Correio da Manha - Boa Onda

Entre a grandeza e o preconceit­o

- POR MIGUEL AZEVEDO JORNALISTA

Há uns anos, Martinho da Vila dizia-me que grande parte do Brasil olhava para Roberto Leal como a grande bandeira de Portugal, muito mais até do que Amália Rodrigues. O seu sucesso por lá, de resto, foi tão grande, que um dia a própria diva do fado virou-se para ele e disse-lhe: “Roberto, tu és a vingança dos portuguese­s no Brasil”. Foi, precisamen­te, num jardim em Lisboa com o nome de Amália que me encontrei com Roberto Leal numa das últimas vezes que o entreviste­i. A conversa levou-nos às suas origens, à casa humilde onde crescera, à fome que passara, aos pais e aos irmãos. A determinad­a altura pediu-me para parar a entrevista para chorar e disse-me: “Sabes, com o tempo acabei por descobrir que a pobreza foi a minha maior riqueza”. Lembrei-me dessas palavras quando, no domingo, soube da sua morte. Lembrei-me também de como a grandeza dele no Brasil era desconheci­da por cá, de como, na primeira vez que se apresentou na televisão brasileira, ninguém sabia como se dançava essa coisa chamada ‘vira’. A verdade é que enquanto o grande Chacrinha lhe perguntava se ele era gay por causa dos cabelos loiros, um professor de canto dizia-lhe que ele tinha tudo para vir a ser o Roberto Carlos de Portugal. Por cá, no entanto, o nome de Roberto Leal esbarrou ao longo de quase 50 anos no preconceit­o.“Eu sei que tenho uma imagem e um rótulo que não é fácil de mudar”, dizia-me ele quando participou no programa ‘O Último a Sair’. E lembro-me especialme­nte do dia em que o filho, Rodrigo, me ligou para me contar que tinha uma banda de heavy metal, e me pediu para não divulgar quem estava por detrás dela por causa do estigma que tinha, em Portugal, o apelido Leal.

ROBERTO PEDIU-ME PARA PARAR A ENTREVISTA PARA CHORAR

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