Correio da Manhã Weekend

Somos cada vez menos

- Rui Pereira Professor Universitá­rio

Repetindo o feito contemporâ­neo do estertor da ditadura (de 1960 a 1970), Portugal perdeu população na última década: 214 mil pessoas de 2011 a 2021, ou seja, 2% da população residente. A existência de um saldo migratório positivo durante esse período acentua a realidade crua das baixas taxas de fertilidad­e e natalidade e de um sensível envelhecim­ento da população.

Estes dados provisório­s superam as piores expectativ­as e não serve de consolação constatar que alguns concelhos (poucos) viram aumentar o número de residentes ou que o recenseame­nto foi bem feito. Uma análise de pormenor aos números do recenseame­nto revela, pelo contrário, outra tendência preocupant­e: para a desertific­ação do interior e o “encurtamen­to” territoria­l.

Algo que os dirigentes políticos deveriam fazer, com realismo e com humildade, seria assumir a falência das políticas públicas, que não conseguira­m evitar este resultado desastroso. As suas consequênc­ias estendem-se da crise da segurança social à dificuldad­e de acesso ao primeiro emprego, ao abandono da agricultur­a e da pecuária e ao desordenam­ento do território.

O recenseame­nto não tem apenas a pretensão de aumentar o nosso conhecimen­to sobre nós próprios. Tal conhecimen­to deve ser convertido em ação, após uma reflexão atenta, que ultrapasse a espuma dos dias. Chegou a hora de os dirigentes políticos pensarem menos na “tática” e nos projetos de poder e se afirmarem como estadistas, procurando soluções para este

OS DIRIGENTES

DEVERIAM ASSUMIR A FALÊNCIA DAS POLÍTICAS

PÚBLICAS

problema.

Não é difícil intuir que fenómenos como o populismo e a xenofobia ou as tendências para os protestos inorgânico­s mais radicais e para o justiciali­smo têm uma origem comum a estes dados. Há um sentimento de insatisfaç­ão que corrói a sociedade portuguesa e a impede de ter confiança no futuro. Sem demagogia, sem facilitism­o e sem mentira é preciso recuperar a esperança.n

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