atinge a norma constitucional expressamente visada, como ainda atinge ou limita os efeitos de vários comandos constitucionais.
A petição, dizem ainda, foi inspirada nas próprias palavras do PR que, ao comentar o acórdão, afirmou que pelo “seu caráter inovador e polémico” e pelos seus efeitos, espera que “a sociedade civil - comunicação social, universidades, comunidade jurídica, investigadores … e cidadãos discutam as posições do TC no já referido Acórdão e contribuam para um debate fundamentado e enriquecedor das mesmas, aprofundando, desse modo, a cultura da Constituição e da legalidade democrática”.
Mais de mil assinaturas
Para a sua validação são necessárias mais de mil assinaturas, de cidadãos nacionais. O grupo está, entretanto, convencido de que não será difícil chegar ao número de subscrições exigidas.
Até o fecho desta edição, o documento, alojado na plataforma petiçãopública.com, contava com pouco mais de 140 subscrições. Ainda sobre este assunto ver o artigo de Germano Almeida na página xxx.