A CUIDADORA DOS ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO DA ASSEMBLEIA
Lina Gomes é enfermeira dos funcionários do Parlamento, mas quando acaba o turno vai tratar da bicharada que se instalou nos jardins
AFarrusca e o Rapaz nasceram por volta de um 25 de Abril há 16 anos, num jardim interior da Assembleia da República que vai da biblioteca para a escadaria onde agora estão gabinetes do Bloco de Esquerda e do PCP, mas onde já foi o Conselho de Administração. Há 14 anos, para parir o Tobias e a Guidinha, a velha gata Cissa – “que conhecia melhor o Palácio que qualquer pessoa e por isso escolhia os melhores sítios para o fazer” – escolheu um sofá que estava à porta de uma Secretaria de Estado dos Assuntos Parlamentares num feriado do 13 de junho que se juntou a um fim de semana e trouxe o silêncio amigo do puerpério. “Houve quem ficasse um bocadinho indignado porque ficou um bocadinho de sangue no sofá, mas a mãe não deixava que ninguém se aproximasse dos gatinhos. A Cissa também andava sempre a levar os ‘miúdos’ para o plenário, mas não dava jeito porque para os aquecer punha-os dentro da parte de madeira onde estão os terminais elétricos da contagem de votos”, conta Lina Gomes, enfermeira da Assembleia da República há 21 anos, os mesmos em que assumiu como missão cuidar dos animais que se passeiam pelos jardins. Lina é hoje a tratadora oficial das colónias de gatos, numa parce
“Os pavões descendem de um casal que deram a Durão Barroso
ria com a Casa dos Animais de Lisboa, que ajuda em questões como a esterilização dos bichos – no caso das gatas – ou a redistribuição por outros jardins quando começam a multiplicar-se – o que acontece com os pavões.
“Os pavões descendem todos de um casal que deram ao Durão Barroso quando ele era primeiro-ministro e procriaram. Vão tendo filhos e mais filhos e como têm uma longevidade grande chegámos a ter aqui mais de 20”, recorda Lina, que os conhece tão bem que sabe que “costumam dormir no jardim [da residência oficial] do primeiro-ministro, ali na árvore mais alta. Há um que dá um toque quando começa a escurecer e recolhem todos por ordem hierárquica”. Aos machos chama Chico e as fêmeas são todas Florípedes – exceção para “um macho que tinha andar de fêmea” e que por isso alcunhou de Guida Scarlatty, em honra de um dos travestis mais conhecidos na noite lisboeta.
É ao fim da tarde, quando termina o serviço de enfermagem, que desce aos jardins para alimentar e cuidar dos bichos que não só a conhecem como estão à espera dela e do alimento que lhes traz. Mafalda Ferreira, funcionária de um grupo parlamentar, tem-na ajudado nos últimos dois anos a cumprir a missão. Assim que Lina Gomes aparece é ver os animais a aproximarem-se como se estivesse para começar um qualquer evento de Estado.
O gato Rudy é dos que mais comem e isso ver-se-ia ao espelho se o tivesse. “Tem 7 ou 8 anos e é filho da Noa, que teve de ser eutanasiada aos 18 anos por doença. Também por cá andou a gata Maria, que acabou por morrer em minha casa onde estava há um ano com um tumor renal.” Já o Totó e o Miau apareceram entretanto para provar as gulodices que Lina – e muitos outros funcionários da Assembleia – trazem.
Entre os ‘convidados’ de honra também estão duas gaivotas, a Zora e a Dora, que nunca falham a hora marcada para o banquete. “Se damos amor recebemos amor e se isso é verdade com as pessoas também é verdade com os animais. É terapêutico cuidar deles.”