Ela não é filha do fado, e então?
Quis o destino (não o fado, até porque o fado ainda estava longe de entrar na história) que uma missão militar do pai a fizesse viajar para Macau aos nove anos. Matilde Cid esteve por lá seis anos e quando regressou vinha com a mania dos karaokes, com Whitney Houston e Mariah Carey à cabeça da lista. Só que de um dia para o outro ouviu Maria Teresa Noronha e tudo mudou. É verdade que ‘Rosa Enjeitada’ não era propriamente o fado ideal para uma menina de 15 anos, mas o facto é que Matilde também não era uma menina como qualquer outra e assim ‘cedeu’ aos versos ‘Que vida triste e chorada/ O teu destino te deu’; ‘Rosa enjeitada/ Uma mulher que sofreu’, ‘Sem mãe, sem pão, sem ter nada’. Ainda andou por ali, a tentar esconder o que sentia, mexida por dentro é certo, mas receosa das avaliações dos outros (“Eu não sou filha do fado, cheguei a ele já muito tarde”, justifica), e durante muito tempo até escondeu numa gaveta aquilo que escrevia, mas um dia o inevitável aconteceu: o fado tomou o lugar que ela teimava em dar-lhe. Deixou o escritório onde trabalhava e deixou também de tratar o fado “com pinças e pezinhos de lã”, como diz. Entretanto, Matilde Cid (sim o apelido, originário de Viseu, deverá conferir-lhe algum grau de parentesco a José Cid, pelo lado do pai), gravou o disco de estreia ‘Puro’ (depois de muitos anos a dizer que não), como forma de extravasar as inquietações e inseguranças. ‘Puro’ é isso mesmo, emoção pura em estado bruto, a mesmo emoção que se ouvia em Amália Rodrigues, Maria Teresa Noronha, Hermínia Silva ou Lucília do Carmo. “A emoção é o ingrediente essencial do fado, caso contrário isto não sabia a nada”, remata.
DEIXOU DE TRATAR O FADO COM “PINÇAS E PEZINHOS DE LÔ