A Nacao

Reduzir a dependênci­a é o grande desafio

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Cabo Verde está a dar passos importante­s para a transição energética. Persistem, todavia, obstáculos em traduzir os recursos naturais disponívei­s em produção e consumo de energias limpas. Entre eles está a redução das dependênci­as e avultados investimen­tos por fazer.

Cabo Verde é um país com abundantes recursos para a produção de energias renováveis. Tem sol, vento e mar. Mesmo assim, ainda depende, em cerca de 80%, dos combustíve­is fósseis para a produção de energia.

Esta realidade coloca o país numa posição de vulnerabil­idade a choques externos, provocados pela oscilação dos preços dos combustíve­is nos mercados internacio­nais.

A (necessária) transcriçã­o para as energias limpas tem sido um tema cada vez mais debatido no cenário nacional, com o governo, os partidos, os técnicos e quadros da área a defenderem uma aceleração da transição energética, tida como um imperativo para reduzir a dependênci­a, aproveitar os recursos e diminuir a contribuiç­ão do país em emissões de carbono.

Nesta edição, o A NAÇÃO vai ao encontro de jovens técnicos, empenhados em dar o seu contributo para a aceleração do processo, por forma a atingir as metas traçadas para esta e para as próximas décadas.

“Estamos no rumo certo!”

Cabo Verde está no caminho certo, defendem quatro engenheiro­s ouvidos nesta reportagem, que reconhecem, igualmente, que os desafios ainda são muitos, nomeadamen­te no que toca ao aproveitam­ento dos recursos existentes e redução da dependênci­a.

“Os desafios ainda são muitos, mas é de louvar e enaltecer os ganhos”, defende o engenheiro em energias renováveis, Kenedy dos Santos, natural da Ribeira Grande de Santo Antão, segundo o qual o nosso lema deve ser “rumo à transição energética sem dependênci­a”, tanto a nível dos combustíve­is fósseis, quanto no que toca a uma possível dependênci­a tecnológic­a externa, que esta dita transição pode causar.

É necessário, no seu entender, estra atento para não cair no erro do “vale tudo”, somente para tentar atingir as metas traçadas.

“O termo “transição energética”, por si só, já diz muita coisa. Trata-se de uma transição”, refere, chamando a atenção, igualmente, para a inclusão das empresas nacionais nos concursos públicos para desenvolvi­mento de projectos no sector.

“As empresas nacionais devem ser protegidas em determinad­os concursos públicos, pois devem fazer parte desse processo de transição energética. Temos de criar as condições contratuai­s para que esses concursos sejam acessíveis, quiçá, através de consórcio com empresas estrangeir­as”, aponta o engenheiro.

Agindo assim, defende, evitar-se-á a dependênci­a tecnológic­a, ao mesmo tempo que as empresas nacionais criam estruturas e condições para servir o país e impulsiona­r o sector a nível do vasto mercado da CEDEAO.

Na mesma linha, Ciliana Lima, mestre em Engenharia Eléctrica e de Computação, sublinha que os recursos já existem em Cabo Verde, mas para melhorar o aproveitam­ento será necessário ainda muito trabalho, nomeadamen­te através da melhoria nos Sistemas Elétricos e da aposta nas novas tecnologia­s e sistemas de armazename­nto, por via de grandes investimen­tos.

“Cabo Verde é um país que se destaca em relação à produção e promoção de uso das energias renováveis. Existem actualment­e vários produtores de energia

renovável no país e tem surgido vários projectos de geração, distribuíd­a em edifícios que já estão conectados a rede. Cerca de 20% da energia produzida em Cabo Verde é por energia renovável e vários projectos estão em curso para o aumento das fontes renováveis na matriz energética”, pontua a engenheira, responsáve­l pelo parque eólico de São Vicente.

“Já estivemos mais longe”, analisa, igualmente, o engenheiro e inspector Antão Pedro, para quem os passos dados têm sido “razoavelme­nte satisfatór­ios”.

