Jovens que fazem parte da mudança
Kenedy, Ciliana, Antão e Kathlene não entraram na área de energias renováveis pelos mesmos motivos. Mas hoje, todos actuam com um mesmo gosto e propósito: ser parte da transição energética e ajudar o seu país e o Mundo no caminho para uma vida mais sustentável.
Kenedy Olavo dos Santos, natural do Figueiral da Ribeira Grande de Santo Antão, licenciou-se em Engenharia em Energias Renováveis pela Universidade do Mindelo, em 2018.
O curso não foi, entretanto, sua primeira escolha. O jovem enveredou-se pela área após ver cair por terra o sonho de estudar fora. Por isso, diz que não escolheu o curso. Foi, ao contrário, escolhido.
“Quando digo que sou um privilegiado escolhido por essa área tem muito a ver com o meu trajecto académico e profissional. Em Janeiro de 2017, no meu último semestre de licenciatura, durante a procura de um estágio curricular, apareceu-me uma “oportunidade estranha”, que consistia em abandonar as aulas e deslocar a uma das zonas mais isoladas de Cabo Verde para realizar um estágio curricular durante aproximadamente um mês”, recorda.
Tratava-se, pois, da localidade de Ribeira Alta, interior do concelho da Ribeira Grande, numa zona de difícil acesso, na altura sem rede móvel ou internet e com energia eléctrica condicionada.
“Estranha”, mas instigante para um jovem ávido de colocar em prática o que estava aprendendo na licenciatura, Kenedy embarcou na aventura que lhe permitiu fazer parte da equipa que mudaria a realidade daquela localidade, passando a ter acesso a energia eléctrica autónoma 24h/dia, contra as cinco horas anteriores.
“Na verdade, não foi somente a vida da comunidade que mudou. A minha também. No seguimento do projecto foi convidado pelo Consórcio das Empresas Instaladoras para ingressar a equipa técnica responsável para Parametrização e Instalação do Sistema de Gestão Comercial de Venda de Energia Pré-pago para as Mini-redes de Figueiras e Ribeira Alta”, relembra.
Ainda sem concluir o curso, Kenedy ingressava-se assim no mercado de trabalho, numa área pela qual estava rendido, rumo a uma trajectória profissional que hoje, segundo diz, é motivo de orgulho.
O jovem hoje é Técnico Inspector de Sistema de Microprodução com base em Energias Renováveis e engenheiro da Genius Água e Energia Cabo Verde, com foco na dessalinização de água e produção de energia eléctrica através do uso de fontes renováveis.
Adepta ao uso consciente da natureza
Ao contrário do colega, Ciliana Lima sempre se mostrou interessada pela área, enquanto adepta ao uso consciente dos recursos naturais.
Licenciada em Engenharia Eletrotécnica - Ramo de Energia, pela Universidade de Cabo Verde e mestre em Engenharia Electrotécnica e de Computação, pela Universidade Federal de Goiás, Ciliana conseguiu o primeiro emprego em 2015, após um ano de estágios, no seguimento da licenciatura.
“Na altura em que terminei a Licenciatura entrei no mercado de trabalho e da experiência senti que precisava de aprimorar os conhecimentos específicos na área de energias renováveis. Por isso tomei a decisão de fazer o Mestrado, numa altura em que não havia ofertas formativas para especialização em energias renováveis em Cabo Verde, por isso tive de me mudar para o Brasil”, recorda a hoje, que vê com bons olhos o fato de hoje já haver essas ofertas em Cabo Verde.
De regresso a Cabo Verde, Lima trabalhou com sistemas de gestão de energia renovável no Centro Nacional de Despacho de Cabo Verde e participou nos trabalhos de integração do Sistema SCADA dos parques eólicos da Cabeólica.
Também leccionou disciplinas da área das energias renováveis no Centro de Energias Renováveis e Manutenção Industrial-CERMI e actualmente é responsável pelo Parque Eólico da sua ilha natal, São Vicente.
Paixão por engenharia
Já Antão Pedro, também engenheiro de Energias Renováveis pela Universidade do Mindelo, escolheu a área pela paixão por exactas e por engenharia.
“Tenho uma paixão por descobrir como as coisas funcionam. Energias Renováveis porque sinto-me no dever de fazer a minha parte enquanto defensor do ambiente e da biodiversidade”, releva.
O jovem, natural da ilha de Santo Antão, entrou no mercado em 2019, actuando paralelamente enquanto professor e engenheiro/ inspector na sua área de formação.
No final de 2022 decidiu criar a própria empresa, a Ecovoltaic, através da qual presta serviços de elaboração e execução de projectos de energias renováveis.
O mercado, segundo diz, ainda não é fácil para se integrar, devido à novidade que ainda é o ramo de renováveis no país, com oportunidades de emprego ainda escassas.
Mesmo assim, acredita que as perspectivas são boas para os jovens que estão se formando na área, com previsão de crescimento do mercado a curto e médio prazos, para acompanhar as metas no que toca à transição energética.
Oportunidade de mercado
Kathlene Flor, engenheira em Energias Renováveis, também pela Universidade do Mindelo, deu seus primeiros passos profissionais em 2022, dois anos após conclusão da licenciatura.
Natural do concelho do Porto Novo, Santo Antão, Kathlene não depositava nas energias limpas o seu sonho de profissão. Queria ser arquiteta.
Entretanto, assim como tantos outros jovens, Kathlene colocou na balança as oportunidades de trabalho no país e decidiu pelas energias renováveis, ciente que estava perante um ramo pouco explorado, com oportunidades em crescimento.
“Quando decidi fazer o curso havia poucas pessoas formadas na área, e tratava-se de um sector com muita procura, visto que as oportunidades de emprego eram maiores. Escolhi investir em Energias Renováveis, como oportunidade de negócio e de investimento em inovação no domínio de eficiência energética para o futuro”, revela.
Um estagiário profissional foi a porta de entrada para o mercado de trabalho, estando até hoje a trabalhar na mesma empresa.
Cabo Verde, para Kathlene e seus colegas de profissão, é um país com elevado potencial em geração de energias limpas.
Entretanto, há passos importantes que ainda precisam ser dados, nomeadamente na diversificação da exploração dos recursos e fontes de energia, a criação de uma Academia Literária de Energias Renováveis com foco na investigação científica e a remodelação do modelo de formação profissional, conforme defende Kenedy dos Santos.
“Acho que já é hora de se criar uma Associação Energias Renováveis de Cabo Verde. A tutela do sector deve se responsabilizar e coordenar as empresas instaladoras, produtoras independentes e outras no âmbito das suas políticas de responsabilidade social, a organizar para a criação dessa associação”, instiga.