Turismo de massa
Com grande fanfarra, Elon Musk anunciou o nome do primeiro turista espacial que vai levar à Lua. Trata-se do japonês Yusaku Maezawa, o 14º homem mais rico da mundo e, em breve, o mais rico fora do mundo. O bilhete custará vários milhões de dólares. É o chamado turismo de massa. (Que já começa a fazer sentir o seu impacto daninho na desertificação: a viagem ainda é um projecto e já a Lua não tem habitantes).
Achei a pompa do anúncio despropositada. É injusto aplaudir-se o turista japonês pela audácia de se meter num foguetão para ir à Lua, mas deixar sem menção a bravura do turista português anónimo que, no dia 1 de Agosto, enfia a mulher, três filhos, sogra e cão num Fiat Uno com 23 anos e ar condicionado recalcitrante, para se aventurar na A2 rumo ao Algarve. Com a dificuldade acrescida de, ao chegar, não ter ajuda da gravidade zero para carregar as malas para o T1 num terceiro andar sem elevador, vista semi-mar (jargão Airbnb quando, pela janela, se vêem reflexos do mar nas janelas dos carros estacionados ao fundo da rua).
Por enquanto, não se sabe quem viajará com Maezawa. O japonês comprou todos os lugares e ainda não escolheu os companheiros. Disse apenas que serão artistas. Não sei se será boa ideia. Os artistas são rebeldes, inconformistas, espíritos livres que desprezam as convenções sociais burguesas, nomeadamente, o banho. É muito giro conversar com artistas numa vernissage ao ar livre; outra coisa é estar uma semana fechado com eles num contentor, sem poder abrir a janela para arejar. Lá por ser cheiro a sovaco artístico, ainda assim é cheiro a sovaco.
É preciso escolher com cautela. A viagem é longa, vai haver muitos momentos entediantes e não há hipótese de se entreterem jogando às matrículas. Convém que haja afinidades. Sobretudo, em termos musicais. Por mais intelectuais que os artistas sejam, vai haver alguém que só quer passar Shakira.
Vai ser difícil ocupar tanta gente durante tanto tempo. Maezawa podia convidar um guia turístico para distrair os passageiros. Mas também só dava para cinco minutos. “À vossa direita temos o espaço sideral. À vossa esquerda, também. Em cima, idem. Bom, é muito isto. E se cantássemos? ‘Condutor, por favor, ponha o pé no propulsor…’”
Mais importante, há que contar com a viagem de regresso. À ida, o entusiasmo faz com que os artistas se tolerem uns aos outros. “Vamos para a Lua, aturo bem as 187 horas que levas a lamuriar
-te da falta de subsídios para a tua curta-metragem sobre jardineiros albinos do Peru.” A volta é que é pior. Ao perceber que perdeu tempo a visitar o que, basicamente, é um baldio espacial que foi intervencionado pelo Vhils, há um artista que vai perder a cabeça. Nessa altura, Maezawa vai descobrir que pagou um balúrdio para participar num Big Brother no espaço. Espero que filmem.
MAEZAWA VAI
DESCOBRIR QUE
PAGOU UM BALÚRDIO PARA PARTICIPAR NUM BIG BROTHER NO
ESPAÇO