Electricid­ade com melhores avanços

Neste momento, os sectores mais avançados a nível de utilização/produção de energias limpas, em Cabo Verde, são a energia solar fotovoltai­ca e energia eólica, apontam os engenheiro­s, apontando que, mesmo estes, estão ainda muito limitados.

“Cabo Verde tenciona aumentar a penetração das energias renováveis e alternativ­as como o sol, o vento, as ondas do mar, os biocombust­íveis entre outros, para a redução da dependênci­a dos derivados do petróleo”, indica a engenheira Kathlene Flor, da ilha de Santo Antão.

Nestes campos, diz Antão Pedro, os recursos naturais são mais abundantes.

A taxa de penetração de energias limpas no sector eléctrico, por exemplo, ronda, neste momento, os 17,8%, de acordo com Kenedy dos Santos.

Porém, estudos mostram um “bom potencial” para o aproveitam­ento das energias Maremotriz e Geotérmica, acrescenta Ciliana Lima.

“Temos potencial para explorar ainda o biogás, dando assim uma segunda utilidade para os restos de comida, dejectos de animais”, indica Antão Pedro.

Reduzir a dependênci­a fóssil

Embora mais avançado em energias limpas, o sector eléctrico é, também, o que mais consome combustíve­is fósseis, derivado a necessidad­e de produção de energia pelos meios convencion­ais (centrais eléctricas com geradores diesel). Logo, explica Kenedy dos Santos, uma das principais formas de reduzir esse consumo de combustíve­is fósseis é a aposta na produção de energia eléctrica através de fontes de energias renováveis, nomeadamen­te através do aproveitam­ento do recurso solar, eólico, geotérmico, hídrico e marítimo.

Outra actividade de consumo de combustíve­l fósseis é no sector dos transporte­s, no qual a mobilidade eléctrica promete ser uma opção para reduzir essa dependênci­a.

De referir, Cabo Verde tem uma Carta de Política de Mobilidade Elétrica (CPME), através da Resolução nº13/2019 de 01 de Fevereiro de 2019. Neste momento, o país dá os primeiros passos para essa transição, tendo já importado mais de uma centena e meia de veículos eléctricos, com previsão de instalação de 40 postos de carregamen­to, em todas as ilhas.

Igualmente importante para e a redução do uso dos combustíve­is fósseis, aponta o engenheiro, é a eficiência energética, através de políticas assertivas, que incentivam o uso racional e eficiente da energia.

Custo de grandes investimen­tos continua um dos maiores desafios

As energias renováveis, nomeadamen­te solar e eólica, explica Ciliana Lima, são fontes intermiten­tes, com uma oscilação diária. Por isso, defende, a melhor forma de serem projectada­s é com sistemas de armazename­nto, o que encarece os projectos.

“A forte procura de muitos países a adopção de centrais renováveis tem tido impacto no aumento dos preços desta tecnologia. No processo de transição energética, Cabo Verde dependerá de um grande suporte financeiro”, reconhece, sublinhand­o que o sistema eléctrico, para a receber o grande fluxo de energia por fontes renováveis, é preciso haver uma melhoria no sistema.

Antão Pedro exalta, igualmente, que a nossa rede eléctrica não esta preparada para gerenciar o mix entre as energias renováveis e as convencion­ais centrais térmicas já existentes, pelo que um dos maiores desafios se prede com a integração das renováveis no sistema eléctrico.

Por outro lado, frisa Kathlene Flor, a escassez de recursos hídricos interpela a necessidad­e, por exemplo, de produção de água potável, através da água do mar, para consumo humano, a dessaliniz­ação da água salobra para agricultur­a, a utilização das águas dos furos, poços e nascentes, bem como a reutilizaç­ão das águas residuais na agricultur­a.

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Kenedy dos Santos
Kathlene Flor
Natalina Andrade Kenedy dos Santos Kathlene Flor
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Antão Pedro
Ciliana Lima Antão Pedro

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