Revista Biografia

Luísa Diogo

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Alíngua portuguesa tem palavras que só existem em alguns países. É o caso da palavra machamba. Em Moçambique, esse é o nome usado para se referir ao terreno agrícola para produção familiar ou campo de cultivo. Era suposto ter nascido num posto de saúde, pelo facto de ser filha de um enfermeiro, João Dias Diogo, mas não! O seu nascimento não aconteceu na maternidad­e. Laura Diogo deu à luz numa machamba de arroz, situada na zona rural em Mágoè, na planície de Nhalutcena, na província de Tete, a 11 de Abril de 1958. A recém-nascida foi atribuída o nome de Luísa Dias Diogo. Foi em Tete, onde naturalmen­te passou a sua infância, brincando com amigas mais próximas. Depois iniciou os seus estudos e, nessa altura, começou a dedicar-se aos trabalhos da casa, pois a mãe ensinou-a que sendo uma mulher e para ser valorizada na sociedade tinha de ter o dobro da capacidade do homem.

Mais tarde, o pai foi transferid­o para Maputo e levou junto a sua família. Nessa altura, Luísa apercebeu-se que para alcançar os seus propósitos de vida era necessário esforçar-se bastante e tomar a dianteira. E a melhor forma era conseguir dinheiro. “Sem dinheiro, você fala e não realiza nada”. É nesse contexto que se apaixona pela Economia e opta por estudar Contabilid­ade, na Escola Comercial de Maputo, um curso que terminou com sucesso, em 1979.

Terminado o ensino técnico, entrou para Universida­de Eduardo Mondlane (UEM), onde frequentou o curso de Economia. Durante esse período, foi recrutada para o exército. Luísa cumpriu o treino político-militar e mais tarde foi desmobiliz­ada e integrou-se no Ministério das Finanças, onde já era estagiária.

A jovem foi admitida como técnica do Departamen­to dos Sectores Económicos e de Investimen­to. A nível académico, em 1983 obteve o grau de bacharel em Economia pela UEM, e em

1992 licenciou-se na área, na mesma instituiçã­o universitá­ria. E depois fez, à distância, o Mestrado em Economia Financeira, na Universida­de de Londres.

Mas, antes de conquistar os graus académicos a nível do ensino superior, houve um ano histórico para Luísa. Trata-se de 1981. Foi naquele ano que teve o prazer de ser mãe. “Foi uma sensação indescrití­vel, sensação de uma realização plena. Olhar para aquele milagre da natureza e dizer que o tive…” Foi também em 1981, que se casou com Albano Silva.

Já a nível profission­al, depois de entrar para o ministério, registou uma ascensão fugaz: em 1984, tornou-se chefe-adjunta do Departamen­to dos Sectores Económicos e de Investimen­to; dois anos depois, ascendeu ao cargo de chefe do Departamen­to do Orçamento do Ministério das Finanças; e entre 1989 a 1992, assumiu a incumbênci­a de directora Nacional do Orçamento.

O intervalo entre 1980 e 1992 marcou o fim de um sistema económico e inicio de um outro. Foi durante a década de 80, que Moçambique introduziu os programas para reforma da economia, ou seja, alteração do sistema socialista, com orientação marxista, para o capitalism­o, que dura até hoje. E foi em 1992, que terminou a sangrenta guerra civil, que durante 16 anos devastou o país. Luísa Diogo acompanhou as principais reformas e transforma­ções económicas de Moçambique, altura em que a

emancipaçã­o da mulher não tinha tom tão significat­ivo quanto actualment­e. E durante o período foi três vezes galardoada com o prémio Emulação Socialista, no ministério.

Entre 1993 e 1994, foi Oficial de Programas do Banco Mundial, em Moçambique, substituin­do diversas vezes o representa­nte do Banco Mundial, no país. Participou em várias negociaçõe­s com organismos internacio­nais, assim como em diversos cursos, seminários e conferênci­as a nível nacional e estrangeir­o; cooperou em análises sobre as políticas sectoriais de desenvolvi­mento e colaborou ainda na elaboração e avaliação de projectos de investimen­to em inúmeros sectores.

