Ainda em ressaca

Éextraordinário como depois de quarenta e sete anos de Estado de Direito continue sem haver um compromisso sério com a autoridade democrática. Foi um dos maiores falhanços do pós-25 de Abril. A construção de uma cultura cívica que, afastando o autoritarismo e o policiamento do pensamento, onde as forças de segurança ganhassem o estatuto que merecem como instituições fundamentais para a organização e desenvolvimento de uma República onde as diversas abordagens da Justiça possam ser realizadas.

O repúdio pelas práticas repressivas da Ditadura construiu um discurso, e uma cultura, onde ‘polícia bom é polícia morto’. Sobretudo a esquerda portuguesa, sobretudo a mais radical, cultiva esta demonização das polícias. Não espanta, por isso, que as notícias dos últimos dias com sucessivas, e graves, agressões de agentes policiais não tenham acolhimento para reações penais sérias.

Porém, este desleixo judiciário, que fragiliza a atuação das polícias deve ser entendido num contexto mais abrangente da importância da autoridade democrática, onde se inscrevem as agressões a profissionais de saúde, nos hospitais, a professores por alunos a familiares, nas escolas, a funcionários de finanças, nas repartições públicas e por aí adiante, culminando na educação familiar onde os próprios pais permitem que se esfarele a sua autoridade em relação aos educandos. Parece que se instala a política onde o ‘Não’ é proibido, relaxando preceitos, desmoronando relações de solidariedade vertical, desarticulando as malhas sociais, impondo o princípio niilista de que tudo vale.

Na verdade, continuamos ressacados, ressaca velha, em que devíamos ter aprendido mais, pensado melhor, agido com algum iluminismo. O resultado está à vista: uma democracia subdesenvolvida, pobre e ignorante, sem cimento para se reconstruir.n

O RESULTADO ESTÁ À VISTA: UMA

DEMOCRACIA SUBDESENVOLVIDA, POBRE E IGNORANTE