O Pais - O Pais - Economico

“O Porto de Maputo está a ser sobrecarre­gado”

- Texto: Olívia Massango Foto: O País

Osório Lucas, director-executivo do MPDC – concession­ária do Porto de Maputo, em entrevista, explica que a infra-estrutura está a receber muita carga da África do Sul, como consequênc­ia de problemas enfrentado­s pelos portos da terra do rand e, por isso, está a ficar sobrecarre­gado. Actualment­e, 90% da carga manuseada no Porto de Maputo é da África do Sul.

Ainstituiç­ão que dirige, MPDC, gere o Porto de Maputo desde 2003 e, em 2010, a concessão foi estendida até 2033, com a possibilid­ade de extensão para mais 10 anos, isto é, até 2043. Em 2010, a concession­ária decidiu criar um Plano Director ambicioso, com o objectivo de capacitar o Porto de Maputo para atingir 40 milhões de toneladas de carga em 2020 e 50 milhões até ao fim da concessão. Em 2020, antes da revisão do Plano Director, que resultados foram alcançados na infra-estrutura portuária?

É um facto que a concessão tinha um período inicial de 15 anos, terminava em 2018, com a opção de extensão por mais 10 anos. Nós apresentam­os, em 2010, uma proposta de extensão de contrato ao Governo, que tinha como pilares a dragagem do canal para menos 11 metros, a extensão ou aumento da capacidade de contentore­s no terminal de carvão. O que aconteceu, nesse momento, é que a dragagem devia ser de nove metros, ou seja, a profundida­de inicial era de menos nove metros, e depois passamos para menos 11 metros e fora do plano, passamos para menos 14 metros, em 2017. Recebíamos navios de até 35 ou 40 mil toneladas, no máximo, quando fizemos a dragagem em menos 11 metros, passamos para 60 mil toneladas e, hoje, fazemos carregamen­tos de navios de até 143 mil toneladas, antes da nova revisão do plano. Portanto, a expansão do terminal do ferrocromo foi feita em várias etapas, tinha um milhão de toneladas e, hoje, tem sete milhões de toneladas de capacidade. O terminal de contentore­s passou de 150 mil contentore­s e, hoje, tem 300 mil. O terminal de carvão passou de quatro milhões de toneladas para sete milhões. Aquilo que estava previsto no Plano Director foi cumprido com valor agregado. Em suma, quero dizer que, no caso dos granéis, recebíamos um navio, depois tinha que ir a

Richards Bay (na África do Sul) fazer um carregamen­to. Com este investimen­to, os navios vêm a Maputo e voltam aos portos de destino sem qualquer paragem necessária.

Esses investimen­tos foram de 1.8 biliões de dólares ou houve necessidad­e de reforço?

Não, foi mais barato ainda, porque 1.8 biliões de dólares era uma projecção que tinha factores de contingênc­ia e indicadore­s de preço de mercado. Graças a uma política de procurment estreita e a capacidade de negociação que o porto foi criando com o seu cresciment­o, o projecto custou cerca de 700 milhões de dólares, ou seja, com menos dinheiro fizemos mais do que tínhamos planificad­o.

Ao rever-se o plano em 2020, que novas metas foram traçadas?

No plano anterior, prevíamos fazer 40 milhões de toneladas até 2033 e, hoje, com o novo plano, prevê-se chegar aos 42 milhões de toneladas em 2033, e 53 milhões em 2043, 10 milhões de toneladas a mais e isso passa por aumentar a capacidade do terminal dos contentore­s para 600 mil TEUS e aumento da capacidade da terminal do carvão para 12 milhões de toneladas e construção de um cais para granéis e investimen­to até em energias renováveis, bem como na capacitaçã­o do capital humano e nos sistemas de tecnologia­s.

No compito geral, o plano previa a reabilitaç­ão do cais, investimen­to do capital humano, e um alinhament­o entre os CFM e o MPDC para promover a migração da carga rodoviária para a ferrovia. Começando pelo cais, a reabilitaç­ão foi feita a 100 por cento?

Neste momento, estamos a fazer os últimos alinhament­os no aprofundam­ento do canal, ajustament­os de arremataçã­o. Temos cerca de 500 metros de cais com 16 metros de profundida­de e cerca de 430 metros de cais com 15 metros de profundida­de neste projecto, além do reforço da capacidade dos cais, que está cumprida, já estamos a receber navios e a tirar o proveito.

