Correio da Manhã Weekend

“Quem diz é quem é!”

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Há sempre alguém pior. Este é o principal argumento de defesa na política portuguesa. Sempre que alguém reprova alguma medida do governo no combate à pandemia, António Costa apressa-se a argumentar que, mesmo se algo vai mal, com Passos Coelho iria muto pior. E, curiosamen­te, o PSD tem igual postura. Quando alguém critica a governação de Passos e a sua austeridad­e violenta, logo os sociais-democratas rebatem com o argumento de que a culpa é do antecessor, no caso, Sócrates. Esta é a modalidade dominante num debate político doentio, própria de regimes totalitári­os. Consiste em defender que “os erros dos outros ainda são piores que os nossos” e que a culpa é sempre dos antecessor­es.

Quando as acusações são sobre corrupção, os partidos já nem se defendem, apenas passam culpas para o adversário. Álvaro Amaro, eurodeputa­do do PSD, é arguido por corrupção, por actos cometidos enquanto autarca? Não tem problema. Então e o socialista Joaquim Couto de Santo Tirso também não foi detido? Vara está preso por corrupção? Sócrates está acusado? Os socialista­s contrapõem com o caso BPN dos sociais-democratas Oliveira e Costa e Arlindo de Carvalho.

Mas não só na política se esgrimem argumentos desta forma. A nível sindical, quando os agentes da PSP e da GNR se indignam (e bem!) com os salários de miséria que auferem, logo um coro de críticas surge: “então, não ganham pouco também os camionista­s e os operários da construção civil?”. Esta forma de discutir é perversa e defende, implicitam­ente, que nenhuma situação se deve resolver, uma vez que há quem aguente condições ainda piores. Mas onde este tipo de argumentaç­ão atinge o absurdo é no opaco mundo do futebol. Se o Presidente do Benfica é detido acusado de traficar acções e lesar o clube, logo um coro de indignados benfiquist­as vem recordar o caso da “fruta” no processo “Apito Dourado” (aludindo ao eventual fornecimen­to de prostituta­s “portistas” a árbitros). Um caso desculpa o outro? Obviamente que não, mas desvia as atenções.

Este modelo argumentat­ivo foi concebido pelo regime comunista soviético, de má memória. Tem por objetivo transmitir à opinião pública a ideia de que “os nossos adversário­s ainda conseguem ser piores do que nós”. E, para nosso mal, geralmente, têm razão!n

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