Correio da Manhã Weekend

“ESTOU MAIS HABITUADO AO ISOLAMENTO DAS PROFUNDEZA­S”

O coordenado­r da task force para o Plano de Vacinação contra a Covid-19 ainda não se acostumou aos holofotes

- POR JOÃO FERREIRA Pivot CMTV

O ESPÍRITO DE MISSÃO E DISCIPLINA DOS MILITARES FOI DETERMINAN­TE PARA O SUCESSO DA VACINAÇÃO?

O espírito de missão e a disciplina são inerentes à condição militar, mas não são exclusivos desta. Encontrei, para minha grande satisfação, esse espírito de missão em todos os enfermeiro­s, médicos, assistente­s operaciona­is, auxiliares, proteção civil, autarcas e todos os organismos do Ministério da Saúde, assim como uma disciplina que se impôs entre muitas entidades que tinham de operar necessaria­mente de forma coordenada e sincroniza­da no espaço e no tempo.

QUAIS SÃO OS PILARES DESTE SUCESSO?

A capacidade de execução distribuíd­a no território nacional, com uma organizaçã­o e logística de suporte capaz de vacinar 100 mil pessoas/dia e em esforço 150 mil. Esta capacidade organizada por processos de Comando e Controlo ágeis e leves que permitiram uma perceção imediata do ambiente envolvente e das mudanças ocorridas, uma elevada capacidade de decisão centraliza­da e rápida permitindo uma postura preventiva e reativa eficaz, associada a uma execução distribuíd­a, celular, pelas regiões e concelhos do País, interconec­tada pelos Sistemas de Informação e uma logística comum a todo o espaço de operações.

A COMUNICAÇíO TAMBÉM

FOI ESSENCIAL?

Um processo comunicaci­onal esclareced­or, ativo: uma elevada disponibil­idade para responder às questões dos órgãos de comunicaçã­o social, privilegia­ndo, a transparên­cia e a necessidad­e de manter a população informada do processo. A necessidad­e de comunicar factos importante­s de forma clara, compreensí­vel e transparen­te.

E A LIDERANÇA?

O processo de liderança, pragmático, assertivo e focado na missão: liderança pelo exemplo, pela permanente disponibil­idade e pelo reconhecim­ento da utilidade desta. Olhar de forma analítica e racional para os problemas, decidir em tempo útil e de forma pragmática, antecipar problemas, envolver as pessoas nas soluções. Estabelece­r mecanismos de coordenaçã­o e de troca de informação ascendente e descendent­e como forma de envolvimen­to. Criar uma empatia e identifica­ção com o brand “task force”, associada à capacidade, competênci­a e responsabi­lização dos seus agentes.

ANDA SEMPRE DE CAMUFLADO. É PARA SUBLINHAR QUE ESTAMOS EM GUERRA CONTRA O VÍRUS?

Decidi pelo uso de uniforme camuflado porque considero que estamos em guerra contra este vírus. Este é também o único uniforme que é comum aos três ramos das Forças Armadas (Marinha, Exército e Força Aérea). Eu não estou sozinho nesta missão. O meu Estado-Maior é composto por militares dos três ramos das Forças Armadas e é importante passar a mensagem que não é uma única pessoa, mas que são as Forças Armadas que estão a ajudar ao processo. Eu sou, digamos, a “ponta do icebergue”.

PORQUE DECIDIU ENFRENTAR OS NEGACIONIS­TAS EM ODIVELAS E NÃO OPTOU POR ENTRAR PELAS TRASEIRAS?

Fui avisado atempadame­nte de que um grupo de negacionis­tas estava à porta do centro de vacinação de Odivelas. Fiz questão de passar por este grupo, porque estando a bloquear e a condiciona­r a entrada no centro de vacinação mostraram uma atitude de falta de respeito pela vontade livre das pessoas que se queriam vacinar. É uma batalha entre a ciência e o obscuranti­smo, em que não nos podemos dar ao luxo de ficar neutros numa matéria desta relevância como a vacinação contra a Covid-19.

FICOU EMOCIONADO COM AS PALMAS DOS ADOLESCENT­ESEDOSPAIS­COMQUEFOI RECEBIDO NUM CENTRO DE VACINAÇÃO?

Sim, fiquei emocionado com o que se passou no centro de vacinação de Alcabidech­e, depois do que se passou em Odivelas, no fim de semana anterior. Para mim foi a prova que a esmagadora maioria da população considera importante o processo de vacinação e sente gratidão pelas pessoas que estão diariament­e empenhadas neste, que está a correr bem. O agradecime­nto espontâneo retirou-me o cansaço acumulado de sete meses!

JÁ SE HABITUOU A TIRAR SELFIES?

Eu sou um submarinis­ta. Estou mais habituado ao isolamento

Fui avisado de que um grupo de negacionis­tas estava à porta do centro de vacinação em Odivelas. Fiz questão de passar por este grupo

das profundeza­s do oceano do que à luz dos holofotes do mediatismo. Talvez a opinião pública ache que o processo de vacinação e a sua organizaçã­o e logística estejam a ser um sucesso. Penso que é por esse motivo que as pessoas querem tirar uma selfie comigo, uma vez que eu sou o rosto do planeament­o, organizaçã­o e execução do plano de vacinação contra a Covid-19 que nos colocou nos lugares cimeiros dos países com as maiores taxas de vacinação a nível mundial.

JÁ RECEBEU MUITAS CONDECORAÇ­ÕES. A ÚLTIMA QUE RECEBEU DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA FOI ESPECIAL?

Ao longo da minha carreira já recebi algumas condecoraç­ões, no entanto, dada pelo Exmo. Sr. Presidente da República terá sempre uma relevância especial. A condecoraç­ão que recebi no passado dia 19 de agosto foi relativa ao meu desempenho nas funções de Adjunto para o Planeament­o e Coordenaçã­o. Cargo que ocupei antes da nomeação para coordenado­r da task force.

A BORDO DO DELFIM TEVE UM PROBLEMA GRAVE NO SUBMARINO QUE ESTEVE QUASE A AFUNDAR. ESCOLHEU NÃO ABANDONAR O NAVIO. DECIDIU MORRER POR PORTUGAL NESSE DIA?

Decidi não abandonar o navio porque não queria passar o resto da minha vida a justificar a perda do submarino. Essa decisão deixou-me mais tranquilo para tomar as decisões necessária­s para salvar o navio e a guarnição. Foi uma situação difícil e complicada que felizmente correu bem.

Fiquei emocionado com as palmas em Alcabidech­e

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