“Construíram trincheiras no quintal da nossa casa”
TESTEMUNHO “Quando aqui cheguei só me apetecia chorar. Vi os restos da casa que o meu pai construiu e isso dói”, conta Anna Melashenko, habitante da aldeia de Andriivka DESTRUIÇÃOr Oitenta por cento das habitações foram arrasadas
Em muitas das vilas e aldeias que foram ocupando, os militares russos instalaram núcleos de defesa, no sentido de precaverem investidas por parte das tropas ucranianas. Não se limitaram a passar pelo território, tentaram ocupá-lo. Na sua perspetiva, impediria a reconquista.
À aldeia de Andriivka, no distrito de Makariv, a 50 quilómetros de Kiev, a primeira coluna de blindados russos chegou a 25 de fevereiro, segundo dia da guerra. A maioria da população já se tinha colocado em fuga e, em poucas horas, os militares tomaram conta da localidade. Ocuparam grande parte das casas, onde passaram a residir e, em muitas delas, esconderam centenas de caixas de armas e munições. O objetivo era fazer da localidade um ponto de apoio à linha da frente, que combatia nas imediações da capital, e constituir um tampão a ocidente, na chamada Estrada de Lviv.
Mais de uma centena de militares russos permaneceu em
Andriivka cerca de um mês. Além de ocuparem as casas, aproveitaram os terrenos para instalarem armas pesadas, como aconteceu no quintal da casa de Anna Melashenko. “Construíram uma trincheira no quintal da nossa casa e quando partiram destruíram tudo”, disse Anna ao CM.
Falou à nossa reportagem no dia em que começou as limpezas do terreno. “Quando aqui cheguei só me apetecia chorar. Vi os restos da casa que o meu pai construiu e isso dói. Quando se veem as árvores derrubadas por tanques, tudo queimado e o que sobrou das suas coisas espalhadas, é difícil. Viemos limpar hoje e não sei por onde começar”, diz esta moradora, de 41 anos. Mas Anna não desiste e acredita que a sua casa vai ser reconstruída e que a sua vida vai continuar, ali, em Andriivka. “Primeiro, quero limpar o quintal, limpar tudo. Depois temos que construir uma nova casa. Deve ser o começo de algo novo, algo bom. Vamos plantar novas árvores. Acho que terei tempo de plantar mais alguma coisa e que o quintal vai ter novas plantas este ano.”
A destruição de Andriivka, que foi das aldeias mais martirizadas pela guerra, deveu-se ao facto de o Exército russo não querer, na retirada, deixar armas ou munições que pudessem ser usadas pelo Exército ucraniano. Sem tempo de carregar as centenas de caixas que tinham escondido, optaram por, no dia da fuga, a 27 de março, bombardear as habitações. Oitenta por cento das casas foram arrasadas.n
MILITARES OCUPARAM AS CASAS, ONDE PASSARAM A RESIDIR, DURANTE UM MÊS