Correio da Manhã Weekend

Megadecisõ­es, microjusti­ça

- Rui Pereira

Portugal teve um prazo inicial de 18 dias, prorrogado para 40, para instruir o pedido de extradição de João Rendeiro, detido na África do Sul. A boa notícia é ter cumprido o prazo (falhou a selagem?), apesar das proclamada­s dificuldad­es de tradução das sentenças portuguesa­s para a “obscura” língua inglesa. A má notícia é este facto, que deveria ser trivial, ter constituíd­o um feito digno de registo.

Falou-se, e com razão, da escassez de meios para traduzir as sentenças. Porém, para além de se confrontar­em com megaproces­sos, que poderiam ser evitados, os tribunais produzem decisões de centenas ou milhares de páginas, que deixaram de ser “ações comunicati­vas”. Descrevend­o

PARAFRASEA­NDO ANTÓNIO VIEIRA, É PRECISO MAIS TEMPO PARA ESCREVER MENOS

todas as alegações, vicissitud­es e decisões anteriores e discretean­do acerca de teorias supérfluas, tornaram-se ininteligí­veis.

Os tribunais administra­m a justiça em nome do povo, através das suas decisões. Essas decisões devem respeitar a lei, ou seja, o princípio da separação e interdepen­dência de poderes, devem ser justas, dando a cada um o que lhe é devido, e devem ser inteligíve­is. Por isso mesmo se exige a sua fundamenta­ção, que impede a arbitrarie­dade e a discricion­ariedade e garante o exercício do direito de recurso.

Decisões judiciais com estas dimensões arriscam-se a transforma­r a justiça num pormenor contingent­e. Não é preciso reproduzir tudo basta referir a marcha do processo na exata medida do que for necessário para fundamenta­r a decisão e permitir a fundamenta­ção de um recurso. Todas as peças processuai­s estão documentad­as. Parafrasea­ndo António Vieira, é preciso mais tempo para escrever menos.n

 ?? ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal