Ainda um guia para Moledo
Antigamente, seguia à risca os conselhoseternosde Dona Ester, minha mãe, e dirigia-me para o areal de Moledo com a convicção de que o iodo iria reparar todo o género de maleitas. Não era em Maio, mas em Julho ou Setembro, uma vez que durante o mês de Agosto a praia estava demasiado ocupada e eu ia lá pouco. Portanto, em Julho e Setembro, ou mesmo em Junho, por alturas do São João, eu acreditava na saudável concentração de sargaço e iodo naquele estendal de barracas ao vento, de leitores compulsivos, de agasalhados matinais e de jovens que viviam no meio de um arco-íris de beleza.
Com os estigmas da idade, a memória das idas à consulta periódica da minha médica de Venade (a Dra. Teresa), um certo horror aos ajuntamentos desnecessários ou o adorável sentimento de preguiça dos Homem, seria natural que me inclinasse a não comparecer na praia, aquele lugar onde, já nesses anos da idade madura, se passava a manhã a ler os jornais (que hoje já não se lêem) e a fazer apostas sobre a hora a que levantava a neblina. Não aconteceu. Quando dobro aquelas oscilações meteorológicas de Maio, que continuam a surpreender toda a gente, continua a apetecer aquela cadeira junto da barraca no areal, onde o oxigénio chega primeiro vindo dos invisíveis recifes da costa galega e das vagas minhotas.
Dona Ester, minha mãe, gostava dos seus filhos devidamente bronzeados; não para se sentirem vaidosos, mas para se julgarem civilizados e saudáveis (nós preferíamos a vaidade). O nosso grupo de companheiros de época balnear (era assim que se designava a temporada de praia) não desarmava diante da inclemência daquelas águas ou da ameaça dos nevoeiros matinais. Comíamos sardinhas, tagarelávamos, dormíamos a sesta e talvez fingíssemos certa felicidade; não por esta ordem, claro, mas com este acompanhamento musical, digamos. A conservação da espécie, em Moledo, não tinha mais metáforas do que isto.
“Continua a apetecer aquela cadeira junto da barraca no areal”