A Nossa Prima

NUNO LOPES

-

Sempre gostei de fotografia, enquanto observador, mas o verdadeiro interesse surge quando começo a trabalhar em cinema e percebo a importânci­a do enquadrame­nto e, sobretudo, do ponto de vista de quem aponta uma câmara. Nesse sentido foi um processo, que começa com o Alice, de Marco Martins, o primeiro filme que fiz enquanto protagonis­ta, em 2004, e que depois se agravou mais recentemen­te com o Mal Viver, em que propus ao João Canijo fazer um fotógrafo, em parte porque queria explorar este universo.

Tem sido uma autoaprend­izagem, por tentativa e erro, com a ajuda de alguns amigos que me vão dando umas dicas. Em concertos ou DJ set, à noite, uso uma câmara digital. É uma fotografia mais jornalísti­ca, no sentido em que regista um momento que aconteceu, ao passo que a analógica tem algo de mais profundo, como se fosse um desenho da história. Além disso, a surpresa é maior. É um salto de fé: fotografas e acreditas que ficou bem, só uma semana ou duas depois é que percebes se ficou bem, se ficou pior ou se melhor do que julgavas. Muitas vezes, surpreendo-me com o resultado. Gravei há pouco tempo um filme na Amazónia, e achei que, estando numa floresta, teria de fotografar a cores. Prefiro mil vezes as fotos a preto e branco que fiz.

Fazer fotografia­s de backstage ajuda-me a estar dentro da energia do filme e, até, a ter um lado criativo. Ultimament­e, embora continue a ser um amador, a fotografia acaba por fazer parte da minha vida. É uma parte fundamenta­l.

Sempre encarei isto como uma maneira de me divertir e de passar o tempo, como escrever um diário visual de coisas que acho interessan­tes. Uma vez, estava a gravar um filme e às cinco da manhã começou a cair um nevão enorme. Saí para a rua e comecei a fotografar. Ao fim de uma hora e meia, encontro um tipo que vem ter comigo e diz: “Ah, também és fotógrafo.” Respondi-lhe que estava só a tirar umas fotos porque achei bonito. “Espera, saíste de casa com menos cinco graus, estás há uma hora e tal a fotografar na rua e não és fotógrafo?”

A Diane Harbus [fotógrafa e escritora americana] tem uma frase que eu adoro: “A fotografia é um segredo sobre um segredo, quanto mais te conta, menos sabes.” Acho que as fotografia­s de backstage dos filmes têm essa componente. São sobre um lado secreto, porque é o que não vemos, mas, ao mesmo tempo, contam muito pouco. Valem por si próprias e, às vezes, não têm sequer a ver com o filme. São um momento e a maneira como eu olhei para esse momento.

ATOR E DJ FOI NOS BASTIDORES DE ALICE, FILME DE MARCO MARTINS, QUE SE INTERESSOU PELA FOTOGRAFIA E NUNCA MAIS PAROU. VER AS REVELAÇÕES, DIAS DEPOIS, É COMO O DIA DE NATAL

 ?? ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal