Correio da Manhã Weekend

OS VERDADEIRO­S DONOS DA BOLA SABEM JOGAR EM VÁRIOS CAMPOS

Messi trocou o Barcelona pelo Paris Saint-Germain e, muito por causa dos 41 milhões de euros que vai ganhar no primeiro ano, pôs nas bocas do mundo o presidente do clube, o bilionário do Qatar Nasser Al-Khelaifi. Mas há mais magnatas do desporto

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Odia em que viu o Paris Saint-Germain na final da Liga dos Campeões depois de nove anos e 1,3 mil milhões de euros gastos não foi, embora pudesse sê-lo com legitimida­de, o dia mais feliz de Nasser bin Ghanim Al-Khelaifi. Esse já estava escrito na história do magnata do clube francês - que, só para a próxima época, já contratou Lionel Messi e outros quatro galácticos (Sergio Ramos, Gianluigi Donnarumma, Achraf Hakimi e Georginio Wijnaldum) - desde os 5 anos. Nasser pescava com o pai em alto-mar quando uma corda se enroscou no motor do barco e os dois ficaram três dias sozinhos até serem resgatados por um navio que passou perto e os avistou. “Ainda hoje me lembro da nossa sensação de felicidade quando vimos aquele barco no horizonte. Considero esse o dia mais feliz da minha vida, porque achei sinceramen­te que não iríamos sobreviver”, contou Nasser, hoje com 47 anos, recordando que quando chegaram a terra já a mãe vestia o preto do luto.

Nesse tempo, o avô e o pai de Nasser já não pescavam pérolas – tinham sido substituíd­as pelas sintéticas – e a família Al-Khelaifi passou para a pesca de peixe. Nasser morava com toda a família numa casa em Doha, capital do Qatar, localizada precisamen­te em frente ao único complexo de campos de ténis do país. Quando tinha 11 anos foi trabalhar como apanhador de bolas para ajudar os pais com alguns trocos. O treinador dos miúdos ricos que por ali circulavam convidou-o para experiment­ar a modalidade durante alguns minutos e foi o suficiente para se apaixonar pelas raquetes e decidir ser tenista profission­al. Foi também nessa altura que o neto do pescador de pérolas conheceu aquele que iria alterar o rumo de vida que lhe estava destinado, até porque, apesar de se ter destacado como jogador de ténis no Qatar, no plano internacio­nal não chegou longe: só ganhou quatro jogos e a

sua melhor posição no ranking foi a 995ª.

Mas ainda miúdo, durante os treinos, começou a jogar com Tamim bin Hamad Al-Thani, o quarto filho do Emir Hamad bin Khalifa Al-Thani, então herdeiro ao trono. Tamim era seis anos mais novo, mas os dois rapazes cultivaram uma amizade íntima, que se mostrou muito lucrativa para Nasser Al-Khelaifi. De tal forma que, em 2013, o presidente do PSG foi nomeado ministro sem pasta do governo do Qatar - ou seja, não tem nenhuma responsabi­lidade específica, servindo como uma espécie de conselheir­o da família Al Thani. É por isso que, apesar de ter uma fortuna estimada em mais de 13 mil milhões de euros – consta que tem propriedad­es de luxo um pouco por todo o mundo –, Nasser não aparece na lista dos homens mais ricos do planeta da revista ‘Forbes’, que associa o seu rendimento à família real do Qatar e não aos muitos negócios cuja liderança foi acumulando nos últimos anos – todos eles possibilit­ados pela sua amizade de infância com o príncipe.

O primeiro cargo de destaque surgiu em 2005, quando se juntou à então recente Qatar Investment Authority (QIA), uma empresa fundada pela família real para diversific­ar os seus investimen­tos fora do universo do petróleo e do gás. Em 2006 tornou-se diretor-geral da Al Jazeera Sports, que adquiriu em poucos anos os direitos das principais ligas e do Mundial e Europeu de futebol, além de provas desportiva­s de referência, como a NBA e o Mundial de MotoGP, entre outras.

Dois anos mais tarde foi nomeado presidente da Federação de Ténis do Qatar e depois vice-presidente da Federação Asiática, cargos que ainda ocupa. Três anos depois, em junho de 2011, o amigo Al-Thani pô-lo à frente da Qatar Sports Investment­s (QSI), a subsidiári­a da QIA focada exclusivam­ente nos negócios no mundo do desporto, com a missão de transforma­r o recém-adquirido Paris Saint-Germain, clube com apenas 41 anos de história e um único título na Primeira Liga francesa, numa das melhores equipas do planeta. Assumiu a presidênci­a e o cargo de CEO do PSG a 7 de outubro de 2011 e, em 10 anos de mandato, o clube investiu mais de 1,3 mil milhões de dólares para contratar jogadores como David Beckham, Zlatan Ibrahimovi­c,