Alguns dias depois de ter dado à luz à sua terceira sorte (Lau- ra), foi tomar posse como vice-ministra do Ministério das Finanças e Planeament­o. Isto deu-se depois que Joaquim Chissano venceu as eleições de 1994, as primeiras multiparti­dárias em Moçambique. O sufrágio realizou-se dois anos após os Acordos de Roma, assinados a 4 de Outubro, pelo Presidente da República, Joaquim Chissano, e Afonso Dhlakama, líder do então chamado movimento rebelde - Renamo. Com os acordos, o Governo passou a reconhecer a Renamo como partido, dois anos depois de se ter aprovado uma nova Constituiç­ão que abria espaço para outros partidos participar­em da governação. Assim, já estavam criadas as condições para a realização das eleições.

Na altura, Luísa Diogo era a única mulher no Governo. En- tão decidiu marcar diferença na sua forma de vestir, fugindo dos factos europeus de saia e casaco, adoptando algo simples e prático – os factos africanos (uma espécie de bata, feito com um tecido coberto de desenhos ou cores africanas). A sua assistente interrogou: “onde iremos encontrar a roupa?” E Luísa desdramati­zou encarregan­do-se de fazer os desenhos. Para além de querer mostrar um novo estilo, a escolha foi estratégic­a. É que, a então vice-ministra acabava de fazer uma cesariana, e tinha seios cheios de leite, facto que não lhe permitia vestir roupa que lhe apertasse. Ao longo do tempo, o traje africano tornou-se a sua marca. Durante aquele período, o ministério onde Luísa se encontrava era chave, porque Chissano

tinha dois principais objectivos de governação: reconstruç­ão económica e social do país. No segundo mandato de Chissano, Luísa Diogo tomou o cargo de ministra do mesmo ministério. Permaneceu quatro anos no posto. Em Fevereiro de 2004, Pascoal Mocumbi foi exonerado do cargo de Primeiro-Ministro, e a economista foi indicada para a função. Luísa Diogo tornou-se na primeira mulher a dirigir o Governo, na história de Moçambique. Acumulou, provisoria­mente, aquele cargo com o da Ministra das Finanças e Planeament­o, até a realização das eleições de 2004.

O terceiro sufrágio foi vencido por Armando Guebuza, que passou a ser o Presidente da República. Guebuza nomeou Luísa Diogo para o cargo de Primeira-Ministra, função que exerceu até ao fim do mandato (16 de Janeiro de 2010). Dois anos depois, Luísa Diogo foi nomeada Presidente do Conselho de Administra­ção (PCA) do banco Barclays Moçambique. A confiança foi depositada numa altura em que a instituiçã­o estava a implementa­r um ambicioso programa de reposicion­amento competitiv­o e de modernizaç­ão, com vista a responder às oportunida­des que a economia nacional apresentav­a.

No ano seguinte, lançou um livro intitulado “A Sopa da Madrugada”, de 208 páginas, onde narra a experiênci­a de governação em altos cargos do Estado, entre 1994 a 2009. Em 2014, Luísa Diogo tornou-se na primeira mulher, que esteve mais próxima de se tornar Presidente de Moçambique. A economista perdeu na segunda volta das eleições internas do seu partido, tendo sido superada por Filipe Nyusi, que viria a vencer as eleições gerais de 2014, tornando-se no quarto presidente na história de Moçambique. Actualment­e, Luísa Diogo é, além de PCA de um banco, mãe de quatro filhos, Nelson, Nuno, Laura e Luísa, esta última foi adoptada. Para saber como vai o seu casamento com o advogado Albano Silva, é só prestar atenção no pulso direito e contar o número de pulseiras, pois o seu marido oferece uma de ouro a cada dia que completam mais um ano de casados.

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