Falar de cátedra
Independentemente das suas afeições clubistas, os adeptos do desporto-rei no nosso país tiveram, nestes últimos tempos, fartos motivos de entretenimento com as entrevistas que o presidente do Sport Lisboa e Benfica e o presidente do Sporting Clube de Portugal concederam à BTV e à CNN/Portugal com alguns dias de intervalo. Por serem parte interessada, os adeptos do Benfica e do Sporting terão assistido e digerido os discursos dos seus líderes máximos sob uma perspetiva mais formal como se de assuntos de Estado tratassem as palavras que Rui Costa e Frederico Varandas escolheram para se dirigirem às respetivas nações. E, de facto, são assuntos de Estado, dos dois Estados da Segunda Circular. Quem duvidar da importância social dos presidentes dos dois rivais seculares de Lisboa ou vive noutro planeta ou, vivendo por aqui, pertence ao grupo restrito de indivíduos que não lê jornais, não ouve noticiários e nunca se estendeu no sofá em frente de um aparelho de televisão a cores.
O futebol concede aos seus protagonistas uma benesse extraordinária que é a de terem sempre razão no que dizem e no que fazem desde que sejam campeões nacionais ao fim de cada temporada. E, assim sendo, não admira que Frederico Varandas
se tenha saído bem da entrevista e que Rui Costa, presidente de um Benfica que não ganha nada – o último título conquistado foi o da Supertaça em agosto de 2019 –, tenha saído da sua entrevista em pior estado do que aquele em que se encontrava antes de começar a falar. Varandas brilhou intensamente provocando os atentos, venerandos e obrigados à idolatria em torno do presidente do FC Porto – idolatria que lhe advém de ser o presidente com mais títulos conquistados em todo o mundo –, reforçando, sem temer consequências, que “um bandido será sempre um bandido” e que “não retira uma vírgula” ao que disse sobre Pinto da Costa.
Já Rui Costa, fragilizado pelas circunstâncias desportivas e judiciais em que o Benfica esbraceja para vir à tona, e sem “vírgulas” de qualquer espécie para oferecer a uma massa descoroçoada de adeptos, nunca sairia por cima de uma entrevista em que contrapôs a um conjunto sentido de lamentos o anúncio do regresso em força das betoneiras para a construção de uma Cidade
QUANDO O FUTEBOL NÃO GANHA, OS ADEPTOS NÃO QUEREM OUVIR FALAR DE CONSTRUÇÃO CIVIL
Desportiva. Ora, é certo e sabido que, quando o futebol não ganha, a última coisa de que os adeptos querem ouvir falar é de construção civil. Tudo isto será, no entanto, reversível à custa de golos. Quem não se lembra das primeiras entrevistas de Varandas antes de ser campeão? Impreparado, mole, totó, etc… e agora fala de cátedra. É esta a esperança a que Rui Costa tem de se agarrar, pondo os olhos no seu congénere rival. Ganhar a Taça da Liga esta semana já seria um começo.n