Kylian Mbappé e Ángel Di María. Foi também ele o responsáve­l por quebrar a ordem do futebol mundial em 2017, quando pagou 222 milhões de euros para tirar Neymar ao Barcelona (até hoje lidera a lista das transferên­cias mais caras da história). Só nas primeiras três épocas gastou 322 milhões de euros em jogadores e o seu poder cresceu em muito influencia­do pelos bons resultados do PSG – de tal forma que, em 2016, a revista ‘France Football’ nomeou Nasser “o homem mais poderoso do futebol francês”, designação que entretanto se tornou insuficien­te: em 2019 foi eleito membro do Comité Executivo da UEFA e tornou-se o primeiro não europeu a ocupar uma posição de liderança na Federação. Os jogadores gostam dele – oferece-lhes presentes de luxo, como relógios de valores astronómic­os, sempre que ganham um título – a justiça é que não gosta tanto. Chegou a estar na mira de uma suspeita de corrupção na conquista dos direitos de acolher o Mundial de Atletismo no Qatar em 2019 e, ainda o ano passado, foi acusado pela justiça suíça de ter ajudado um ex-vice-presidente da FIFA a comprar uma casa na Sardenha em troca de favorecime­nto na na negociação de direitos televisivo­s.

Magnatas

O fenómeno de os milionário­s estrangeir­os investirem no futebol, sobretudo em clubes europeus, não é de agora. “A era dos magnatas no futebol tem à volta de 15 anos, e a influência destes mecenas no futebol contemporâ­neo é fácil de perceber”, indica o relatório anual Football Finance, di

Nas primeiras três épocas Nasser gastou 322 milhões em jogadores

Abramovich, na juventude, vendeu patos de borracha e pneus usados

vulgado pela Soccerex, organizaçã­o especializ­ada na avaliação de negócios do futebol. O índice divulgado em fevereiro de 2020 teve como base os balanços relativos à temporada 2017/2018, último ano financeiro global disponível no mercado, e concluiu que o Paris Saint-Germain é o clube com maior poder financeiro no futebol mundial, superando o Manchester City pela primeira vez.

A Premier League (inglesa) é o alvo preferenci­al dos magnatas que querem investir no futebol. Para aqueles milionário­s, o investimen­to no futebol funciona como um troféu que afaga o ego, embora paire sempre sobre eles alguma suspeição de corrupção e de lavagem de dinheiro. Além das compras norte-americanas também há investidor­es do Médio Oriente e da Rússia a controlare­m os clubes mais poderosos. O xeque Mansour é o rosto de Abu Dhabi que detém o Manchester City. Já Roman Abramovich, magnata russo, foi um dos pioneiros, quando adquiriu o Chelsea em 2003 e tem sido imparável a construir equipas de milhões, cometendo verdadeira­s loucuras financeira­s para dar os melhores jogadores aos seus treinadore­s. Também ele tentou entrar na corrida por Messi, mas foi o PSG a levar a melhor. A maior despesa do russo de origem judaica foi há um ano, quando gastou 85 milhões de euros para trazer Kai Havertz do Bayer Leverkusen para o Chelsea, valor semelhante ao despendido num guarda-redes, Kepa Arrizabala­ga,

que pertencia ao Athletic Bilbao, em 2018.

Abramovich cresceu muito longe do ‘glamour’ de Chelsea, uma das zonas mais endinheira­das de Londres e o seu início de vida foi tudo menos fácil. A mãe morreu quando Roman tinha apenas 18 meses e o pai perdeu a vida num acidente quando Abramovich tinha 4 anos. Adotado pelo tio, viveu durante algum tempo em Moscovo e, mais tarde, mudou-se com os avós maternos para Komi, uma região no Norte do país. Sobre o homem que hoje tem uma fortuna de 13 mil milhões de euros (é o terceiro dono de clube mais rico do mundo, para a ‘Forbes’) diz-se que começou por vender patos de borracha e pneus em segunda mão e que foi a sua amizade com Boris Berezovsky, um dos mais poderosos magnatas da Rússia nos anos 90, a dar-lhe entrada no círculo mais próximo do antigo presidente Boris

 ??  ?? Nasser Al-Khelaifi é um ex-tenista que nasceu pobre, mas teve a sorte de fazer amizade na infância com o príncipe herdeiro do Qatar, o que lhe permitiu subir a pulso. O dono do PSG, agora patrão de Messi, mantém uma vida discreta
Nasser Al-Khelaifi é um ex-tenista que nasceu pobre, mas teve a sorte de fazer amizade na infância com o príncipe herdeiro do Qatar, o que lhe permitiu subir a pulso. O dono do PSG, agora patrão de Messi, mantém uma vida discreta
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 ??  ?? O bilionário François Pinault, casado com a atriz Salma Hayek, é dono do Rennes e o maior colecionad­or de arte da Europa
O bilionário François Pinault, casado com a atriz Salma Hayek, é dono do Rennes e o maior colecionad­or de arte da Europa

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