“ESTOU MAIS HABITUADO AO ISOLAMENTO DAS PROFUNDEZAS”
O coordenador da task force para o Plano de Vacinação contra a Covid-19 ainda não se acostumou aos holofotes
O ESPÍRITO DE MISSÃO E DISCIPLINA DOS MILITARES FOI DETERMINANTE PARA O SUCESSO DA VACINAÇÃO?
O espírito de missão e a disciplina são inerentes à condição militar, mas não são exclusivos desta. Encontrei, para minha grande satisfação, esse espírito de missão em todos os enfermeiros, médicos, assistentes operacionais, auxiliares, proteção civil, autarcas e todos os organismos do Ministério da Saúde, assim como uma disciplina que se impôs entre muitas entidades que tinham de operar necessariamente de forma coordenada e sincronizada no espaço e no tempo.
QUAIS SÃO OS PILARES DESTE SUCESSO?
A capacidade de execução distribuída no território nacional, com uma organização e logística de suporte capaz de vacinar 100 mil pessoas/dia e em esforço 150 mil. Esta capacidade organizada por processos de Comando e Controlo ágeis e leves que permitiram uma perceção imediata do ambiente envolvente e das mudanças ocorridas, uma elevada capacidade de decisão centralizada e rápida permitindo uma postura preventiva e reativa eficaz, associada a uma execução distribuída, celular, pelas regiões e concelhos do País, interconectada pelos Sistemas de Informação e uma logística comum a todo o espaço de operações.
A COMUNICAÇÃO TAMBÉM
FOI ESSENCIAL?
Um processo comunicacional esclarecedor, ativo: uma elevada disponibilidade para responder às questões dos órgãos de comunicação social, privilegiando, a transparência e a necessidade de manter a população informada do processo. A necessidade de comunicar factos importantes de forma clara, compreensível e transparente.
E A LIDERANÇA?
O processo de liderança, pragmático, assertivo e focado na missão: liderança pelo exemplo, pela permanente disponibilidade e pelo reconhecimento da utilidade desta. Olhar de forma analítica e racional para os problemas, decidir em tempo útil e de forma pragmática, antecipar problemas, envolver as pessoas nas soluções. Estabelecer mecanismos de coordenação e de troca de informação ascendente e descendente como forma de envolvimento. Criar uma empatia e identificação com o brand “task force”, associada à capacidade, competência e responsabilização dos seus agentes.
ANDA SEMPRE DE CAMUFLADO. É PARA SUBLINHAR QUE ESTAMOS EM GUERRA CONTRA O VÍRUS?
Decidi pelo uso de uniforme camuflado porque considero que estamos em guerra contra este vírus. Este é também o único uniforme que é comum aos três ramos das Forças Armadas (Marinha, Exército e Força Aérea). Eu não estou sozinho nesta missão. O meu Estado-Maior é composto por militares dos três ramos das Forças Armadas e é importante passar a mensagem que não é uma única pessoa, mas que são as Forças Armadas que estão a ajudar ao processo. Eu sou, digamos, a “ponta do icebergue”.
PORQUE DECIDIU ENFRENTAR OS NEGACIONISTAS EM ODIVELAS E NÃO OPTOU POR ENTRAR PELAS TRASEIRAS?
Fui avisado atempadamente de que um grupo de negacionistas estava à porta do centro de vacinação de Odivelas. Fiz questão de passar por este grupo, porque estando a bloquear e a condicionar a entrada no centro de vacinação mostraram uma atitude de falta de respeito pela vontade livre das pessoas que se queriam vacinar. É uma batalha entre a ciência e o obscurantismo, em que não nos podemos dar ao luxo de ficar neutros numa matéria desta relevância como a vacinação contra a Covid-19.
FICOU EMOCIONADO COM AS PALMAS DOS ADOLESCENTESEDOSPAISCOMQUEFOI RECEBIDO NUM CENTRO DE VACINAÇÃO?
Sim, fiquei emocionado com o que se passou no centro de vacinação de Alcabideche, depois do que se passou em Odivelas, no fim de semana anterior. Para mim foi a prova que a esmagadora maioria da população considera importante o processo de vacinação e sente gratidão pelas pessoas que estão diariamente empenhadas neste, que está a correr bem. O agradecimento espontâneo retirou-me o cansaço acumulado de sete meses!
JÁ SE HABITUOU A TIRAR SELFIES?
Eu sou um submarinista. Estou mais habituado ao isolamento
Fui avisado de que um grupo de negacionistas estava à porta do centro de vacinação em Odivelas. Fiz questão de passar por este grupo
das profundezas do oceano do que à luz dos holofotes do mediatismo. Talvez a opinião pública ache que o processo de vacinação e a sua organização e logística estejam a ser um sucesso. Penso que é por esse motivo que as pessoas querem tirar uma selfie comigo, uma vez que eu sou o rosto do planeamento, organização e execução do plano de vacinação contra a Covid-19 que nos colocou nos lugares cimeiros dos países com as maiores taxas de vacinação a nível mundial.
JÁ RECEBEU MUITAS CONDECORAÇÕES. A ÚLTIMA QUE RECEBEU DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA FOI ESPECIAL?
Ao longo da minha carreira já recebi algumas condecorações, no entanto, dada pelo Exmo. Sr. Presidente da República terá sempre uma relevância especial. A condecoração que recebi no passado dia 19 de agosto foi relativa ao meu desempenho nas funções de Adjunto para o Planeamento e Coordenação. Cargo que ocupei antes da nomeação para coordenador da task force.
A BORDO DO DELFIM TEVE UM PROBLEMA GRAVE NO SUBMARINO QUE ESTEVE QUASE A AFUNDAR. ESCOLHEU NÃO ABANDONAR O NAVIO. DECIDIU MORRER POR PORTUGAL NESSE DIA?
Decidi não abandonar o navio porque não queria passar o resto da minha vida a justificar a perda do submarino. Essa decisão deixou-me mais tranquilo para tomar as decisões necessárias para salvar o navio e a guarnição. Foi uma situação difícil e complicada que felizmente correu bem.
Fiquei emocionado com as palmas em Alcabideche