“A HISTÓRIA ERA AQUI ONDE VIVÍAMOS E TÍNHAMOS A OBRIGAÇÃO DE A COBRIR”
No início da manhã de 11 de Setembro de 2001, outro fotógrafo da Agência France-Presse telefonou a Stan Honda e disse-lhe que “um avião se tinha despenhado contra as torres do World Trade Center”. “Ele estava a ver os programas noticiosos da manhã na televisão. Esta era definitivamente uma história que tínhamos de cobrir, por isso ambos decidimos ir para a baixa de Manhattan. Peguei nas minhas câmaras e equipamento e dirigi-me de metro para o centro da cidade”, contou à ‘Domingo’ o fotógrafo que nesse dia acabou por fazer algumas das mais icónicas imagens da tragédia que mudou para sempre os Estados Unidos da América e o Mundo. Há 20 anos, ele fotografou Marcy Borders, funcionária do Banco da América, que trabalhava há um mês no World Trade Center e sobreviveu ao seu colapso, após os ataques da Al-Qaeda. Borders ficou para sempre a assustada senhora coberta de poeira (‘The Dust Lady’).
Stan Honda trabalhou como fotojornalista durante 34 anos, mais recentemente para a Agência France-Presse (AFP), para a qual cobriu durante cinco anos o programa do vaivém espacial da NASA. Entre os seus projetos pessoais está a documentação dos campos de concentração norte-americanos onde japoneses-americanos foram encarcerados durante a Segunda Guerra Mundial, e onde os seus pais e familiares estiveram os detidos.
Em 2001, qual foi o impacto pessoal e profissional dessa sua reportagem?
O 11 de Setembro foi a história
mais caótica e intensa que cobri na minha carreira. Foi assim que pensei nessa altura e agora. Pude usar as competências que tinha como fotojornalista (para a Agência France-Presse) para contar uma história, nesse dia e durante os dias e semanas após os ataques, de que me orgulho. Estar em Nova Iorque significava que a história era aqui onde vivíamos e que tínhamos a obrigação de a cobrir. Assim, pelo menos durante os primeiros anos, não podíamos escapar à história, nem profissional nem pessoalmente. A minha mulher e eu não fomos diretamente afetados pelos ataques, não conhecíamos ninguém que tivesse morrido. Conhecia jornalistas que estavam feridos, alguns gravemente, mas todos sobreviveram a esse dia.
Olhando para trás como jornalista,
“Cidadãos atacaram muçulmanos que viviam no país
20 anos mais tarde, fico espantado com a forma como os ataques foram bem contados em Nova Iorque, Washington e na Pensilvânia. Contar as histórias das vidas das pessoas foi um grande esforço para muitos jornalistas.
Enquanto jornalista e americano como viu os ataques da Al-Qae da em solo americano?
Como cidadão dos EUA, fiquei inicialmente chocado com os ataques, mas percebi mais tarde que a raiva dos terroristas veio de uma política externa falhada do nosso país em muitos países de maioria muçulmana. Ser visto como um superpoder agressivo nestes países criou um enorme ressentimento entre os muçulmanos mais radicais. Eles ripostaram da única forma que sabiam.
Qual foi a principal mudança nos Estados Unidos da América provocada pelo 11 de Setembro?
Infelizmente, os ataques criaram um elevado nível de sentimento antimuçulmano no Governo e nas pessoas. Na altura, o então presidente George W. Bush
pediu aos americanos que não culpassem os muçulmanos ou árabes-americanos comuns pelos ataques. Infelizmente, cidadãos comuns atacaram muçulmanos que viviam no país e até sikh-americanos foram confundidos com muçulmanos. E, é claro, o nosso Governo invadiu o Afeganistão e o Iraque como resultado dos ataques do ‘9/11’.
Não posso realmente falar sobre as grandes mudanças nos EUA mas, obviamente, temos maior segurança nos aeroportos, no governo e nos edifícios de escritórios desde os ataques. O que não noto é uma grande mudança por parte dos governos americanos na tentativa de compreender as culturas de outros países.
Teve algum contacto posterior com Marcy Borders ou com Ed Fine, que também fotografou na altura? Sabe o que lhes aconteceu?
Algumas semanas após o 11 de setembro de 2001, Ed Fine entrou em contacto com a revista ‘Fortune’, onde a minha fotografia dele foi utilizada na capa de uma edição. Um editor pôs-nos depois em contacto e pude visitá-lo na sua casa em New Jersey, onde o fotografei tanto para a ‘Fortune’ como para a Agência France-Presse. Foi um alívio ver que Ed não estava ferido e tinha sobrevivido. Ele trabalhava como consultor financeiro para empresas e creio que ainda continua. Alguns meses depois disso, um membro da família de Marcy Borders contactou o escritório da AFP em Washington, identificando-a como a mulher coberta de pó da minha fotografia. O chefe do gabinete da AFP e eu conhecemos Marcy alguns dias mais tarde no seu apartamento em New Jersey, onde ouvimos a sua história e eu pude fotografá-la em condições mais tranquilas. Foi um alívio ver que ela estava fisicamente bem, embora traumatizada por causa dos atentados. Fiquei triste ao saber da morte dela, em agosto de 2015, devido a um cancro do estômago.