Um assassino deve dormir descansado?
CASOS DE HOMICÍDIO
QUALIFICADO NÃO DEVEM PRESCREVER. POR MAIS
QUE SEJA TARDE, A JUSTIÇA DEVERÁ FAZER-SE
Aapaixonante notícia de que o CM fez manchete na passada sexta-feira – “Coronel Morto em Sabotagem” - convoca-nos para uma reflexão sobre os prazos de prescrição dos crimes mais graves. E obriga a uma pergunta: o que deve prevalecer, entre a segurança jurídica que a prescrição visa defender e o direito à justiça de que os familiares da vítima e a comunidade, naturalmente, não podem abdicar?
Segundo a notícia em apreço, um sargento da Força Aérea, à data dos factos, veio agora denunciar que o acidente de que resultou uma morte foi motivado por sabotagem.
Ramiro Santos, coronel, tinha 51 anos quando morreu, a 10 de dezembro de 2004. Deixou dois filhos órfãos. A reabertura do processo de investigação já levou à constituição de arguido do responsável pela peritagem ao avião despenhado nas Azenhas do Mar, Sintra. Com os atuais prazos de prescrição, após 10 de dezembro de
2024, alguém responsável pela alegada sabotagem poderá passear-se pelas ruas em total impunidade com um letreiro a confessar o crime.
Será um prazo de vinte anos adequado e justo para defesa dos interesses em conflito num homicídio qualificado? O que dirá o Estado à família de uma vítima num caso em que se descubra o assassino após o prazo de prescrição?
Os atuais prazos de prescrição no homicídio qualificado são um convite às vinganças privadas e uma demonstração de desprezo pelas vítimas.
Os casos de homicídio qualificado não devem prescrever. Nestas situações de crime contra a vida, por mais que tarde, a justiça deverá fazer-se. O que defende o instituto de prescrição? A segurança técnica na aplicação da justiça e a possibilidade, até para criminosos, de todos se saberem livres de acusação para melhor seguir com a vida.
Se estes valores são relevantes e prevalecentes em casos da prática de crimes menores, nos casos de homicídio, não podem sobrepor-se aos direitos dos familiares das vítimas. Nem sobre o sentido de justiça que habita cada cidadão. Importa que, numa próxima revisão das normas penais, o Estado reconheça que nenhum homicida merece dormir descansado enquanto não pagar pelo seu crime.n