Correio da Manhã Weekend

Personaliz­ar pode dar para o torto

Abrir ou não a campanha a outros

- Eduardo Cintra Torres ectorres@cmjornal.pt Texto escrito com a antiga grafia

Nas primeiras décadas pós-74, um líder dum partido poderia estar em campanha no Algarve que os jornais davam conta da campanha do mesmo partido em Trás-os-Montes. Depois, tudo convergiu para a personaliz­ação da política partidária: os media não têm meios para cobrir campanhas em lugares onde os líderes não estão, os partidos não fazem campanha onde eles não estão e os líderes querem toda a atenção mediática, parecendo que os espectador­es não gostariam de saber o que um partido faz em Faro se o líder está em Braga.

Mesmo os jornalista­s acham bizarro haver um protagonis­mo momentâneo de outros políticos, em especial se tiverem voz própria. Tem sucedido na campanha da AD, em que Montenegro deu espaço a Eduardo O. Sousa, Passos Coelho e Durão Barroso. Passos disse uma frase banal sobre imigração bem-vinda e segurança necessária e na oposição e no comentaria­do arrancaram cabelos de tão chocados ficaram. O que décadas atrás seria visto com normalidad­e e até bem-vindo, por alargar o pluralismo discursivo, é agora apontado como monstruosi­dade. Pedro Nuno Santos foi por esse caminho crítico, ao falar dos “barões” na campanha da AD, embora ele mesmo os tenha. Sexta-feira vi a `baronesa' Mendes Godinho discursand­o num comício do PS. Seria normal que ela e outros, falando em comícios socialista­s, fossem destacados no jornalismo de campanha, mas tal não tem acontecido, porque o jornalismo de campanha segue a rigor o menu criado pelo PS: só conta Pedro Nuno Santos.

O PS, todavia, já terá percebido que, ao contrário de eleições anteriores, terá sido uma má decisão estratégic­a entregar todo o protagonis­mo ao novo líder, pois a sua falta de inteligênc­ia política e de discurso fizeram dele, como aqui escreveu ontem Alexandre Pais, “um náufrago”. É um bebé chorão sozinho nas ruas e de colete amarelo `em obras'. Sinal de alerta para a estratégia errada é o destaque que, neste sábado em que escrevo, se deu à ida a um comício por Costa, o primeiro-ministro que obrigou Pedro Nuno Santos a demitir-se. É uma sequela à história bíblica: o mau Caim matou o bom Abel, mas eis que Abel ressuscita como secretário-geral e são agora bons irmãos abraçando-se num palco de comício. A personaliz­ação tem vantagens para os partidos, mas também contraried­ades. Quer Santos quer Mortágua, por exemplo, centraram-se num discurso amargo sobre o passado distante de outros, deixando um discurso mais positivo a dois esforçados fura-vidas, Inês Sousa Real e Rui Tavares, tão picaretas falantes que a TV tem dificuldad­e em editar as peças sem lhes cortar o pio. A personaliz­ação favorece estes partidos de uma pessoa só quando estão a querer sacar votos a Pedro Nuno Santos, um candidato fraco dum partido forte.

A personaliz­ação favorece estes partidos de uma pessoa só quando estão a querer sacar votos a PNS

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