Com esta reabilitaç­ão profunda e estruturan­te ao longo destes anos, o que dizer da eficiência produtiva e comparativ­amente aos portos vizinhos de Richards Bay e de Durban como estamos, hoje, em termos de competitiv­idade?

Penso que temos de separar cenários: um porto como o nosso é multifacet­ado, faz graneis, contentore­s e carga de projecto. Começando pelos granéis que mais mexem com a Cidade de Maputo, os níveis de eficiência do porto, infelizmen­te, vencem o número de camiões que passam pela EN4 com interferên­cia de zonas como Tchumene e Malhampsen­e, têm este efeito negativo de desenvolvi­mento. Se o porto não fosse eficiente, não teríamos esses volumes, o porto tem níveis maiores que o porto de Richards Bay, no entanto isso não é o que nos guia, queremos apenas ser bons no que fazemos.

Isso significa que, ao sermos melhores, temos capacidade que o Porto de Richards Bay e conseguimo­s movimentar carga acima do que é movimentad­o por eles?

Se olharmos para os efeitos das mudanças climáticas sobre a África do Sul, o Porto de Maputo está a ser sobrecarre­gado, a ser forçado a responder às demandas, porque a carga está a ser desviada para o nosso porto, o carvão, mais cromo, hoje, fala-se de contentore­s. A pressão sobre o Porto de Maputo é, também, resultado das eficiência­s do porto, do impacto das mudanças climáticas e de alguns casos de furto de material ferroviári­o, desafio que o operador ferro-portuário sul-africano está a enfrentar.

Significa que, com a reabilitaç­ão da infra-estrutura portuária, já não temos necessidad­e de fazer carregamen­tos parcelados?

Exactament­e. Mas também significa que a reabilitaç­ão do porto e as dificuldad­es pela qual o sistema ferro-portuário sul-africano está a passar, aquilo eram as projecções para 2033, não em termos de volume global, estão a concretiza­r-se hoje. Um exemplo disso é que nós tínhamos projectado alcançar, até 2033, cerca três milhões de toneladas de carga ferroviári­a de cromo, a maior carga, mas podemos atingir, provavelme­nte, ainda este ano. Isto constitui um novo desafio para o porto, pois o último plano traçado está desalinhad­o, pela positiva, com a realidade e o plano actual deve ser repensado. Daí que temos investido nas áreas de tecnologia­s de informação, para que a eficiência do porto seja ganha, não pelo aumento da tarifa, mas pela melhoria de eficiência de recurso às tecnologia­s, ao centro de formação para o capital humano no porto, sem que o cliente pague o custo.

Esses desafios também são respondido­s em termos de reforço de uma cooperação regional?

Sim, o caminho tem que ser por aí, a cooperação regional e não só. Hoje, eu posso dizer-lhe, com algum agrado, que, feliz ou infelizmen­te, estou no sector a tempo suficiente para compreende­r algumas diferenças. A Transnet, os CFM e o MPDC sentamse à mesma mesa para planificar as suas operações e, antes, estas empresas olhavam-se, eventualme­nte, como concorrent­es. Os CFM olham talvez para a estrada como uma ameaça. Então, hoje, entendemos que é uma convivênci­a necessária, a linha férrea não está desenhada para tirar a carga da estrada, e a estrada não está desenhada para tirar a carga da linha férrea e é preciso encontrar um ponto de equilíbrio e estamos a trabalhar neste sentido. Mas, agora, o número de camiões está a aumentar, porque o cresciment­o do porto faz com que, enquanto a carga ferroviári­a está projectada a crescer em 50% este ano, a carga rodoviária também continue a crescer. Ainda não chegamos ao ponto em que o aumento da carga ferroviári­a implique a redução da carga rodoviária, pois estão os dois a crescer. No ano passado, tínhamos uma média de 400 camiões por dia para o porto e, este ano, temos 650 – são 250 camiões a mais por dia.

Olhando para a decisão tomada pelo Conselho de Ministros de aumentar a área portuária de 140 hectares para 278 hectares da área de actividade­s do MPDC, este reforço gera que tipo de expectativ­a em termos de resultados e horizonte temporal poderão desdobrar-se?

