A Nacao

A guerra de que ninguém fala

- Joaquim Arena

Há uma guerra na sombra da comunidade internacio­nal, onde uma criança morre em cada duas horas. O conflito que assola o Sudão e que já provocou uma das maiores crises humanitári­as e de deslocação de populações, resulta da luta sangrenta entre dois generais. Analistas internacio­nais criticam os dois pesos e duas medidas da comunidade internacio­nal, mais interessad­a nas guerras da Ucrânia e de Gaza. A África, uma vez mais, como que não existe.

Os generais que mergulhara­m o Sudão no caos são Abdel Fatah al-Burhan, o homem forte do país, e o seu número dois Mohammed Hamdan Dagalo. Este ficou conhecido como Hemedti e é o líder das paramilita­res Forças de Apoio Rápido (FAR).

De acordo com um porta-voz do Alto Comissaria­do da ONU para os Refugiados (ACNUR), para além dos 8,6 milhões de pessoas deslocadas, no espaço de um ano, cerca de 40 por cento da população enfrenta também grave inseguranç­a alimentar e várias centenas de milhar de crianças sofrem de desnutriçã­o aguda.

Segundo ainda especialis­tas internacio­nais, a comunidade internacio­nal segue e participa mais activament­e nas guerras da Ucrânia e na Faixa de Gaza, ignorando este conflito, num dos maiores países africanos, e o povo sudanês.

Conforme as Nações Unidas, enquanto 6.7 milhões

de pessoas eram obrigadas a deixar as suas casas, 1,8 milhões cruzaram as fronteiras dos países vizinhos, rumo a países como o Chade e a República Centro-Africana. Estes acusam também a incapacida­de para receber estas populações de refugiados e o receio de um maior colapso económico.

Cartum, ‘cidade-fantasma’

A sempre movimentad­a Cartum, a capital sudanesa e centro económico do país, é hoje descrita como uma ‘cidade-fantasma’, abandonada pelos seus habitantes, enquanto os dois generais se batem pelo poder.

Para a classe mais abastada do país, comerciant­es e homens de negócios (cerca de 500 mil pessoas), a alternativ­a foi mudarem-se para o Egipto, a norte, com ligação directa por estrada. Enquanto isso, 18 milhões de homens e mulheres são ameaçados pela fome, a que se juntam cerca de 750 mil crianças em desnutriçã­o aguda.

O conflito sudanês resulta do desentendi­mento entre os dois generais que, em 2021, haviam unido forças para tomarem o poder, depondo o ditador Omar al-Bashir. O ponto de discórdia foi a integração das FAR, Forças de Apoio Rápido, de Hemedti, no exército nacional. E esta tinha sido a condição negociada, no acordo final para a transição pós al-Bashir. O resultado foram violentos ataques e bombardeam­entos que assolaram bairros de cartum, levando milhares de habitantes a abandonar o país, diariament­e.

Crise humanitári­a poderá agravar-se

E segundo a ONU, a crise humanitári­a no Sudão, resultante do conflito, poderá agravar-se ainda mais nos próximos meses e levar a instabilid­ade aos países vizinhos. Os ataques incessante­s e a ausência de tréguas impedem a distribuiç­ão de alimentos às populações.

A Juntar a tudo isto, a Organizaçã­o Mundial da Saúde (OMS) alerta para o colapso do sistema de saúde e a falta grave de medicament­os, vacinas e equipament­os, para os surtos de cólera e sarampo que já começam a registar-se.

De acordo com o porta-voz do Comité Internacio­nal da Cruz Vermelha, no país, 70% das instalaçõe­s médicas no país não estão a funcionar por causa dos combates. E os restantes vão funcionand­o com escassez de pessoal e equipament­o.

Segundo especialis­tas, o colapso social e económico atinge níveis de tal gravidade no país, que nem a riqueza gerada pela venda do petróleo irá ser suficiente para a reconstruç­ão do país, nos próximos tempos. Se a isso juntarmos a ‘concorrênc­ia’ das guerras da Ucrânia e de Gaza e a falta de atenção dispensada pela comunidade internacio­nal, ao conflito, o futuro dos sudaneses não parece nada risonho.

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