O meio do ano
Hoje, 15 de junho, é o meio do ano. Eu não fazia ideia, foi um poeta que mo lembrou. Os poetas são como aquela peça extra num canivete suíço: um dia descobrimos para o que servem. O Ricardo Marques aqui deu-me um jeitão. E estando nós no centro do ano, haverá melhor altura para fazer um balanço?
Guterres foi capa da revista ‘Time’, apareceu com ar sério e água pelos joelhos, por causa do aquecimento global e dos crescentes degelos. Para quem não sabe, ser capa da ‘Time’ é honra maior que ganhar o Nobel. Há vinte anos escrevi um conto chamado ‘Amanhã chegam as águas’ que aventava a hipótese de, num futuro distante, Portugal estar submerso até à Covilhã e de nos terem crescido guelras. Pensava ter escrito ficção científica: afinal estava a escrever os discursos do secretário-geral da ONU.
Fernando Santos guiou a Seleção a mais um troféu. A Liga não será ainda o Euro ou o Mundial, mas qualquer país teria ficado contente em ganhá-la. Fomos nós, na véspera do 10 de junho, grande pinta. Confirmou-se a mudança de paradigma: já não vamos para competição alguma a medo, derrotados à partida. Isso faz toda a diferença. Podemos perder, e vamos perder muitas vezes, umas injustamente, outras justamente, mas já não somos os coitadinhos.
Pelo terceiro ano consecutivo fomos considerados Melhor Destino Turístico Europeu. Antes queixávamo-nos de ser ignorados; éramos felizes e não sabíamos.
Somos também o terceiro país mais pacífico do mundo. Não é um troféu do qual nos queiramos gabar, até porque destruir é fácil, mas temos tido algum mérito e alguma sorte. Até nos sítios onde os nossos soldados fazem, arma
dos, ações de paz: há umas semanas houve forte troca de tiros na República Centro-Africana, sem baixas. Agora um soldado está em estado grave, mas por um ‘acidente de viação’. Esses, os ‘acidentes de viação’ continuam: aí não somos ainda campeões de nada. Na estrada, continuamos a ser um povo desnecessariamente agressivo, violento, irresponsável. Só que lá diz o provérbio: olhos não veem, coração não sente.
Talvez haja uma solução. Quando alguém puser um carro no passeio, deixe um papel a dizer: “Tire daqui a trotineta, as pessoas querem passar.” E, quando um condutor for distraído, gritar-lhe: “Seu ciclista!”
Aqui fica a proposta.
PARA QUEM NÃO
SABE, SER CAPA DA ‘TIME’ É
HONRA MAIOR QUE GANHAR O NOBEL JÁ NÃO VAMOS
PARA COMPETIÇÃO
ALGUMA
A MEDO, DERROTADOS À PARTIDA. ISSO FAZ TODA A DIFERENÇA