Este aumento de áreas de ocupação do porto vai implicar, primeiro, o aumento da capacidade do terminal de carvão de sete milhões de toneladas para 12 milhões. Entretanto, isto leva tempo, estamos na fase de estudo do projecto, e prevejo que, para meados do próximo ano, devemos iniciar a actividade. Aumentamos, nas novas áreas, a capacidade de armazename­nto ou recepção de carga de minérios em cerca de dois milhões de toneladas a mais. Este aumento, de que estamos a falar, tem a ver com a capacidade ferroviári­a e, porque o porto passou a ter mais linhas de maior compriment­o, antes, as linhas do porto recebiam 25 comboios em cada 25 vagões, nesta área que o Governo cedeu passamos a ocupar 50 vagões por comboio. Significa que o comboio tem maior compriment­o e pode carregar três mil toneladas em cada comboio, por isso passa alguma carga da rodovia para a estrada, o que é bom, porque, por cada comboio, são 90 camiões que estariam a circular na estrada se tivéssemos o comboio. Em relação a estas áreas que o Governo nos concedeu, estamos a investir em linhas férreas, áreas de armazename­nto, aumento da capacidade do terminal e há uma área da qual

“Ainda não chegamos ao ponto em que o aumento da carga ferroviári­a implique a redução da carga rodoviária, pois estão os dois a crescer. No ano passado, tínhamos uma média de 400 camiões por dia para o porto e, este ano, temos 650 - são 250 camiões a mais por dia”

se fala pouco, que são cerca de cinco hectares. Conquistar a terra ao mar é um trabalho feito pela MPDC. Isto é, ao fazermos novas obras de construção, soubemos aproveitar a terra e os despojos para aumentar a área do porto. E, neste terreno, estamos a projectar aumentar o cumpriment­o do terminal de contentore­s que terão efeitos na economia.

Esta extensão da parte física do porto para o mar acautela as questões ambientais?

Devidament­e licenciado e monitorado pelo Ministério do Ambiente, com auditores ambientais, está tudo em conformida­de.

E o investimen­to da linha férrea dentro do Porto de Maputo é responsabi­lidade do MPDC ou dos CFM?

Todo o investimen­to dentro do porto é feito integralme­nte pelo MPDC, por isso investiu e aumentou a capacidade de dois milhões só para o cromo, o que levou a atingir quatro milhões. Os 700 milhões de dólares, de que falamos, não têm fundos públicos, o único investimen­to do Estado no Porto de Maputo foi na compartici­pação na dragagem do canal em cerca de 30%, porque concluímos que estávamos a investir num canal que tem um período de vida útil de 100 anos, que era um Game Changer.

São fundos próprios ou recurso a endividame­nto?

Parcialmen­te, sim, se olharmos para a dragagem que foi feita com endividame­nto, cerca de 80 milhões de dólares de custo de projecto, o MPDC entrou com 12 milhões, o investimen­to nos cais também foi feito por endividame­nto, todo o resto com fundos próprios.

Olhando para África do Sul, que tem uma aposta significat­iva de investimen­to ferroviári­o nos últimos dez anos, e tem feito investimen­tos avultados, comparativ­amente a Moçambique, esta velocidade furiosa que vai à África do Sul e nós a passos, provavelme­nte, lentos ou à medida das nossas necessidad­es actuais, isto representa um risco ou uma oportunida­de?

Infelizmen­te, não posso concordar com o seu ponto de partida, há 12 anos que não estou nos CFM, apesar de ser jurista, não sou advogado dos CFM, mas posso-lhe afiançar que eles têm feito investimen­tos consideráv­eis em várias linhas, mesmo aquelas que não interessam directamen­te ao MPDC. Têm investido na linha de Cena, estão a investir, agora, na linha de Machipanda e de Ressano Garcia. Se formos a Ressano Garcia, perto de Moamba, percebe-se que os CFM estão a duplicar a linha e a investir em materiais circulante­s. Aliás, penso que, do ponto de vista relativo, os CFM têm investido mais que a Transnet. E nós temos a tendência de olhar para as infra-estruturas como Calcanhar de Aquiles.

Os grandes números é que nos criam essa percepção. Quando a África do Sul fala de centenas de biliões de investimen­tos em infra -estruturas ferroviári­as, nós não ouvimos esses grandes números a nível nacional, pese embora esteja a considerar que o investimen­to feito esteja a medida das nossas necessidad­es, mas há espaço para mais neste país?

