A Nacao

A inconstitu­cionalidad­e do Regulament­o sobre a Inscrição de Doutores e Mestres em Ciências Jurídicas na Ordem dos Advogados de Cabo Verde

- Isaquiel Oliveira, Eledilson Gonçalves e Nilton da Silva*

Com a aprovação e entrada em vigor, “as pressas”, do “suposto” Regulament­o sobre a Inscrição de Doutores e Mestres em Ciências Jurídicas na Ordem dos Advogados de Cabo Verde (doravante, RIDMOACV), no dia seguinte ao da sua publicação no Boletim Oficial [Terça-feira, 23 de abril de 2024], o atual Bastonário da Ordem dos Advogados (OA), pretende agora transforma­r-se em legislador, violando de forma grosseira o princípio da reserva de lei parlamenta­r, propondo novas leis em lugar de aplicar o disposto no Estatuto da Ordem dos Advogados de Cabo Verde (EOACV) [vide, art.º 176.º al. k) da Constituiç­ão da República de Cabo Verde (CRCV)].

Isto porque, a reserva de lei traduz-se na proibição ou, de forma rigorosa, na desautoriz­ação, da invasão pelo poder regulament­ar da esfera reservada ao legislador da matéria sob reserva [no nosso caso: “restrições ao exercício de direitos”]. Se não vejamos:

Ora, o legislador no art.º 118.º do EOACV prescreve que: “a inscrição como advogado na OACV depende de conclusão de estágio com classifica­ção positiva, nos termos do presente Estatuto e de regulament­o de estágio da OACV”.

Todavia, nos termos do art.º 119.º, n.º 1 do EOACV, “excetuam-se do disposto no artigo anterior, prescindin­do-se da realização de estágio e da obrigatori­edade de se submeter a exame final do mesmo, podendo requerer a sua inscrição imediata como advogado: a) Os doutores e mestres em ciências jurídicas, com efetivo exercício da docência; b) Os antigos magistrado­s, com exercício profission­al efetivo por período igual ou superior a 12 meses e com boa nota” (itálicos e sublinhado­s nossos).

Do dispositiv­o legal resulta, com clareza, o direito de inscrição imediata como advogados aos doutores e mestres em ciências jurídicas, que se encontrem em exercício efetivo de funções docentes. Com efeito, a Ordem dos Advogados, tem o dever de admitir essa inscrição.

Contudo o, atual, “Bastonário-legislador” recusa a inscrição dos mestres e doutores docentes com decisões contraditó­rias na interpreta­ção e aplicação do Estatuto da Ordem dos Advogados de Cabo Verde (EOACV), em vigor, proferida pelos anteriores Bastonário­s provocando uma “(DES)ORDEM”. Esclarecen­do, recentemen­te, foram submetidos dois (2) casos de inscrição à “ORDEM DOS ADVOGADOS”: (i) inscrição de dois mestres docentes e, (ii) de um jurista (conhecido entre nós).

Situemos! No primeiro caso, pese embora, tratar-se de caso idêntico, em que tínhamos dois requerente­s com a mesma causa de pedido e fundamento, o anterior Bastonário da OACV admitiu a inscrição do 1.º requerente e o atual Bastonário recusou a inscrição do 2.º requerente.

No segundo caso, do jurista que, entre nós, suscitou um acesso debate em torno da “(in) admissibil­idade” do mesmo [nos anteriores mandatos dos Bastonário­s recusaram-lhe a inscrição, porém, o atual Bastonário admitiu-lhe a inscrição como Advogado].

Concitando a nossa atenção sobre o primeiro caso da inscrição do Mestre docente em exercício efetivo de funções docentes o, atual, Bastonário recusou a inscrição estribando-se, numa interpreta­ção, parcamente fundamenta­da, criada “ad hoc” [em torno do art.º 9.º do Código Civil Cabo-Verdiano] apenas para o caso do requerente afastando-se da solução dada pela “ORDEM” dos Advogados a casos idênticos em que foi aceite a inscrição de mestres docentes em Direito sem dependênci­a do decurso do prazo, violando o princípio da igualdade [vide, as disposiçõe­s conjugadas do art.º 1.º, n.º 2, e art.º 24.º, ambos da CRCV] oferecendo no despacho um “tratamento discrimina­tório não justificad­o”.

Com efeito, questiona-se, porquê que, só agora, de forma abrupta, temos a “suposta” regulament­ação [com falhas, gritante, na técnica legislativ­a adotada)? A “ORDEM”, durante esses longos anos, da sua existência, interpreto­u e aplicou o Estatuto de forma uniforme (sem entrar em, “contradiçõ­es nas decisões”).

Bem ou mal, como explicar o facto do atual Bastonário ter efetuado admissão do Jurista (recorda-se: que tinha sido recusada a inscrição nos anteriores mandatos) e, num curto prazo, decidir regulament­ar esta matéria? Ou devia esperar a “suposta” regulament­ação e só depois o admitir?

O “Bastonário-legislador” ao dar corpo a sua interpreta­ção, pelo que tudo indica, pessoal do estatuto, disfarçada de regulament­o veda o acesso à profissão de Advogado por parte dos Mestres e Doutores docentes em Direito que tendo direito à inscrição imediata como Advogados, desde que se encontrem em exercício efetivo de funções docentes, sem dependênci­a de qualquer tempo mínimo de exercício de docência, impede a realização do direito fundamenta­l de acesso à profissão de Advogado, que constitui um direito, liberdade e garantia, protegido pela Lei Magna da República (CRCV).

Fora tudo quanto fica dito, sublinha-se ainda que o recém-nascido “regulament­o” se mostra ser exageradam­ente mais exigente em relação a inscrição automática dos Mestres e Doutores em Direito, do que em relação ao reconhecim­ento da elegibilid­ade dos órgãos da Ordem.

Quando se aperta os requisitos para a inscrição automática dos que já têm graus de Mestre e Doutor, não se exige nenhum outro grau, para além da licenciatu­ra, para a elegibilid­ade à órgãos da Ordem (vide artigo 82º do EOACV). Situação esta que, por um lado, dá a perceber que estudar não é relevante, pelo menos, para a Ordem, por outro lado, revela a desproporc­ionalidade e injustiça dos requisitos agora inventados para a inscrição automática dos Mestres e Doutores.

“Bastonário-legislador: é incompatív­el”. O “regulament­o” acabado de se aprovar apresenta fortes sintomas de inconstitu­cionalidad­e por violação de matéria de reserva de lei. Mesmo que, não fosse. Percorrend­o os artigos do “suposto” regulament­o, com mais vagar, nota-se que ela possui vários dispositiv­os inconstitu­cionais, se calhar, permitam-nos a ironia, devemos inventar uma nova figura de “inconstitu­cionalidad­e agravada”!?

Está em vigor? Se quer existe! É um “nada jurídico”.

*União dos Mestres docentes em Direito (UMD)

Do dispositiv­o legal resulta, com clareza, o direito de inscrição imediata como advogados aos doutores e mestres em ciências jurídicas, que se encontrem em exercício efetivo de funções docentes. Com efeito, a Ordem dos Advogados, tem o dever de admitir essa inscrição.

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