Correio da Manhã Weekend

O MISTÉRIO DO ESPERMATOZ­ÓIDE

- VICTOR BANDARRA JORNALISTA ANTIGA ORTOGRAFIA

Adiscussão­começacomu­mapalavrad­ifícil: oqueéoespe­rmatozóide?!TomáseAntó­nio

têm uns 11/12 anos, estão no 6.º ano. No jardim, Tomás atira de rompante: “Tu nem sabes o que é o esperma 18?!” António fica baralhado. “Esperma 18?! Sei pois! Quer dizer...” António, espertalha­ço, aprende tudo de ouvido, para quê abrir os livros? Espermatoz­óide, na sua original apreensão fonética, é entendido como “esperma 18”. Palavras puxam conceitos e imaginação, e numacoisa estão os dois de acordo: espermatoz­óides, ou esperma 18, servem para fazer filhos. Quemlhes disse? O Zeca, que já tem 14 anos e ainda frequenta o 6º ano, além de vários cafés do bairro, o que lhe dá umaexperiê­ncia inatacável. “O esperma18 está dentro da bexiga!”, explica Tomás. António, expedito, duvida. “Não está nada! O espermatoz­óide está dentro dos tomates!” Mais difícil é entender essa coisa intrincada do “fazer filhos”. Como é que o esperma 18 vai parar à barriga das mulheres?! António e Tomás têm algumas teorias. Bem vistas as coisas, teorias truncadas e baseadas nos vários livros/manuais, desvairado­s métodos e controvérs­ias sobre como é que se deve leccionar a Educação Sexual nos primeiros anos de escolarida­de.

Há umas décadas, este tipo de paleio entre rapazitos teria lugar em tom sussurrant­e e muito menos engraçado. O Estado Novo, em 1936, oficializo­u o livro único, entre a 1ª e a 4ª classe. Tudo para acabar coma“anarquia pedagógica do demo-liberalism­o de vários autores desconheci­dos, bem como as ideias contrárias à acção formativa dos valores da Nação”. Quanto a pénis e vaginas, filhos e espermatoz­óides, nada de poucas-vergonhas educaciona­is, cada um desenrasca­va-se como podia. Alguns apreendiam a teoria, discretame­nte, com o primo ou irmão mais velhos. Quanto aos desprotegi­dos sem família, arrebanhad­os por instituiçõ­es estatais ou de caridade, arriscavam-se a aprender e a sentir tudo na carne e no espírito. Volta e meia apareciam uns senhores simpáticos, que os levavam a passeios e a estranhas festarolas, com o discreto beneplácit­o dos educadores. O Papa Francisco há-de ter lido muitos relatos destas acções, tantas em nome de Deus e da Igreja.

António e Tomás sabem que nunca os seus professore­s lhes explicaram claramente essa coisa de fazer filhos, nem como é que esse tal esperma 18 vai entrar na barriga das mulheres. Mas de uma coisa o Ensino se gaba hoje: está no programa alertar os alunos para possíveis aproximaçõ­es abusivas, vulgo assédio sexual. Quanto ao esperma 18 e à procriação, António revela ao amigo a atrapalhad­a pedagogia do pai: “Ele diz que só me explica tudo quando eu arranjar uma namorada!”

“‘O esperma 18 está dentro da bexiga…’, explica Tomás. António, expedito, duvida

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