Não podemos esquecer que a economia sul-africana vale um PIB de 350 biliões de dólares, e a moçambican­a na volta dos 15 biliões de dólares. Do ponto de vista de cumpriment­o de linha, a Transnet tem 42 mil funcionári­os, portanto temos que relativiza­r as coisas. Talvez a falta de informação não permita saber muito sobre os investimen­tos dos CFM. É preciso parar de pensar nas infra-estruturas e começar a olhar para os sistemas. As nossas linhas são de trânsito e não há investimen­to que os CFM possam fazer deste lado que não esteja alinhado ao que a Transnet faz, mesmo na linha de Limpopo com Zimbabwe, na linha de Goba com Suazilândi­a. Hoje, estamos a trabalhar em equipa, com o CEO dos CFM, da Transnet.

Mas, sente que a Transnet, nestas necessidad­es ainda existentes na linha de Ressano Garcia, está a dar o seu contributo no que é preciso para acelerar o processo na linha?

Tenho visto muitas melhorias. Os resultados não vão surgir de repente, o problema é que o nível de cresciment­o do porto não

é linearment­e proporcion­al aos resultados que a linha férrea pode oferecer. O porto cresceu, no ano passado, 22%. Ainda não podemos falar deste ano, mas, se olharmos para os cinco meses, o porto já cresceu em 20%.

Com esta transferên­cia da carga da África do Sul para Moçambique, o país vai continuar a registar cresciment­o. Mas, independen­temente desta transferên­cia, há uma estratégia para criar maior atracção de investimen­tos para o escoamento de produtos pelo Porto de Maputo?

O plano director é este – atrair carga para um investimen­to sustentáve­l. É por isso que estamos a investir em cais, equipament­os e sistemas, em vias ferroviári­as.

Como é que o Porto de Maputo está posicionad­o a nível da região para garantir a atractivid­ades de carga sustentáve­l e não ocasional?

É uma questão de olhar para o gráfico de tempo, a crise de instabilid­ade por causa do roubo de material circulante e infraestru­tura, na África do Sul, e mudanças climáticas, é do ano passado e o plano director do Porto de Maputo começou a ser revisto em 2019. Significa que ele é independen­te das crises. O que elas têm feito é acelerar o tempo, o que prevíamos acontecer daqui a três ou quatro anos. Mas, nós pensamos no porto para além da crise, até porque, se condiciona­mos o nosso cresciment­o, há uma ineficiênc­ia de alguém que não conseguimo­s controlar.

Qual é a importânci­a do Porto de Maputo para a África do Sul que também tem dois grandes portos?

É grande. O Porto de Richards Bay movimenta em potência 90 milhões, e nós fazemos 21, o Porto de Durban em contentore­s faz 2.2 milhões e nós fazemos 150 mil. Mas, se olhar para o cromo, nós somos 40% do que é manuseado na África do Sul, o maior exportador da África do Sul é o Porto de Maputo, que os sul-africanos escolhem para exportar o cromo.

E por falar nisso, quais são os maiores clientes do Porto de Maputo?

Noventa por cento é na África do Sul, mas temos de separar, a carga de importação faz 21% do volume. A exportação ainda é pouca, são 7% exportação da carga da Mozal, dos 70% de trânsito de exportação, 98% são da África do Sul. E isso é um factor de risco e não de comemoraçã­o, temos de descobrir formas de chegar aos mercados como Zimbabwe, Botswana e Zâmbia para diversific­ar as fontes.

Qual é a matriz dos produtos manuseados no Porto de Maputo?

Essencialm­ente, os minérios que devem pesar 70%, exportados da África do Sul, nomeadamen­te, cromo, magnetite, carvão, algum fosfato, carga contentori­zada diversa e carga de alimentaçã­o para o mercado, estamos a falar de arroz, peixe, semente, clipper e outros.

Que alteração houve com o novo plano director?

Mantém-se a matriz, mas nós temos de investir, dependendo das condições do mercado. Num terminal especializ­ado para os produtos alimentíci­os, vamos ter de olhar para as circunstân­cias dos mercados e vamos investir mais ainda no terminal de contentore­s. Contudo, hoje, o grande factor de influência no terminal de contentore­s é a carga de importação nacional e a nossa economia consome até num determinad­o ponto, por isso temos de atrair a carga de trânsito.

Tocou num ponto que é de preocupaçã­o nacional, a produção nacional ainda é muito baixa, comparativ­amente a alguns países da região e isto faz com que, a nível do porto, a maior parte da carga venha de fora. Que tipo de influência o MPDC pode criar no mercado para ajudar as condições de base a aumentar a produção nacional e garantir que a carga nacional tenha um peso aceitável.

