Uma equipa de investigação da Universidade
Projeto do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3S) recolhe amostras de ADN em vários pontos do Mundo
do Porto está a recolher amostras de ADN em vários pontos do Mundo para descobrir a herança genética dos marinheiros de Magalhães na primeira viagem de circum-navegação
Uma simples amostra de salivava i revelar comoé que a primeira viagemà volta do Mundo – que levou os tripulantes da expedição de Fernão de Magalhães, oriundos da bacia do Mediterrâneo, a contactar, há 500 anos, com povos de outros continentes está na base da diversidade humana e das misturas populacionais que foram acontecendo ao longo dos séculos. Este é um dos projetos em curso no Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3S ), da Universidade do Porto, liderado pela investigadora Luísa Pereira. A amostra de saliva dá-nos informação sobre o ADN (ácido desox ir ribonucleico ), molécula que constitui uma autêntica impressão digital genética e nos dá pistas sobre os nossos antepassados.
Com um financiamento de 300 mil euros da Fundação para a Ciência e Tecnologia, no âmbito das comemorações dos 500 anos da primeira viagem à volta do Mundo, o projeto ‘Diversidade Humana no espaço, genética, história e cultura da circum-navegação de Magalhães’ começou em julho do ano passado e vai prolongar-se por três anos. “A viagem de Fernão de Magalhães foi um momento único que tocou alguns pontos que nunca tinham sido vistos por ocidentais, como a Patagónia. Todas as misturas de populações que foram acontecendo foram aceleradíssimas a partir dessa altura”, refere a investigadora.
A ideia é estudar a genética das populações, através da recolha de amostras de saliva, que contém ADN, e identificar características fenotípicas como a cor da pele, dos olhos e do cabelo e também o peso. Os investigadores vão seguir a rota - não a vão fazer fisicamente porque têm colaboradores em vários pontos do Mundo - e recolher amostras em Portugal, que representa a tripulação, Brasil, Patagónia, duas ilhas na indonésia, duas ilhas nas Filipinas, Timor e Cabo Verde.
O projeto foi atrasado devido à Covid-19 - começou em julho de 2020 e está numa fase de recolha de autorizações éticas em todos os locais. Envolve equipas de outras áreas que vão estudar, por exemplo, os documentos históricos relacionados com a viagem e que façam a descrição das populações, como o diário do italiano Antonio Pigafetta, o cronista da primeira volta ao Mundo.
“Vamos seguir a rota de Magalhães, ver onde eles pararam, vamos colher amostras de populações mais isoladas como, por exemplo, no Brasil, onde ainda há populações indígenas que se mantiveram mais homogéneas, não se misturaram tanto e representam melhor o que a tripulação encontrou há 500 anos. E vamos ver populações mais urbanas, que mostrem todas as misturas que aconteceram nos últimos cinco séculos. ”Luísa Pereira é especialista em genética populacional humana, coautora do livro ‘O Património Genético Português’ e de inúmeros artigos científicos. O ADN é o seu mundo.
O que é o ADN?
O ADN, representado geralmente por uma hélice dupla, está presente em todas as células do corpo, que têm núcleo, dentro dos cromossomas. O conjunto do ADN de uma pessoa chama-se genoma - inclui toda a informação genética do indivíduo. Ora, o ADN é formado por unidades muito grandes e extensas que se representam por letras, constituindo um pequeno alfabeto, que os cientistas designam como o
É o material genético que contém o alfabeto da vida
LUÍSA PEREIRA, INVESTIGADORA
A informação daquilo que o indivíduo é está no genoma
LUÍSA PEREIRA, INVESTIGADORA
alfabeto da vida.
“O ADN é o material genético que contém este alfabeto e o alfabeto forma o texto que depois vai ser lido e nos caracteriza a todos. É ele que vai ser transmitido ao longo das gerações. A informação daquilo que o indivíduo é está contida no genoma e é essa informação que vai ser transmitida aos descendentes”, explica Luísa Pereira.
Como está em todas as células do corpo, o ADN pode ser recolhido no sangue, saliva, sémen, urina ou cabelos. Pode ser usado, por exemplo, para aferir a paternidade - o ADN de uma pessoa é constituído por metade do ADN da mãe e metade do ADN do pai.
Segundo a investigadora do i3S, “todas as células do nosso corpo que têm núcleo têm uma cópia inteira do genoma. Quando morremos, a maior parte dos tecidos é degradada, mas os ossos, que também são constituídos por células, podem preservares sa informação .” Porém, adianta, não se consegue retirar ADN de todas as ossadas. Por exemplo, se elas foram fossilizadas, o ADN está destruído. O calor também estraga o material biológico, tal como a mumificação. Ao invés, o gelo preserva-o: é disso exemplo ‘Ötzi, o Homem do Gelo’, a múmia congelada, com 5300 anos, encontrada em 1991, num glaciar alpino na fronteira montanhosa entre a Áustria e a Itália. O cadáver foi encontrado quase intacto e a análise ao ADN até permitiu determinar a composição da sua última refeição: carne seca de íbex, carne de veado e trigo. Ötzi tinha cerca de 40 anos e foi atingido por uma flecha nas costas, uma hora depois de comer.