Vistos, “a pedra no sapato”
Depois de ter convivido com vários cabo-verdianos em Coimbra, Ana Cordeiro casou com um cabo-verdiano e acabou por adoptar, há muitos anos, também Cabo Verde como seu país. Actualmente reside no Mindelo, mas já viveu na Praia. Como observadora atenta pôde acompanhar o desenvolvimento de Cabo Verde. Também ela e a família passaram pelo mesmo tipo de carestia que era a vida nos primeiros anos da independência. Hoje, acredita que apesar de todos os pesares, as relações entre os dois países são as melhores.
“Apesar de todos os motivos que havia para ressentimentos, os sentimentos mais negativos foram praticamente ultrapassados, eles só vêm ao de cima, às vezes, quando acontece alguma coisa onde há contornos racistas. Aí, o ressentimento em relação ao antigo colonizador vem ao de cima. Mas, tendo em atenção o que foi a violência, o que foi, de facto, a guerra, do abandono económico, eu acho que podemos considerar que, neste momento, as relações, por exemplo, entre Cabo Verde e Portugal, que é o que eu conheço bem, não poderiam ser melhores”, argumenta.
Contudo, há obstáculo, que, na sua opinião, está a impedir que as relações entre Praia e Lisboa sejam perfeitas: a questão dos vistos.
“Nós vemos aqui, nos jovens cabo-verdianos, uma assunção de uma identidade africana, mais por rejeição de alguma aproximação à Europa, até porque a Europa lhes fecha as portas. E, isso, é importante que isso seja resolvido. Portugal tem que encontrar uma forma de não fechar as portas, sobretudo aos jovens, porque as outras pessoas mais velhas até conseguem pela sua situação económica, estabilidade económica viajar, os jovens não, têm esta porta completamente fechada”.
Porém, a nossa entrevistada acredita que, no contexto da visita recente de Luís Montenegro, primeiro-ministro de Portugal, a Cabo Verde, é sinal de reconhecimento da importância das relações entre os dois países, embora não esteja muito crente na resolução dos problemas.
“A solução não é fácil porque dificilmente se pode encontrar uma solução só para Cabo Verde, não é? É preciso ter em conta os outros países de expressão portuguesa, porque, se fosse só Cabo Verde, o problema já estaria resolvido. Mas também é preciso ter cuidado com o seguinte: Cabo Verde precisa de emigrantes qualificados e nisso não podemos despovoar as ilhas dos seus melhores recursos humanos”, finaliza.