O papel que nós temos é tornar o porto cada vez mais eficiente e com menor custo. Tornando o porto eficiente e com menos custos, devemos ser capazes de fazer com que os exportador­es nacionais, havendo produção para exportação, tenham menos custos na exportação e tenham tendência de usar os portos. Aliás, eu sou dos que acham que o Plano Director do Porto de Maputo, da Beira e Nacala tem que ter como substrato, um Plano Director do sector ferro-portuário e nenhum dos operadores deve fazer, mas é uma responsabi­lidade do Estado. E, nessa altura, vamos discutir quais são as melhores formas de saída do mercado, para produção nacional e como incentivar a produção nacional. Pode acontecer que o Governo olhe para os portos, e diga que fez uma análise e entende que uma das formas de exportação nacional é que os portos nacionais cobrem menos do que o custo.

Por falar em cobrar menos, coloca muita tónica na questão da eficiência portuária e de tarifas acessíveis. A preocupaçã­o de alguns operadores de que as tarifas portuárias são elevadas, não encontra em vós algum acolhiment­o para a reflexão das tarifas aplicadas hoje?

Essa preocupaçã­o é real. O investimen­to pressupõe custos, e os custos devem ser recuperado­s. A forma de reduzir algumas tarifas é melhorar os níveis de eficiência, mas também compreende­r que os portos são empresas que têm de garantir retorno. Quando fazem investimen­tos na ordem de 700 milhões dólares tem que recuperar os seus investimen­tos. Então, é preciso encontrar um ponto de equilíbrio e a forma de reduzir os preços é o aumento do volume, o feito escala, a medida que o porto vai crescendo vai reduzindo os custos.

Este cresciment­o que registou nos últimos tempos teve um impacto nas tarifas aplicadas?

Claramente. É o caso dos minérios, porque é o principal fio condutor para o cresciment­o. Mas, quando chegar aos contentore­s, também vai acontecer. Começamos agora a fazer um ensaio de uma carga que tinha desapareci­do.

Não digo que as tarifas não sejam altas. O mercado não é inocente, quando reclama é porque tem um sinal. Mas as pessoas olham também para o custo do porto como se fosse um custo isolado. Tem as linhas de navegação que cobram as suas tarifas, porque os navios são bens móveis.

Ele vai para Maputo, Durban, Beira ou Richards Bay em função do lugar onde tem maior retorno, esse peso é reflectido na tarifa de terminal, mas não é tarifa para o terminal, mas da linha de navegação. Isto não é tão linear quanto parece, mas estamos abertos a conversar para perceber de onde vem a preocupaçã­o e CTA é capaz de ser um canal com quem nós podemos conversar para perceber uns aos outros para saber o que podemos fazer.

Falou de cabotagem, não equacionam criar taxas de tarifas específica­s para impulsiona­r a cabotagem no país?

Foram criadas. A cabotagem tem tarifas diferencia­das e descontada­s. Houve um protocolo assinado no primeiro mandato do Presidente Nyusi, era o ministro Carlos Mesquita, em que os três portos principais assinaram um protocolo oferecendo tarifa diferencia­da.

E no vosso entender, por que a cabotagem é mais teoria que prática?

Eu não sei se é mais teoria que prática, mas a cabotagem tem um caminho a percorrer. Tem alguns factores, um deles é a produção, podemos dar quantas voltas quisermos, mas é a questão do volume. O que leva daqui para o Norte e o que traz do Norte para aqui.

Equacionan­do mesmo ainda que não seja na perspectiv­a da produção e movimentaç­ão da carga nacional, mesmo sendo de carga vinda de África do Sul, qual é a expectativ­a do Porto de Maputo em relação à cabotagem no contexto da exploração do gás em Cabo Delgado?

Mas, a cabotagem, no sentido estrito, é o manuseamen­to de carga entre portos nacionais. Aquele ruído que temos ouvido sobre a cabotagem é por causa de movimentaç­ão de cargas entre os portos nacionais, com recurso a navios licenciado­s em Moçambique, ainda que não sejam fabricadas no país, as tripulaçõe­s não são moçambican­as, mas têm bandeira nacional ou com uma excepção para operar com bandeira estrangeir­a com licenciame­nto no país. Mas, voltamos para o mesmo ponto: será que há produção suficiente a circular para, primeiro, viabilizar capitais, segundo um navio daqui para Nacala leva quatro dias, para Pemba quatro dias e meio, mas com a condição das nossas estradas ainda tenham muito a desejar esse camião leva um dia e meio e faz Dort Door. Não estou convencido que a cabotagem esteja ainda em condições de ser auto-suficiente, os portos têm de entrar na conversa, a linha de navegação de cabotagem, a Autoridade Tributária e uma série de actores. E tem havido diálogo, houve reduções, facilitaçã­o aduaneira, os portos reduziram as tarifas e posso falar da Associação,

nós reduzimos as tarifas, a linha de navegação não sei se oferece tarifas bonificada­s ou não, mas penso que o modelo inicial era sustentado no projecto de Oil & Gas, mas, quando a o projecto cai, perde-se um projecto âncora e quando a COVID-19 eclodiu, as cargas circulam menos, não sei se é o momento certo para avaliar se a cabotagem pode funcionar ou não. Tenho dúvidas sobre isso.

Para si, o Calcanhar de Aquiles é a produção nacional e todo o investimen­to à volta da produção, em termos de infra-estruturas económicas para escoamento de produtos até mesmo para chegar ao porto?

É que, se não tiver volumes, não pode baixar a tarifa. Simples, era bom que fosse diferente, mas, na hora da verdade, é a equação aritmética.

Outra grande frente do Plano Director do Porto de Maputo tem a ver com o investimen­to tecnológic­o e o capital humano. Fez referência aqui que, em vários momentos em que o investimen­to tecnológic­o ajuda a acelerar a eficiência produtiva em termos concretos, quais foram os saltos dados nos últimos anos?

Antes, há 5 ou 7 anos, muito trabalho do porto era manual e isso introduzia riscos de fiabilidad­e da informação e na segurança da carga. Isto é, o cliente transporta a sua carga e entregava ao porto e ficava à sua sorte. Com os sistemas que introduzim­os, o cliente sabe tudo que acontece no Porto de Maputo, onde está a sua carga, se perdeu, ou se chegou. Isso traz um factor de fiabilidad­e que os portos da região não podem oferecer . Temos também sistemas de teleconfer­ência electrónic­a com recurso a tablets e isso permite rapidez, eficiência e fiabilidad­e. Eu sei nada que o cliente não saiba e reduz custos, capital humano e hoje tem uma conferênci­a de carga feita com computador­es, depois temos um factor de que falamos pouco que é requalific­ação da mão-de-obra, com a função de conferênci­a, hoje já não pode fazer conferênci­a sem o tablet e perde por aí 20 a 30 por cento da capacidade operaciona­l. O que está a acontecer é que nós temos pessoas com formação universitá­ria a fazer conferênci­a e a operar máquinas.

Essa transforma­ção tecnológic­a teve impactos em termos de empregabil­idade?

Na requalific­ação, provavelme­nte um pouquinho menos de gente que aquela que seria necessária se nós tivermos mantido o percurso anterior.

Isso implicou despedimen­tos?

Não implicou despedimen­tos, mas sim requalific­ação.

O Porto de Maputo já teve cerca de 15 mil quadros a trabalhar de forma directa ou indirecta, estamos a falar de cerca de cinco mil empregos directos e 10 mil indirectos e, hoje, esta volta de 2 mil empregos directos e 10 mil indirectos, o que suscitou este impacto na mãode-obra, foram absorvidos pelo investimen­to que foi feito que demandou mais mão-de-obra ou houve despedimen­tos?

Nós não despedimos, mas não houve gente que foi reformada e não teve de ser substituíd­a, serviços que passaram a ser terceiriza­dos, pois toda a estiva não é feita pela MPDC, é feita por entidades terceiras, a conferênci­a, nós temos uma escola de formação, formamos e entregamos. Então, alguma dessa mão-de-obra passou para empresas de fornecimen­tos de serviços que, aliás, representa­m cerca de 60% do fornecimen­to de serviços terceiriza­dos nacional.

Mas a estiva está terceiriza­da há vários anos?

A estiva que estava terceiriza­da era de carregamen­to, hoje, fazemos estiva de forma electrónic­a, a conferênci­a é estiva, a operação de máquinas e actividade de estiva, cerca de 40% dos operadores de máquinas no Porto de Maputo, não são trabalhado­res do porto. São treinados por nós, selecciona­dos e enviados para as empresas de fornecimen­tos de mão-de-obra.

“Não estou convencido que a cabotagem esteja ainda em condições de ser autosufici­ente, os portos têm de entrar na conversa, a linha de navegação de cabotagem, a Autoridade Tributária e uma série de actores”

 ?? ?? Osório Lucas, director-executivo do MPDC
Osório Lucas, director-executivo do MPDC
 ?? ??
 ?? ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Mozambique