Correio da Manha - Boa Onda

Em miúdo diziam- me: “És maluco, puto. Vai mas é estudar. Não te metas nisto de ser ator”

VEMO- LO NO PEQUENO ECRÃ NUMA SERIE DE ÉPOCAAPLAU­DIDA DO CANAL PÚBLICO, MAS O ATOR – E FILHO DE ATOR – TEVE UM BOM ANO DE 2018 EM TELEVISÃO. 2019 COMEÇA BEM, MAS, PARAJÁ, SÓ COM TEATRO

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AFONSO LAGARTO DÁ ROSTO A MANUEL TENGARRINH­A na série ‘ Três Mulheres’. À Sexta, fala desse e de outros papéis, da sua relação com o teatro, e de como é ser filho do ator João Lagarto. Em ‘ Três Mulheres’, dá corpo a Manuel T eng ar rinha ( 1932- 2018). Como surgiu este trabalho?

Fui fazer casting para interpreta­r o Vasco Abecassis, marido da Snu. Passados uns dias o Fernando [ Vendrell, realizador] chamou- me a dizer que tinha gostado do meu casting, mas que não era para aquele papel. Ofereceu- me o de Manuel Tengarrinh­a, o que para mim foi ainda melhor.

TENTÁMOS RETRATAR A RELAÇÃO DE TENGARRINH­A COM A MARIA ARMANDA DE UMA FORMA BONITA

E POÉTICA

Conheceu- o pessoalmen­te? Não. Ele chegou a falar com o Fernando, ma sé delicado. Quando se fazem série sou filmes sobre pessoa sr e ai sé sempre difícil. Por um lado é uma grande homenagem, mas poroutroéi­n evitável que a pessoa se sinta vasculhada. O que conheço é alguns membros da família dele...

Por exemplo?

A Maria Tengarrinh­a, que é sobrinha- neta dele. E o filho dele, também falámos.

Foi difícil imitar- lhe os trejeitos, a maneira de falar? Descobri muitos vídeos dele. Houve um, sobretudo, que estudei profundame­nte. É um vídeo que está disponível no You- Tube, da saída dos presos de Caxias, na manhã a seguir ao 25 de Abril. O Tengarrinh­a é um dos entrevista­dos. Detetei- lhe um bocadinho de sotaque algarvio. Os meus avós também são do Algarve. Aliás, a minha família e a dele conhecem- se de Portimão... E houve também uma entrevista que ele deuàAn aS ousa Dias, na RTP2, que me ajudou muito. Acompanha a série?

Ao contrário do que dizem muitos colegas, eu gosto de me ver. Por um bocadinho de vaidade, assumo, mas também porque acho que é importante para o meu trabalho. Tentar perceber como é que aquilo resulta, na sua forma final.

‘ A música começou a brincar mas tornou- se algo sério”

O ator Afonso Lagarto também é conhecido como músico. Em miúdo aprendeu a tocar vários instrument­os, e em 2011 fundou a banda Brass Wires Orchestra, com a qual já editou dois álbuns de originais – ‘ Icarus’ e ‘ Cornerston­e’. No grupo, Afonso toca banjo e guitarra, mas também canta. Diz que é uma das coisas que o faz sentirse realizado. “A música começou a brincar mas acabou por se tornar algo sério. Embora estejamos neste momento um bocadinho parados, numa espécie de pausa, não acredito que o projeto vá parar. Temos muito para dar.”

A série tem sido muito elogiada, pela qualidade, mas tem tido audiências fracas. Isso desilude- o?

Não tenho noção disso. Sei que houve um ou dois episódios que tiveram muita audiência. Tenho pena que a malta mais nova não se identifiqu­e com o tema e não se interesse por esta parte da nossa história. O feedback positivo que tenho recebido tem sido de pessoas de meia- idade.

No ano passado esteve muito ocupado com projetos televisivo­s?

Sim. Além de ‘ Três Mulheres’ fiz o ‘ Circo Paraíso’, outra série fora do comum, que me agradou muito fazer.

E há projetos para este ano? Para já não. Estou concentrad­o no teatro. Já não fazia nada tão bom há muito tempo: estou no Teatro da Politécnic­a com a peça ‘ Os Al i en s ’, d a An n i e Baker, dirigido pelo Pedro Carraca. A autora é jovem mas já a comparam ao Tchékov. Segue a vida de dois jovens adultos que se consideram génios mas gastam os seus dias a falar, num café. A sonhar.

Como e quando fez a sua estreia profission­al em teatro? Quando saí do Conservató­rio, em 2009, fiz uma peça com dois colegas da escola, encenada pelo meu pai [ João Lagart o ] . U m t e x t o d o S a m u e l Beckett, ‘ Mercier e Camier’, que apresentám­os na Sala Estúdio do Trindade.

Foi bom ser dirigido pelo próprio pai?

Foi ótimo. Ele adora Beckett e precisava de malta nova para fazer aquele texto. Antes disso j á tinha trabalhado com ele duas vezes: ‘ Ensaios para Rá- dio’, do Beckett; e ‘ Blue’, a partir de uns textos de David Mamet. Diria que é ator por influência paterna?

Em casa tínhamos conversas sobre teatro, é um facto, mas em miúdo não pensava nisso. Só a partir de determinad­a altura é que percebi que gostaria de tentar ser ator.

A partir de que altura?

Desde que comecei a ir com o meu pai para o teatro.

Houve alguma peça marcante? Um momento especial? Sim. Há muito tempo, o meu pai fez, no Teatro Aberto, ‘ O Tempo e o Quarto’, com a Alexandra Lencastre, o Canto e Castro, a Eunice Muñoz... Eu ia com ele e, com oito anos, tive oportunida­de de ver o espetáculo de todos os ângulos. Dos bastidores à plateia, passando pelo lugar do ponto... Vi como se fazia fumo, como se fazia trovoada. Foi nessa altura que me apaixonei pelo teatro.

O seu pai nunca tentou encaminhá- lo para o teatro?

Não. Assim como ta mbém nunca me tentou dissuadir de

A PRIMEIRA

VEZ QUE ME CANDIDATEI AO CONSERVATÓ­RIO NÃO ENTREI. AINDA BEM.

ERA DEMASIADO NOVO. FUI

FAZER A ACT HÁ MUITA GENTE QUE DESISTIU. TINHA TALENTO MAS NÃO

TINHA O ESTOFO EMOCIONAL NECESSÁRIO PARA AGUENTAR A PRESSÃO

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