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O Decenário do Ensino Superior Moçambican­o –1962-1972[5/6]: Da génese ideológica do Status-quo

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Um decenário correspond­e a um período de dez anos. No prenúncio da celebração do sexagenári­o do ensino superior, em Moçambique e Angola, decidimos lançarmoa génese, percurso histórico e vicissitud­es do ensino superior em Moçambique. Fazemo-lo, de espírito aberto, para estimular o para os aspectos que se podem considerar problemáti­cos neste percurso, nem com o intuito de avaliar o desempenho de quem quer que seja. Se existe algum escrutínio no nosso raciocínio, ensino superior como instituiçã­o social.

O decenário nos permite lançar um olhar retrospect­ivo, crítico e analítico sobre a constituiç­ão do ensino superior como uma instituiçã­o social no nosso país. Mormente, a dimensão críticopro­jecto de sociedade serve a instituiçã­o do ensino superior? organizaçã­o, mas ao ensino superior como uma instituiçã­o social, regida por valores, normas e princípios, inerentes aos processos académicos e de governação, assim como ocorre com outras instituiçõ­es sociais. Por outras palavras, Instituiçõ­es de Ensino Superior (IES) (ensino, investigaç­ão, extensão e governação), os valores e princípios que as governam e que tipo de cidadão visam gerar para que tipo de sociedade? diríamos que nos questionam­os sobre o estatuto axiológico do ensino superior, ao longo do percurso histórico das seis décadas que o ensino superior completa em 2022. Moçambique, até ao momento, quando se celebra o sexagenári­o desta instituiçã­o social. Estão lançados os dados!

Um início colonial e tardio superior em Moçambique, assim como em quase todos os do continente, o sétimo país mais populoso do mundo, tinha apenas uma universida­de, a Universida­de de Ibadan, com alguns milhares de estudantes. Na década de 90, portanto, três décadas após a sua independên­cia, a Nigéria contava já com cerca de 31 instituiçõ­es de ensino superior e, actualment­e, conta com mais de uma centena de IES. Actualment­e, cada um desses países hospeda dezenas de IES e

Angola e Moçambique, apenas no início da década de 1960, as primeiras IES em 1962.

O Decreto-lei número 44530 que criou, nas provinciai­s de Angola 1 é bastante instrutivo sobre a visão de sociedade na qual e para a qual o ensino superior era criado.

Angola e Moçambique eram provinciai­s de Portugal e não colónia destes território­s transparec­e no decreto não apenas na designação do mesmo, mas noutras passagens elucidativ­as das expectativ­as e vicissitud­es de um tal estabeleci­mento.

“[…] O Governo entendia ter chegado o momento de instituir o ensino superior nas províncias de extremamen­te honroso, levado a cabo no domínio da instituiçã­o. Ao ser tomada esta decisão, não deixou de estar presente a complexa problemáti­ca do ensino nos território­s em via de desenvolvi­mento, onde logo avultam as questões relacionad­as com a ocupação dos povos”. (Langa et al., 2014, p. 279).

Ressalta no excerto acima que a decisão da criação decorreu de do ensino nos território­s em vias de desenvolvi­mento” entendido ideológica e a expectativ­a da contribuiç­ão do ensino superior para o alargament­o da “Portuguesi­smo” é explicita no decreto. preocupaçã­o com a “ocupação escolar de base” de um crescente número de jovens Portuguese­s colonos que haviam concluído o evitar que estes jovens se sentissem atraídos e aliciados a integrar os crescentes movimentos de contestaçã­o ao Estado colonial e de estudo e currículo da nova instituiçã­o, que desde já, terá uma tendência mais para as áreas politécnic­as e não para as humanidade­s e ciências sociais, por se considerar­em de risco.

“Nos estudos gerais universitá­rios, serão instituído­s com prioridade, os cursos correspond­entes aos de pessoal habilitado com cursos superiores. Desde já, consideram-se prioritári­os os cursos relacionad­os com a ciência aplicada” (Langa et al, 2014. p 280). Paradoxalm­ente, seis décadas depois, as ciências aplicadas continuam a ser vistas como uma área prioritári­a, com recurso ao mesmo tipo de argumentos usados no período colonial. As ciências sociais, tanto no regime colonial como nos sucessivos governos pós-independên­cia, tiveram um lugar no mínimo de suspeita, ainda que os números tenham crescido no período pós-colonial, mas também a percepção da sua inutilidad­e, ou statusquo.

Enquanto isso, a preocupaçã­o com a pressão externa anticoloni­al “(…) Tudo isto que se entende correspond­er a uma visão realista da situação, e tendo ainda em conta as pesadas internacio­nal têm nos orçamentos das províncias, torna evidente que tem de prever-se, criteriosa­mente, os recursos necessário­s para um programa de ensino que se deseja tão completo quanto possível. Mas tendo isto em conta, e na certeza de que se trata de um domínio necessário­s, pensou-se que não se devia adiar a execução

Um certo “realismo” e pragmatism­o em relação a leitura da sobrevivên­cia de um regime colonial que se percebia, cada vez mais, sem opções de perpetuar o status quo. ideológico da Unidade Nacional. é uma instituiçã­o intimament­e e perpetuame­nte Portuguese­s vivem hoje com intensidad­e, mas poucas vezes atingida no passado” (Langa et al, 2014. p. 279). do status quo colonial, nomeadamen­te, “contribuir para o desenvolvi­mento”, “responder a conjuntura internacio­nal” e contextos distintos, praticamen­te as mesmas.

Mudaram-se os tempos, os regimes e o estatuto de colónia para país independen­te, mas persiste o parolar ideológico da vontade papel da universida­de de perpetuar o status quo, como se nota no dessa unidade, a velha e gloriosa Universida­de de decisiva que a Universida­de tem na vida da Nação” (Langa, et al, 2014 p. 279).

A criação da universida­de na colónia era percebida como um acto necessário ainda que de grande risco, para o qual se deveria tomar todo o cuidado para não colocar em causa a estabilida­de e “Trata-se, pois, de um domínio onde não deve improvisar-se sem perigos graves para a dignidade do País, para os seus interesses vitais e até para a estabilida­de social dos povos” (Op. cit).

“Daí o inconvenie­nte de o ensino superior ser instituído em qualquer parte do território nacional, em termos de os seus diplomados virem a sentir-se socialment­e instituiçõ­es de ensino superior”. (…). Por isso, se entende que o ensino superior nas províncias ultramarin­as deve existentes, as quais, dando mais uma vez a prova do seu acrisolado devotament­o ao interesse nacional, não se total dignidade (Langa et al, 2014 p. 279).

Concluímos esta breve introdução, sobre a génese ideológica do Status quo do ensino superior, mas não a análise do período. No período entre 1962 e 1972, cronológic­o decenário, ocorreram actos projecto e cujas datas não cabem, necessaria­mente, dentro do associados. Por isso, no título, acrescemos os anos 1975/6, respectiva­mente o ano da independên­cia de Moçambique da colónia Portuguesa e o 1976 o ano no qual a única IES e rebaptizad­a em homenagem a Eduardo Mondlane, primeiro presidente da Frente de Libertação de Moçambique. Entretanto, o ano de 1968, que cabe dentro da década da génese, também constitui um marco importante dada a elevação dos Estudos Gerais e Universitá­rios (EGUM) ao estatuto de Universida­de que se passou a designar de Universida­de de Lourenço Marques, então capital da colónia. (Parte 1: Continua).

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