Correio da Manhã Weekend

Corrupção com fundos à vista

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Há muito que os fundos europeus, que Portugal recebeu desde a adesão à União Europeia em 1986, nos deveriam ter arredado do atraso económico. Mas parte significat­iva dos 130 mil milhões que a Europa fez jorrar, desde então, sobre o nosso país, foram desviados pela corrupção. E assim continuamo­s hoje

“na cauda da Europa”.

Com os fundos europeus, foi um fartar vilanagem. A imaginação dos corruptos não teve limites. Usaram-se fundos para abater barcos e adquirir novas embarcaçõe­s que, por vezes, eram as mesmas que tinham sido abatidas. Alguns dos fundos para a indústria acabaram aplicados em Ferraris, fundos para agricultur­a serviram para os filhos dos “donos das quintas” comprarem veículos “todo-o-terreno” para férias.

Há verbas do Fundo Social Europeu que se destinavam à formação profission­al, mas houve formação que nunca se realizou. Muitos trabalhado­res foram artificial­mente transforma­dos em formandos. Os escândalos surgiram, dos quais se destacam os que envolveram a UGT e o Grupo Amorim, oportuname­nte amnistiado­s. Torres Couto, então secretário-geral da UGT, conseguiu a prescrição do seu processo graças a uma falha processual, “por ter sido notificado numa data posterior a todos os restantes acusados”.

Houve múltiplas investigaç­ões judiciais. Mas estas foram arquivadas, de forma deliberada. Políticos e magistrado­s sabiam que, se houvesse corrupção comprovada, muito dinheiro teria de ser devolvido a Bruxelas. Para evitar a restituiçã­o – e achando que mais vale manter o dinheiro sujo do que devolvê-lo, fazendo de Portugal um país mais limpo - fizeram abortar as investigaç­ões. E assim se branqueou o desvio de fundos e limpou-se o cadastro do país. O que permite até que Costa hoje afirme que “Portugal teve baixos níveis de fraude na aplicação de fundos”. Anuncia-se agora a vinda de mais dezenas de milhares de milhões em fundos, a famosa “bazuca”. O contexto é o de sempre. Os políticos que controlam as contas são da mesma escola. Não haverá garantia de seriedade na aplicação dos fundos, apesar da existência de um portal da transparên­cia; pois este, convenient­emente, apenas faculta a informação menos relevante. Com as mesmas condiciona­ntes, iremos ter a mesma corrupção de sempre, que nos mantém na cauda da Europa.n

POLÍTICOS E MAGISTRADO­S SABIAM QUE, SE HOUVESSE CORRUPÇÃO COMPROVADA, MUITO DINHEIRO TERIA DE SER DEVOLVIDO

O FUNDO SOCIAL EUROPEU SERVIU PARA PAGAR CURSOS DE FORMAÇÃO PROFISSION­AL A TRABALHADO­RES, QUE NUNCA SE REALIZARAM

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